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Como atiçar a brasa

 


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dezembro 22, 2006

Gil vai pedir MP para salvar acordo sobre incentivos para Cultura, na Folha Online

Gil vai pedir MP para salvar acordo sobre incentivos para Cultura

Matéria originalmente publicada na Folha Online, no dia 21 de dezembro de 2006

O Ministério da Cultura (MinC) divulgou hoje uma nota comentando a derrota do lobby dos artistas na votação da Lei do Esporte realizada na Câmara dos Deputados. Na avaliação do MinC, houve "quebra do acordo" firmado na semana passada quanto aos mecanismos de renúncia fiscal para incentivar as duas áreas, de modo que elas não concorram entre si.

O ministro Gilberto Gil, que vai continuar no comando da pasta, decidiu sugerir veto ao texto aprovado e a edição de uma medida provisória para "reestabelecer os termos anteriormente pactuados". Cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva editar ou não a MP.

A proposta original da chamada Lei do Esporte incluía projetos esportivos na regra que permite às empresas deduzir do Imposto de Renda até 4% para investir em cultura. Pelo acordo firmado no último dia 12, a a dedução do IR para projetos esportivos sairia da cota reservada aos programas de inovação científica e tecnológica e à concessão de tíquete alimentação para o trabalhador.

Atualmente as empresas também podem deduzir até 4% do Imposto de Renda para essas áreas. Pelo acordo, em vez de o esporte disputar recursos com a cultura, concorreria na prática com os programas de inovação científica e tecnológica.

Leia a íntegra da nota, intitulada "O MinC e a Lei do Esporte"

"O mundo cultural e o Ministério da Cultura foram surpreendidos nesta madrugada com as alterações introduzidas na Lei do Esporte durante a votação da matéria na Câmara dos Deputados. As modificações configuram a quebra de um acordo firmado na semana passada entre artistas e esportistas, o MinC, o Ministério dos Esportes, o Ministério da Fazenda e a Casa Civil, referendado no Senado Federal.

O acordo contemplava os interesses dos segmentos envolvidos com o projeto sem criar nenhum prejuízo à ciência e à tecnologia, nem ao programa de alimentação do trabalhador.

Diante da situação criada, o Ministério da Cultura sugere o veto ao inciso I do § 1º do artigo 1º da Lei do Esporte e a edição de uma Medida Provisória para reestabelecer os termos anteriormente pactuados. Também defendemos a criação de um grupo de concertação entre as várias áreas envolvidas para qualificar a discussão dentro e fora do governo. Estamos certos de que uma discussão mais profunda, pública e abrangente sobre incentivos fiscais é o melhor caminho para chegarmos a uma solução comum.

O apoio ao Esporte a à Cultura são igualmente importantes para a sociedade brasileira e não há porque colocá-los em conflito."

Posted by João Domingues at 2:51 PM

MinC terá aporte da Petrobras quase triplicado em 2007, na Carta Maior

MinC terá aporte da Petrobras quase triplicado em 2007

Matéria originalmente publicada na Carta Maior, no dia 22 de dezembro de 2006

O Ministério da Cultura receberá R$ 90 milhões da Petrobras para o orçamento de projetos prioritários de interesse do ministério. O anúncio foi realizado nesta quarta-feira (20). Em 2005, foram investidos R$ 35 milhões, o novo valor divulgado é quase três vezes maior

O Ministério da Cultura (MinC) receberá R$ 90 milhões da Petrobras para o orçamento deste ano, a ser lançado em 2007, para projetos prioritários de interesse do MinC. O anúncio foi realizado nesta quarta-feira (20), e a intenção da Ação Extraordinária é que a verba vá para editais de segmentos indígenas, negros e de restauro de patrimônios.

Segundo a gerente de patrocínio da Petrobras, Eliane Costa, "a Ação Extraordinária está alinhada à política de patrocínio da empresa e complementa o Programa Petrobras Cultural, cuja Edição 2006/2007 foi lançada no dia 6 de dezembro". Em 2005, foram investidos R$ 35 milhões, o novo valor divulgado é quase três vezes maior.

"A Petrobras é hoje a maior financiadora de cultura do Brasil e graças a ela estamos lançando mais uma primavera de editais para a cultura", destacou o ministro Gilberto Gil durante o lançamento. Segundo pesquisa realizada pelo IBGE, a cultura produz riquezas econômicas e bem-estar que giram em torno de 10% das riquezas brasileiras. O ministro afirmou ainda que, em sua gestão, foi possível transformar uma política de cultura numa política pública de cultura. "Hoje, meus amigos e minhas amigas, mais um recorde de investimento em cultura foi batido", pontuou o ministro.

Entre as novidades, está o edital de Segurança do Patrimônio, formulado em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), com objetivo de estruturar sistemas de segurança em bibliotecas e museus para proteção contra roubos. Também está sendo lançado um edital para patrocínio de projetos culturais em universidades públicas, além de um prêmio para projetos com foco em pessoas idosas.

Entre as ações de restauração de patrimônio, está o aterramento da fiação elétrica nas cidades históricas de Olinda (PE) e de Ouro Preto (MG), entre outros projetos. Além do apoio a novas ações, foi confirmada a continuidade a projetos já patrocinados como o Pixinguinha - retomado em 2004 pela Funarte com patrocínio da Petrobras -; os Prêmios Myriam Muniz, Klaus Vianna e Carequinha de fomento ao teatro, à dança e ao circo; editais como o Viva Capoeira (saiba mais) e o de Culturas Indígenas e o apoio à Escola Nacional de Circo.

O evento, realizado no Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, contou com as presenças do ministro da Cultura, Gilberto Gil; do presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli de Azevedo; da prefeita de Olinda (PE),
Luciana Santos; e do prefeito de Ouro Preto, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos.

Após a cerimônia, participaram da coletiva de imprensa a gerente de Patrocínios da Petrobras, Eliane Costa, e o presidente do IPHAN, Luiz Fernando de Almeida.

