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agosto 23, 2007
Outro lado: Museus valorizam coleções, diz MinC, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Museus valorizam coleções, diz MinC
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 23 de agosto de 2007, em resposta à entrevista de João Sattamini a Fabio Cypriano
Para Ministério da Cultura, investimento em infra-estrutura e conservação de obras "agregou valor" aos acervos emprestados
Não são os museus que ganham com as coleções privadas cedidas em comodato, como a de João Sattamini, no MAC de Niterói, mas as coleções que ganham com os museus, diz o diretor do departamento de museus do Ministério da Cultura, José do Nascimento Junior.
"As coleções foram valorizadas pelos lugares onde elas estão, os museus. Esses museus investiram, estudaram, catalogaram e, principalmente, conservaram e divulgaram essas obras, ou seja, agregaram valor às coleções", escreveu o diretor, por e-mail, de Viena, onde participa de um congresso do Conselho Internacional de Museus.
Segundo ele, "tanto o MAC-Niterói como o MAM-Rio têm investido nas suas infra-estruturas, com apoio financeiro do governo federal, inclusive. Podemos perguntar quanto essas instituições investiram para manter conservadas essas coleções, quantos técnicos, quanto em luz, água etc.". E conclui: "O dinheiro investido na conservação até hoje daria para adquirir tais coleções".
Já o secretário da Cultura de Niterói, André Diniz, afirmou, por telefone, que espera conseguir um espaço para abrigar toda a coleção de Sattamini: "Eu e o prefeito estamos empenhados em manter a coleção aqui. Estamos conversando com os Correios, que reforma um grande edifício, de 1916, em Niterói, considerado o mais bonito da instituição, para que ele receba toda a coleção que está fora do museu".
Esse espaço seria ocupado dentro de uma nova concepção: "Ele irá exibir o acervo não só em exposições permanentes mas também será utilizado para pesquisa e formação de profissionais especializados em restauração, além de ter uma biblioteca especializada". Ainda segundo Diniz, o projeto está sendo analisado pela direção dos Correios e Sattamini já foi informado do andamento das conversas.
Colecionador ataca políticas públicas, entrevista de João Sattamini a Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Colecionador ataca políticas públicas
Entrevista de João Sattamini a Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 23 de agosto de 2007
Dono de um dos maiores acervos privados do país, João Sattamini cogita retirar obras do MAC de Niterói e critica falta de "política de aquisições" do governo federal
Após a coleção de arte construtiva de Adolpho Leirner ter sido vendida para os Estados Unidos, agora é o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, construído há dez anos para abrigar a coleção de João Sattamini, que pode perder as obras que motivaram sua criação.
Expirado em 2004, o comodato que cedeu as obras para o museu projetado por Oscar Niemeyer não foi renovado.
"Estou aguardando uma reserva técnica adequada, se isso não acontecer, vou retirar as obras, essa é a única moeda de troca que tenho", disse Sattamini, 71, que também criticou a ação do governo federal na cultura.
"Esse risco não existe, estamos fazendo tudo para manter a coleção no MAC e temos um projeto de curto prazo para acondicionar de forma adequada todas as obras", respondeu à Folha André Diniz, secretário da Cultura de Niterói.
A partir de amanhã, parte da coleção de Sattamini poderá ser vista no Masp, em SP, na exposição "Arte e Ousadia". Lá, será possível conferir porque Sattamini é um dos cinco mais importantes colecionadores do país, com cerca de 1.200 obras.
Leia a seguir trechos da entrevista concedida no escritório de Sattamini, no Rio, na última sexta-feira.
FOLHA - Como o sr. avaliou a venda da coleção de Leirner para Houston?
JOÃO SATTAMINI - A coleção é dele, e ele não conseguiu espaço público em São Paulo. Isso é um fenômeno, pois a situação econômica é muito melhor em SP do que no Rio, mas o colecionismo privado está muito mais à frente no Rio, com a [coleção] do Gilberto [Chateaubriand], a do Sérgio Fadel, que é primorosa, a minha, e mais uns cinco ou seis advogados que não querem dar o nome.
FOLHA - Como é sua relação com o museu de Niterói?
SATTAMINI - A prefeitura fez o museu, tenho relações muito cordiais com o prefeito, é uma pessoa correta, mas é difícil tocar o museu, porque o nível administrativo é baixo, e é uma briga constante para conseguir verbas e pagar exposições.
FOLHA - Apesar de o sr. e o Gilberto Chateaubriand tornarem suas coleções públicas, por meio de comodatos, nenhum dos dois cede as obras definitivamente. É desconfiança do poder público?
SATTAMINI - É desconfiança. Se o Ministério da Cultura passa 90 dias em greve, como se pode administrar um museu com esse poder público? Há uma contradição entre os privados e o poder público, principalmente agora, com o governo do PT.
FOLHA - Em que sentido?
SATTAMINI - Em conseguir verba, apoio. Veja o caso da mostra no Masp, patrocinada pela Comgás. Eles aplicaram R$ 1 milhão na exposição. Isso não acontece no setor público. Com exceção da Petrobras, que virou o verdadeiro Ministério da Cultura. Pior é que a verba da Comgás chegou a ficar meses parada no ministério por conta da greve, e o dinheiro foi liberado em cima da hora.
FOLHA - Com tudo isso, o sr. acha que há uma ausência de políticas públicas?
SATTAMINI - Isso foi o que disse o próprio Leirner [ao explicar a venda de sua coleção para Houston]: "Faço isso por ausência de políticas públicas". Não há política de aquisições. O Museu Nacional de Belas Artes não adquire um trabalho há quanto tempo?
FOLHA - Chateaubriand reclama dos preços cobrados por galeristas. O sr. acha a arte brasileira cara?
SATTAMINI - Acho, mas aqui há um problema duplo, porque é preciso considerar o preço da arte no Brasil em relação à renda, então não dá para cobrar como nos EUA. Por outro lado, a arte brasileira é a melhor da América Latina. Nem a argentina ou a mexicana se comparam, mas ela não tem o preço dos mexicanos, pois eles estão ali do lado dos EUA. É justo que artistas como Adriana Varejão ou Beatriz Milhazes ganhem o que ganham pelas obras, pois elas merecem, mas restringe muito a aquisição, por exemplo, do Gilberto, que é um comprador voraz, compra muito mais do que eu. Então temos que ir para os novos. Nesse sentido, tive duas sortes: uma foi comprar os concretos que estavam abandonados e depois a geração 80, que estava começando sua produção.