Os novos editais deverão ser publicados a partir de janeiro de 2007, no Portal do Ministério da Cultura. Os editais da Petrobras Cultural estão disponíveis no site da Petrobras (veja aqui). Dentre outros, compõem esse pacote:


- Projetos patrocinados pela Petrobras, cuja renovação está sendo anunciada nesta semana;
- Projeto Pixinguinha;
- Pauta Funarte (Programação das Salas Funarte RJ e DF);
- Escola Nacional de Circo (RJ);
- Prêmio Funarte-Petrobras Myriam Muniz (fomento ao teatro);
- Prêmio Funarte-Petrobras Klaus Vianna (fomento à dança);
- Revista de História (Biblioteca Nacional);
- Edital Cultura e Pensamento II;
- Encontro TEIA - II - Cultura e Educação;
- Prêmio Cultura Viva II;
- Ações para bandas, corais e orquestras;
- Edital de Segurança do Patrimônio / IPHAN;
- Prêmio de projetos culturais com foco em pessoas idosas;
- Prêmio Funarte-Petrobras Carequinha (fomento ao circo);
- Edital Funarte Conexão de Artes Visuais;
- Edital de apoio a festivais de música brasileira independente;
- Edital Viva Capoeira;
- Edital Culturas Indígenas 2007;
- Edital para exposição de acervos visuais 2007;
- Edital "Cultura nas Universidades" em parceria Fórum de Pró-Reitorias de
- Cultura e Extensão;
- Edital de documentários sobre patrimônio imaterial nacional para TVs públicas;
- Edital Cinemateca de restauro de filmes brasileiros (Programa de restauro de filmes);
- Hemeroteca Brasileira - A Biblioteca Nacional na mídia impressa;
- Inventário e exposição do acervo memória Biblioteca Nacional;
- Reserva técnica e preservação do Centro Técnico Audiovisual (CTAv/RJ);
- Arquivo de matrizes II (Cinemateca Brasileira em ITU/SP);
- Festival de Música Independente do Brasil (Recife/PE);
- Embutimento de Fiação de Olinda (PE);
- Embutimento de Fiação de Ouro Preto (MG);
- Museu Nacional da Quinta da Boa Vista (RJ);
- Faculdade de Medicina de Salvador (BA);
- Museu de Congonhas (SP);
- Museu Nacional de Belas Artes (RJ);
- Biblioteca Mindlin módulo 2007 (RJ);

Posted by João Domingues at 12:39 PM

dezembro 18, 2006

Debate Folha se São Paulo - É bem-vinda a Lei do Esporte?, artigos de Yacoff Sarkovas e Orlando Silva

Debate Folha se São Paulo - É bem-vinda a Lei do Esporte?, artigos de Yacoff Sarkovas e Orlando Silva

Falta gente na mesa, artigo de Yacoff Sarkovas

Uma lei imprescindível, artigo de Orlando Silva


Falta gente na mesa

Artigo de Yacoff Sarkovas, originalmente publicado na Folha de São Paulo, no dia 16 de dezembro de 2006

Nesta semana, a imprensa divulgou uma imagem inusitada. Personalidades artísticas e esportivas do país, sentadas lado a lado, disputando dedução fiscal do Imposto de Renda das empresas para suas áreas. Cada grupo se defendia destacando os benefícios sociais de sua atividade.

É inegável que cultura e esporte são de interesse da sociedade. Mas a questão central, propositadamente, passou ao largo dos holofotes: o modelo de financiamento público por dedução fiscal é insustentável econômica e socialmente.

Vamos imaginar que os médicos também reivindiquem lugar à mesa para investir um naco do imposto na saúde pública, a seu critério; os educadores, para manter abertas escolas públicas; as empresas de transporte, para criar estradas exclusivas; e -por que não?-, cada cidadão, para reter outro tanto do imposto para montar seu próprio esquema de segurança.

Quem sabe, até fazer justiça com as próprias mãos. Antes que a mesa estivesse cheia, não haveria mais imposto a recolher. Por conseqüência, poderíamos suprimir o Estado e dispensar os governos.

Tomar posse de recursos públicos sem contrapartida e destiná-los por critérios individuais e privados é um ato anti-republicano. Desinformados e iludidos pela justa perspectiva de injetar recursos no seu campo de atividade, atletas cometem o mesmo erro histórico dos artistas: lutam para propagar o câncer do incentivo fiscal, em vez de exigir políticas e fundos de financiamento direto do Estado, regidos por critérios técnicos e públicos. Esse modelo do incentivo fiscal, único no mundo, foi criado pela Lei Sarney, em 1986 -substituída pela Lei Rouanet por Collor, em 1991-, ampliado com a Lei do Audiovisual por Itamar, em 1993, e replicado por municípios e Estados via dedução no ISS, IPTU e ICMS. As leis de incentivo mobilizarão, neste ano, cerca de R$ 1 bilhão. Recursos públicos que financiam somente a parcela da produção cultural que desperta o interesse das empresas.

A dedução fiscal gera produção cultural porque distribui dinheiro, mas não é lógica nem justa. É uma forma prática de obter recursos sem enfrentar disputas no Orçamento. Nada tem a ver com patrocínio ou investimento privado de verdade. Empresas promovem ações sociais, ambientais, culturais, esportivas, de entretenimento e comportamento por serem uma estratégia eficaz, saudável e rentável de valorizar marcas e fortalecer relacionamentos. Por isso, em todo mundo, investem seus próprios recursos de marketing e comunicação.

No Brasil, a Lei do Audiovisual permite dedução integral no imposto a pagar e, ainda, o abatimento como despesa, reduzindo o imposto acima do valor aplicado. O resultado é um ganho real de mais de 130% ao "investidor", sem risco. Espectadores-cidadãos não se dão conta de que as marcas que aparecem na abertura dos filmes brasileiros são de empresas que ganham dinheiro público para fingir que são investidoras culturais e decidir que aquele filme, e não outro, deva ser produzido.

Longe dos holofotes, esse mecanismo perdulário está sendo ampliado, no Congresso, em regime de urgência, pelo projeto de lei nº 7.193/2006, enquanto o público se entretém com a disputa artistas versus atletas. A Lei do Audiovisual contaminou outras leis de incentivo fiscal, a começar pela Lei Rouanet, que, desde 1997, permite 100% de dedução, como agora ocorrerá com a Lei do Esporte. Importante saber: em outros países, incentivo fiscal é somente lançar as contribuições à cultura como despesa na declaração de renda. Ou seja, é poder doar dinheiro do próprio bolso sem ter de pagar imposto por isso.

É certo que o Estado brasileiro consome 50% do PIB, e pouco do que devolve tem valor reconhecido pela sociedade; é compreensível que os brasileiros desconfiem que os nossos governos sejam regidos pela corrupção. Mas não corrigiremos mazelas históricas subtraindo recursos e responsabilidade públicas para distribuí-las a interesses privados.

Melhor seria lutar para reduzir a carga tributária, para benefício da sociedade civil, e ajudar a construir um Estado mais eficaz, com capacidade de formular e implementar políticas públicas, financiando diretamente as ações por princípios republicanos.

YACOFF SARKOVAS, 52, especialista em atitudes de marca, é diretor-geral da Significa e da Articultura.


Uma lei imprescindível

Artigo de Orlando Silva, originalmente publicado na Folha de São Paulo, no dia 16 de dezembro de 2006

A polêmica que se instalou no Congresso em torno da Lei do Esporte nos permite refletir sobre os desafios para permitir o acesso ao esporte e ao lazer a todos.

A noção de esporte como direito é recente e sua consagração se deu na atual Constituição Federal. Um direito para todos é um dever para o Estado, que se realiza por meio de políticas públicas. A criação do Ministério do Esporte e a implantação da Política Nacional de Esporte são passos que têm nos permitido transformar o direito formal em real. Algumas tarefas estratégicas apontadas pela Política Nacional de Esporte precisam ser concluídas.

1) Ajustar o Sistema Nacional de Esporte, fixando melhor as atribuições de cada um dos agentes que atuam na área esportiva.

2) Ampliar a infra-estrutura esportiva nacional.

3) Capacitar melhor os recursos humanos que educam e orientam as atividades físicas.

4) Estabelecer vínculos efetivos entre esporte e educação, garantindo acesso a conhecimento e experiências de caráter lúdico, educativo, além de permitir a iniciação e a formação esportiva em escolas e universidades.

Essa agenda exige financiamento, e aí se situa a presente discussão sobre incentivo fiscal para o esporte. A tradição brasileira é de financiamento do esporte quase que exclusivamente pelo Estado -de forma direta ou por meio de empresas públicas.

O sentido da Lei do Esporte é atrair as empresas privadas para experimentar um relacionamento com o esporte. Por se tratar de renúncia fiscal, portanto, de interesse público, o funcionamento da lei deve se pautar pela máxima transparência e publicidade de todas as iniciativas.

Ganham as empresas ao associar suas marcas a valores como vitória, solidariedade, disciplina e persistência, características típicas das atividades esportivas. Ganha o esporte ao conquistar uma nova fonte de financiamento, pois confiamos que os vínculos estabelecidos com a implantação da lei se projetarão para além de sua vigência.

Os recursos incentivados serão aplicados em projetos coerentes com a Política Nacional de Esporte. Regulamentada, a lei servirá a atletas sem patrocínio, clubes que trabalham na formação de base, modalidades com menos visibilidade e, sobretudo, instituições governamentais e não-governamentais que realizam projetos socioesportivos, que poderão ter mais oportunidades para se desenvolver.

A Lei do Esporte é explícita quando veda o uso de recursos incentivados para remunerar atletas profissionais, o que transforma em pó as ilações feitas com relação ao futebol profissional. A agenda do futebol é outra e está em plena execução, com a Lei de Moralização do Futebol, o Estatuto do Torcedor, a Timemania, o relatório Paz no Esporte e, em breve, a lei que protege o clube formador.

A Lei do Esporte tem o privilégio de ser posterior a iniciativas de outras áreas, o que nos permitirá aprender com os êxitos e, sobretudo, com os limites já experimentados noutros setores. A Lei do Esporte precisa ser nacional, beneficiar as regiões mais necessitadas; deve atender a todas as dimensões do esporte, e não se concentrar apenas em uma ou outra modalidade ou ícone; deve atender a quem precisa, não aos que já concentram os recursos e se utilizam de mecanismos como esse para fortalecer sua imagem com dinheiro público.

O esporte reflete o grau de desenvolvimento de uma nação. O estímulo que o esporte receberá com a lei de incentivo permitirá avanços na garantia do direito ao esporte para todos os brasileiros e brasileiras. Por isso, a Lei do Esporte é mais que bem-vinda. É imprescindível.

ORLANDO SILVA DE JESUS JÚNIOR, 35, é ministro de Estado do Esporte.

Posted by João Domingues at 11:11 AM

dezembro 12, 2006

Arte vira entretenimento no Itaú Cultural, por Fabio Cypriano

Arte vira entretenimento no Itaú Cultural

Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 11 de dezembro de 2006

Existe um notável esforço em agradar ao público na mostra "Primeira Pessoa", no Itaú Cultural. Tal vetor pode ser constatado, particularmente, na maneira simpática de expor as obras, caso já percebido no primeiro trabalho da exposição, composto por mais de mil retratos de Antonietta Clélia Rangel Forman, mãe de Emil Forman (1954-1983), fotografados distintos autores em situações cotidianas e colecionadas pelo artista ao longo de sua vida.

Essa instalação é um surpreendente trabalho de fotografia e memória, intrigante por seu caráter obsessivo e preciosista. Ambiente imersivo, de certa forma, ele vai dar o tom dos demais trabalhos.

A exposição -com curadoria de Agnaldo Farias e Christine Greiner e cenografia de Valdy Lopes Jr., que tem a intimidade como tema- envolve outras expressões que tangenciam as artes plásticas, como o trabalho de duas companhias de teatro, o Grupo Lume e o Teatro da Vertigem, e a música de Hermeto Paschoal. Todos participam da mostra com instalações também imersivas, que buscam traduzir para o espaço expositivo as poéticas de cada um. Entretanto, aquilo que é risco e ousadia, como no caso da Vertigem, que realizou um espetáculo, "BR-3", no rio Tietê, quando transposto para uma sala repleta de água por onde se pode caminhar com galochas, torna-se uma redução tamanha da obra que seu sentido se esvai.

Essa simplificação -que permite a tranqüila e prazerosa fruição da mostra pelo público- chega a ser irritantemente politicamente correta quando apresenta partituras de Hermeto penduradas numa sala com chão de terra, cercadas por frases como "Viva o som e as nuvens coloridas". Aí, vê-se que o estilo Bia Lessa de montagem de exposição fez escola.

Essa escola -que pode ser vista como uma forma de inclusão social, tão em moda no discurso do governo federal e que sempre busca agradar ao público- precisa ser questionada quando está em função de uma exposição de arte: afinal, arte é para agradar? Desde Duchamp, esse princípio foi banido do sistema de arte. E, atualmente, a arte tem sido das últimas plataformas de questionamento.

Entretanto, é pouco provável que um instituto cultural vinculado a uma grande corporação tenha interesse no questionamento e, aí, os limites institucionais tornam-se claros: a arte deve ser vista como entretenimento: superficial e feliz.

Nem todas as obras seguem esse roteiro, caso dos trabalhos de Marcelo do Campo, heterônimo de Dora Longo Bahia. A questão é que, quando a obra é exibida nesse contexto, seu potencial radical se esvai, tornando a própria "mise-en-scène" o discurso oficial. E aí Marshall McLuhan estava certo: o meio é a mensagem. Não é a toa, afinal, que quando o banco tinha uma campanha publicitária que fazia as suas agências piscarem durante a Copa do Mundo, o instituto cultural piscava no mesmo ritmo, com patrocínio das leis de incentivo à cultura.


Serviço: Primeira Pessoa
Albano Afonso, Ana Catarina Vieira, Ângelo Madureira, Cao Guimarães, Chico Correa, Cinthia Kunifas, Clara Trigo, Claudia Muller, Daniel Acosta, Denise Stuzt, Dora Longo Bahia, Efrain Almeida, Emil Forman, Emilie Sugai, Frederico Paredes, Gil Vicente, Grupo Lume, Gustavo Ciríaco, Janaína Tschape, José Rufino, Lenora Lobo, Letícia Sekito, Lia Rodrigues, Marta Soares, Rachel Zuanon, Rosana Ricalde, Sandra Cinto, Teatro Vertigem, Telma César, Thelma Bonavita

Curadoria de Agnaldo Farias, Christine Greiner e equipe do Itaú Cultural

11 de novembro de 2006 a 28 de janeiro de 2007

Itaú Cultural
Av Paulista 149, estação Brigadeiro do metrô, São Paulo - SP
11-2168-1776 / 1777 ou atendimento@itaucultural.org.br
www.itaucultural.org.br
Terça a sexta, 10-21h; sábados, domingos e feriados, 10-19h

Posted by João Domingues at 10:29 AM | Comentários (1)

Altos e baixos da Bienal, entrevista de Claire Bishop a Juliana Monachesi

Altos e baixos da Bienal

Entrevista de Claire Bishop a Juliana Monachesi, originalmente publicada no Caderno Mais da Folha de São Paulo, no dia 10 de dezembro de 2006

A crítica inglesa Claire Bishop, especialista em arte social, avalia os pontos positivos e negativos da principal mostra do Brasil

A 27ª Bienal Internacional de São Paulo, que se encerra no próximo domingo, tem gerado muita discussão em torno da escolha da arte social e das práticas artísticas colaborativas como eixo central na curadoria, cujo título é emprestado dos seminários de Roland Barthes "Como Viver Junto" (Martins Fontes).

Em entrevista à Folha, a crítica de arte e professora do departamento de história da arte da Universidade Warwick (Reino Unido) Claire Bishop -que, em artigos recentes em revistas como "Artforum" e "October", tem se dedicado à análise daquilo que denomina "a virada social na arte"-, comenta a atual edição da mostra.

Bishop esteve no Brasil no início de novembro a convite do Fórum Permanente de Museus, em parceria com os departamentos de artes plásticas e de biblioteconomia da USP, para participar de mesa-redonda sobre "o social na arte".


FOLHA - A sra. identifica uma postura moralista por parte de críticos e curadores, quando avaliam o mérito de uma obra apenas pelo aspecto social, sem levar em conta critérios estéticos. Essa postura estaria presente na 27ª Bienal, uma vez que várias críticas à mostra reivindicam alguma forma de transcendência ou apontam a falta de obras que propiciem uma experiência estética?

CLAIRE BISHOP - Em primeiro lugar, devo esclarecer minha distância desse par binário -arte engajada social ou politicamente x "transcendência". O paradigma romântico de arte "transcendente" foi desafiado e desmantelado por artistas ao longo de todo o século 20, precisamente porque ele apresenta a arte como algo universal que se eleva acima da realidade social e política. Não defendo uma arte da "transcendência".

Em relação à Bienal, apesar de haver na mostra deste ano uma certa quantidade de obras engajadas socialmente, a maioria delas tem também uma lógica estética. A maioria dos trabalhos consiste de esculturas, vídeos, filmes, fotografias ou desenhos, muito do que é visualmente sedutor: a obra de Raimond Chaves com capas de disco, por exemplo, as vestimentas de plástico de Laura Lima ou o trabalho de León Ferrari.

A vasta maioria das obras está localizada no interior do pavilhão da Bienal e tem sua própria sustentação dentro do espaço expositivo. Isso contrasta com o tipo de trabalho que venho criticando na Europa: trabalhos que -em nome do engajamento político direto- não enfrentam a questão de sua própria representação para outros públicos. Esses projetos são com freqüência dependentes de texto, diagramas e fotografias para transpor ao espaço expositivo atividades que ocorreram em outro lugar.

FOLHA - A edição atual da mostra não é, portanto, um exemplo emblemático daquilo que a sra. denomina "virada social na arte"?

BISHOP - Minha sensação -a partir de conversas que tive com pessoas em São Paulo e de minha visita à Bienal de 2002- é que o Brasil teve duas exposições conservadoras sob a curadoria do alemão Alfons Hug.

Com isso, quero dizer: mostras com uma preponderância de pinturas, fotografias de grandes dimensões e esculturas objetuais, tudo com forte valor de mercado. Isso fez com que o Brasil perdesse o passo em relação aos desenvolvimentos na arte contemporânea.

Alguns desses desenvolvimentos tomam a forma de projetos engajados socialmente, transdisciplinares, em geral envolvendo colaborações com não-artistas ou outros especialistas, como arquitetos, geógrafos, ativistas. Na Bienal deste ano, Marjetica Potrc seria um bom exemplo dessa tendência.

Eu não me oponho a isso em princípio, apenas quando a obra fracassa em pensar sua subseqüente recepção. Há um exemplo evidente desse tipo de trabalho na Bienal: o artista grego Vangelis Vlahos, que apresenta sua pesquisa acerca do edifício Gropius, em Atenas, em formato de repreensível austeridade e não resolvido. Por que essa pesquisa não é um livro?

Outro exemplo seria o artista esloveno Tadej Pogacar, cuja apresentação corporativa de um projeto para aumentar a consciência sobre trabalhadores do sexo é -à parte sua estratégia óbvia e não inspiradora de camisetas em displays-, mostrada com toda a imaginação de uma companhia de relações públicas medíocre.

FOLHA - Rafael Campos Rocha, em artigo sobre a Bienal, apelidou-a de "bienong", em referência às organizações não-governamentais. Como estabelecer uma distinção crítica entre arte e assistencialismo?

BISHOP - A distinção para mim está na medida em que esses projetos também refletem sobre sua apresentação, recepção e circulação dentro do domínio da arte contemporânea.

As pessoas podem se sentir desconfortáveis com alguns dos projetos exibidos porque eles operam com um pé no domínio da arte contemporânea e outro no âmbito do chamado "mundo real". Temos de aprender a viver com esse desconforto, que é algo comparável ao final dos anos 1960, quando artistas começaram a desmaterializar o objeto de arte e trabalhar conceitualmente.

Mudanças semelhantes estão acontecendo hoje: quando vemos algo em uma galeria, não estamos necessariamente vendo todo o trabalho. Estamos vendo parte de um projeto, um "non-site" que existe em relação dialética com o "site", como propôs Robert Smithson.

Estou interessada em encontrar uma maneira de analisar essa arte que não caia na armadilha de apenas considerar as justificações morais ou políticas de sua existência.

As justificações são importantes, mas, se terminarmos julgando obras somente nestes termos, ficaremos apenas com uma arte didática.

Minha impressão da 27ª Bienal é a de que não se trata de uma exposição moralista. E isso porque a maioria dos projetos opera de forma bem-sucedida no interior do espaço expositivo e possui uma lógica estética que é íntegra em relação à especificidade do projeto.

Por exemplo, Paula Trope usa uma câmera "pinhole" [câmeras de orifício feitas a partir de latas recicladas] em seu trabalho colaborativo com garotos de rua no Rio, e os efeitos formais dessa fotografia são um fator importante na recepção das imagens.

A câmera "pinhole" confere um efeito sobrenatural, distorcido, que é apropriado à representação de seu mundo de fantasia do Morrinho; ela também frustra nosso desejo por uma visão clara e "objetiva" desse mundo (com todas as conotações de poder que esse olhar poderia trazer) e, assim, espelha nosso desejo voyeurístico de ter acesso a esses conflituosos e, quem sabe, perigosos adolescentes.

Tendo dito isso, há projetos na Bienal que são muito menos bem-sucedidos, apesar de terem uma forte presença escultural. A maior parte do piso térreo é espetáculo vazio: a instalação com guarda-chuvas de Marepe e o trabalho de Nikos Charalambidis assim como o mercado de Meschac Gaba em um piso superior são fracos conceitualmente.

Há muita fotografia documental que funciona como espaço reservado para problemas políticos em países específicos, em vez de serem escolhidas como fotografias narrativa ou visualmente complexas. Muitos dos trabalhos comissionados são decepcionantes: Vladimir Arkhipov e Antoni Miralda, em particular, parecem resultado de uma fórmula.

FOLHA - No caso do coletivo Long March Project, a exibição dos recortes de papel ao lado de fichas biográficas de seus respectivos autores é conceitualmente consistente ou "politicamente correta"?

BISHOP - O argumento que utilizei antes sobre ver apenas metade de um trabalho na galeria é particularmente verdadeiro no caso do Long March. Este é um projeto de cultura visual (arquivo das influências na tradição de recorte de papel na China rural), um projeto político (censo composto de estatísticas sobre os moradores da região) e um projeto social (levar uma infra-estrutura de lazer básico a povoações rurais).

Portanto, o fato de os arquivos serem expostos com os recortes de papel não é uma decisão "politicamente correta" no que se refere à autoria colaborativa. É integral à "raison d'être" conceitual do Long March Project.

Na minha opinião, o projeto fornece um pungente contraponto à maioria da arte contemporânea chinesa em circulação internacionalmente hoje: obras em vídeo que exibem uma fascinação alegre pela adoção, de forma incrivelmente acelerada, do capitalismo.

Portanto, a questão que se coloca para mim ao observar algo como o Long March Project é: o que significa esse tipo de projeto transdisciplinar, multifacetado, estar ganhando espaço no âmbito da arte contemporânea hoje? Sua presença na bienal testemunha uma resistência a (indesejáveis) mudanças sociais e políticas na China.

Mas o fato de que isso seja obtido não por meio de ilustrações diretas ou documentais -mas na forma de um censo e de um arquivo de arte tradicional que, todavia, revela o impacto da modernidade e da pós-modernidade- é estética e politicamente estimulante.

Isso é bastante diferente do tipo de questão que o projeto banal de Tadej Pogacar levanta ao chamar a atenção para a prostituição. Nesse caso, fico me perguntando: por que essas camisetas são tão terríveis? Por que o desfile de moda é tão pouco convincente como um desfile de moda? Por que o tom de sua linha do tempo é tão descuidadosamente corporativo? Eu não detecto nenhuma visão artística na concepção e apresentação dessa obra.

FOLHA - Quais obras mais lhe chamaram a atenção na Bienal?

BISHOP - Existem várias maneiras de apreciar exposições: como um conjunto de trabalhos individuais, como uma iniciativa curatorial, como um projeto intelectual. Avalio essa bienal como um projeto intelectual. Entre os artistas que já me eram familiares, Roman Ondák, Tacita Dean, Goshka Macuga e Lida Abdul fizeram apresentações vigorosas.

Fiquei satisfeita em me deparar com o trabalho de Laura Lima, Raimond Chaves e Simon Evans pela primeira vez; a descoberta mais prazerosa foram os esotéricos filmes de João Maria Gusmão e Pedro Paiva.

As reconstruções de Matta-Clark foram informativas do ponto de vista da história da arte, mas o filme de Ivan Cardoso com Hélio Oiticica nos anos 1970 foi revelador.

Posted by João Domingues at 10:23 AM | Comentários (3)

dezembro 11, 2006

International Perspectives On Being Polish, By Benjamin Genocchio

Anna Bella Geiger 006.jpg
Anna Bella Geiger - Recens Orbis Descriptio cum Eurous

International Perspectives On Being Polish

Artigo de Benjamin Genocchio, originalmente publicado na seção Art Review do Jornal The New York Times, no dia 3 de dezembro de 2006, que dedica um parágrafo ao trabalho da artista brasileira Anna Bella Geiger

Trecho de texto traduzido do artigo do New York Times, de domingo 3 de dezembro último, no Art Review sobre a mostra intitulada POZA.

...entre eles está Anna Bella Geiger, uma artista de tal proeminência na cena da arte brasileira contemporânea ... está incluída nesta mostra. Uma grande artista, ela está representada por uma obra dramaticamente maravilhosa onde partes dobradas e detalhadas de cobre e chumbo se relacionam dentro dentro de gavetas de arquivo de ferro preenchidas por camadas de cera de abelha (encáustica). Há uma escrita em hebraico em uma das caixas de madeira separadas ,que denota sua ancestralidade judaico-polonesa.


An expansive exhibition of Polish art has taken over Real Art Ways, a longstanding alternative art space in Hartford founded in 1975. Titled ''Poza,'' the show gathers the work of 31 artists with Polish roots, some of them living in Poland, others in the United States, Canada, France and Brazil. Lectures, a film series, a Web project and several artist performances accompany the show.

Marek Bartelik, a New York-based curator and art historian of Polish descent, has chosen artists of different generations -- the oldest was born in 1933, the youngest in 1980 -- and a dizzying range of artistic media, including painting, photography, sculpture, video, drawing and site-specific installation.

This diversity is intentional. Rather than coming up with a unifying theme for the show and then looking for artists to illustrate the idea, Mr. Bartelik is more interested in exploring the uncertainties and instability of Polish identity in the 21st century. To this end he has sought out Polish artists whose work often deals with themes of journeying and displacement.

Even before the show opened, displacement in its most literal sense became an issue. Photographs of gay couples holding hands, by the Polish artist Karolina Bregula, were rejected for public display in Hartford by a billboard company that had initially agreed to donate billboard rental space to coincide with the ''Poza'' premiere. A company spokesman said in a news release issued by Real Art Ways that it feared the billboards would be vandalized. A display about the doomed billboard project, with scaled-down versions of the censored images, has been incorporated into the exhibition, together with sheets of poster board with markers for the public to express reactions to the incident. The gallery has run through five sheets so far.

The interactive display -- placed between a large show in the main gallery and three smaller shows in the Real Room, a gallery at the other end of the building -- is in keeping with the exhibition's theme, which is less about Polish art than the experience of being Polish in the wider world.

With so many participating artists, this show could very easily have been cluttered. But Mr. Bartelik and the team at Real Art Ways have done an excellent job in grouping the works in such a way that the display feels snug but not too tight, beginning with a dramatic pairing of a heavy wooden sculpture carved with power tools by Ursula von Rydingsvard and some delicate emulsion-based screenprints on silk by Jerzy Kubina.

Many of the artists in the exhibition live in Brooklyn, which has long been home to a large Polish expatriate population. Ms. von Rydingsvard and Mr. Kubina are among them, as is Joanna Malinowska, who in 2005 traveled to the Canadian Arctic to pay homage to the pianist Glenn Gould. She set up a solar-powered boom box playing Gould's recording of Bach's ''Goldberg'' Variations. Unfortunately, the soundtrack on the video display of the project is often overwhelmed by torrents of wind.

It may come as a surprise to learn that there is a small Polish population in Brazil, which accounts for a handful of artists in this show. Among them is Anna Bella Geiger, who is such a stalwart of the Brazilian contemporary art scene that it seems strange to see her included here. A great artist, she is represented by a dramatically marvelous assemblage of detailed, plaited pieces of copper and lead in old iron archive boxes filled with layers of beeswax. There is Hebrew writing on the box representative of her Jewish-Polish ancestry.

From the wilder side of Poland's expatriate art community come some videos, including Brooklyn-based Pawel Wojtasik's ''Aquarium'' (2006), an animal-rights and environmental rant that was recently screened at the Westport Arts Center. It contains stunning footage of pristine glacial areas in Alaska and a few blissful scenes shot at aquariums nationwide, including the Mystic Aquarium and Institute for Exploration.

Other artists' videos take us on an excursion through Poland and ideas of Polish-ness; these include conceptual stunts by the Azorro Group, a Polish art collective formed in 2001, and Jacek Malinowski's exploration of modern urban rituals, like going to the gym. There is also Krzysztof Wodiczko's painfully tedious video eliciting some vague concern about the psychological problems of abused women. Mr. Wodiczko's video project never springs to life, particularly when compared with other works, so many of which exude an intense vitality and exciting topicality.

''Poza'' is at Real Art Ways, 56 Arbor Street, Hartford, through Jan. 29. Information: (860) 232-1006 or www.realartways.org.

Posted by João Domingues at 2:48 PM

dezembro 9, 2006

Cultura tenta barrar Lei do Esporte para evitar briga por patrocínio, por Rodrigo Mattos e Silvana Arantes

Cultura tenta barrar Lei do Esporte para evitar briga por patrocínio

Matéria de Rodrigo Mattos e Silvana Arantes, originalmente publicada na Folha de S.Paulo do dia 9 de dezembro de 2006

Aprovado na Câmara Federal, o projeto de lei de incentivos fiscais para o esporte (1367/ 03) é visto como uma ameaça por artistas e produtores culturais, que tentarão alterá-lo, o que pode impedir sua aprovação. Temem a concorrência por verba entre os setores.

Parlamentares ligados ao esporte, porém, já reagiram. Isso deu início a uma batalha em torno da legislação, que ocorre no Senado e envolve os ministérios da Cultura e do Esporte.

"É uma intranqüilidade [a existência do projeto]", afirma Ronaldo Bianchi, vice-presidente do Itaú Cultural.

O desagrado dos representantes da cultura vem do fato de que, se aprovada a nova lei, projetos esportivos e culturais passarão a disputar o mesmo "bolo" de patrocínio empresarial.

Isso ocorrerá porque a Lei Rouanet e a Lei do Esporte estariam limitadas ao mesmo teto de renúncia fiscal, até 4% do Imposto de Renda das pessoas jurídicas. Ou seja, as empresas podem deixar de investir em cultura, optando pelo esporte.

"Existe essa preocupação [em relação à nova lei]", afirma o ministro da Cultura, Gilberto Gil à Folha. Gil questiona a capacidade do ministério do Esporte de gerenciar a sua lei.

"Dificultoso"

"Esse primeiro momento da gestão da lei vai ser dificultoso para eles. Nesse sentido acho que eles deviam contar com as experiências da Lei Rouanet."

Parlamentares ligados ao esporte contra-atacam: não consideram eficiente a atuação do setor cultural na captação de incentivos.

"Quanto [dinheiro] a Cultura tem conseguido por ano? Eles não conseguem nem captar o que têm direito", disse o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), relator do projeto na Câmara. "É uma mediocridade [o lobby cultural]. Há um universo grande a ser explorado."

Em 2005, foram captados por meio da Lei Rouanet cerca de R$ 700 milhões. Houve um aumento de 23% em relação ao ano anterior. No caso do esporte, haverá um teto de R$ 200 milhões por ano, segundo parlamentares ligados ao projeto.

Até agora o lobby dos artistas não é explícito porque o setor do cinema --um dos maiores beneficiários da Lei Rouanet-- está concentrado em aprovar no Senado o projeto de lei que cria o Fundo Setorial do Audiovisual. A proposta destina mais verbas ao setor.

Nos bastidores, já atuam para apresentar uma emenda derrubando um item da Lei de Incentivo ao Esporte que vincula as verbas esportivas e culturais ao mesmo teto.

Na prática, isso inviabilizaria a lei em favor dos esportistas.

"Se houver alteração, isso vai aumentar a renúncia fiscal do governo. A Receita [Federal] não aceitaria", afirmou o deputado federal Gilmar Machado (PT-MG), articulador governista do setor do esporte.

No Senado, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), comanda o lobby em prol da legislação em favor do esporte.

O vice-presidente do Itaú Cultural diz desconhecer a articulação para a apresentação da emenda, mas afirma que "cabe a discussão no Senado sobre o impacto econômico [da Lei do Esporte] na cadeia de trabalho cultural". Segundo Bianchi, "são perguntas que precisam ser colocadas".

Outros parlamentares ligados ao esporte aderem ao contra-ataque, com influência do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e do Ministério do Esporte. O COB é o maior interessado na aprovação da lei, pois as confederações filiadas e outras entidades seriam beneficiadas.

Compromisso

O Ministério do Esporte espera que o executivo mantenha o compromisso de aprovar a lei sem alterações no Senado, como fez na Câmara. Pela assessoria, a pasta informou não ter recebido pedidos de mudanças vindos da área cultura.

Até deputados da oposição já foram mobilizados em favor do esporte. Autor do projeto, o deputado Bismarck Maia (PSDB-CE) disse ter o apoio do líder de seu partido no Senado, Arthur Virgílio, "Se alterarem o projeto, vamos mudar na Câmara."

Esse lobby tem o desfalque da numerosa bancada da bola, que é composta por parlamentares conectados ao futebol e não está agindo porque não haverá benefício para os cartolas.

Clubes de futebol com esportes olímpicos tampouco se mobilizaram. O presidente do Flamengo, Márcio Braga, diz que nada fará. Ex-deputado, ele foi um dos mais atuantes no lobby pela aprovação da Timemania, loteria que favoreceu os clubes.

"O Nuzman [Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB] que está pilotando isso. Não tenho como largar o clube agora", disse ele.

Gil acena com uma conciliação. "Esporte é cultura."

Posted by João Domingues at 11:46 AM

Gil dá sinais de que vai permanecer no governo, por Adauri Antunes Barbosa

Gil dá sinais de que vai permanecer no governo

Matéria de Adauri Antunes Barbosa, originalmente publicada no Globo Online, no dia 8 de dezembro de 2006

O ministro da Cultura, Gilberto Gil disse nesta quinta-feira que até a próxima quarta se reunirá com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para decidir sobre sua permanência no governo. Embora não tenha antecipado sua decisão, Gil deu sinais de que vai continuar no cargo, depois de receber, na Bienal de São Paulo, uma carta com a assinatura de mais de 300 artistas pedindo que fique no ministério.

- A gente só pode pensar que é porque estão achando bom, não é? Primeiro, se acostumaram com o convívio. Depois, acho que começaram a fazer a leitura dessa linguagem pós-moderna do Ministério atual, com muitos fragmentos - disse Gil.

O ministro revelou que, em conversa com Caetano Veloso, que não pediu para ele ficar, encontraram "compreensão mútua para uma idéia de permanência".

- Não, ele (Caetano) não me pediu que ficasse. Ele conversou muito comigo na segunda-feira e nós encontramos linhas de compreensão mútua para uma idéia de permanência, para uma idéia de continuação de trabalho - disse, reafirmando que ainda não está decidido:

- Não, não está definido porque eu estou conversando ainda com o governo, com o presidente, especialmente.

"A gente só pode pensar que é porque estão achando bom, não é? "

Mas garantiu que a definição está perto:

- (o período de reflexão termina) É agora, até o fim dessa semana. Assim que eu puder voltar a falar com o presidente. Falei com ele na sexta-feira passada. Tentei voltar a falar com ele ontem e anteontem, mas ele estava muito atarefado, falei por telefone com ele. Ele até tentou achar uma brecha na agenda, mas não pôde. Tenho a impressão que lá pela terça-feira, quarta-feira ele deve sentar comigo e aí decide - revelou.

Segundo Gil, o que está "pegando" para que saia a decisão sobre sua continuidade no Ministério da Cultura é que a "vida é assim mesmo":

- O que está pegando é que a vida é assim mesmo. Tem que pegar porque o dia de amanhã não é o de hoje. Então, o dia de amanhã tem que ser feito com hoje, mas tem que ser feito também com o que ainda não está posto hoje. É o que vai ser processado hoje à noite, de hoje para amanhã. É o inusitado, a construção e a desconstrução da próxima noite. Tem tudo isso. O ânimo de alta temperatura da tarde de hoje e o desânimo da manhã seguinte, tudo isso jogado junto. É tudo junto porque tem vida humana, tem eu pessoa, tem as pessoas próximas, tem o meu limite físico, tem um bocado de coisas. ao mesmo tempo tem a desmesura do ideal, a desmesura da vontade, da religiosidade, da idéia de religar tudo, de ligar tudo o tempo todo. Ao mesmo tempo há os limites da máquina governamental, os limites da máquina do mundo.

Para tomar a decisão, Gil disse que tem levado em conta vários aspectos, mas o peso dos apoios que tem é importante e "interessantíssimo".

"É muito lisonjeiro as pessoas pedirem para você dizer sim. Isso é muito importante, tem um valor de transmissão de positividade, de seqüencialidade que é muito importante, é interessantíssimo "

- Tem aspectos, primeiro, para esse lado pessoal, o lado da limitação pessoal, física psíquica e tudo, o fato de a gente se achar pequeno para tarefas tão gigantes. Isso tudo é compensado por essa palavra do outro, que estimula, que diz assim: 'você é pequeno, sua força é pouca mas é suficiente'. Tem esse ânimo, além da lisonja. É muito lisonjeiro as pessoas pedirem para você dizer sim, as pessoas dizerem sim para que você diga sim por elas. Isso é muito importante, tem um valor de transmissão de positividade, de seqüencialidade que é muito importante, é interessantíssimo - definiu.

De acordo com o ministro da Cultura, tem outro lado que está examinando antes de tomar uma posição sobre a continuidade no governo, que é a aglutinação de forças em torno de projetos e idéias. E sentenciou:

- Eu não sou técnico, nem sou nada. Eu sou poeta! Então, pronto, eu estou no governo como tal!

Posted by João Domingues at 10:04 AM

dezembro 8, 2006

Pesquisa reforça necessidade de orçamento maior para o MinC, por Carlos Gustavo Yoda

Pesquisa reforça necessidade de orçamento maior para o MinC

Matéria de Carlos Gustavo Yoda, originalmente publicada na Carta Maior, no dia 8 de dezembro de 2006

Pesquisa do IBGE coloca a cultura como o quarto item dos gastos da família brasileira e reforça a necessidade de uma melhor atenção para a indústria criativa e melhor orçamento para o Ministério da Cultura, que hoje conta com cerca de 0,6% do bolo da União. Especialistas em políticas culturais apontam que a pesquisa é importante não para transformar a cultura em números, mas para utilizá-los a favor dela.

SALVADOR - O orçamento do Ministério da Cultura, desde que foi instituído como ministério desligado do MEC, em 1985, sempre recebeu a menor fatia do bolo orçamentário da União. É claro o não reconhecimento por parte das administrações públicas da cultura como setor fundamental e estratégico para a identidade, soberania e desenvolvimento do país.

Ana Carla Fonseca Reis, que acaba de lançar a obra Economia da Cultura e Desenvolvimento Sustentável - O Caleidoscópio da Cultura, lembra que é cena comum nas reuniões de repartição dos bolos orçamentários nos governos, seja na esfera federal, estadual ou municipal, cada setor apresentar seus programas, projetos, prioridades, e solicitar o orçamento correspondente.

"A cultura defende a importância dos investimentos pleiteados para ações de consolidação da identidade, de promoção da diversidade cultural, de ampliação do acesso à cultura, dentre outros de importância inegável. Mas faltam-lhes números que, adicionalmente a esses benefícios, comprovem o impacto econômico dos investimentos realizados no setor cultural", destaca a administradora, em sua obra, ao afirmar a desvantagem que fica aos administradores das políticas culturais em relação aos outros setores.

Os gastos com cultura ocupam o quarto lugar no orçamento das famílias brasileiras, totalizando 4,4% e ficando atrás das despesas com saúde, vestuário e educação. A conclusão é do estudo Sistema de Informações de Indicadores Culturais, pesquisa inédita divulgada no fim de novembro pelo IBGE.

Os dados foram obtidos através do cruzamento de informações de sete pesquisas do instituto. As famílias brasileiras gastam em média com cultura R$ 115,50 por mês, dos quais R$ 50,97 com telefonia, seguida pela aquisição de eletrodomésticos ligados à área cultural (R$ 17,25) e atividades de cultura, lazer e festas (R$ 13,82). A cultura ocupa cerca de 1,43 milhões de trabalhadores, o que corresponde a 4% da mão-de-obra ativa do país, ou 3,7 milhões de pessoas, levando em consideração também o setor informal. O rendimento médio é de cinco salários mínimos, enquanto a média nacional fica em três salários.

O secretário executivo do MinC, Juca Ferreira (na foto), que esteve presente na mesa de abertura do II Fórum Cultural Mundial, em associação ao VII Mercado Cultural, realizado entre 1º e 4 de dezembro em Salvador, acredita que as possibilidades de mais movimentação orçamentária para a cultura a partir da pesquisa não ficará apenas restrita ao dinheiro público.

"O setor privado agora pode acordar e ver quão importante a cultura é para a economia e como pode e deve fazer parte de um projeto de desenvolvimento sustentável para o país. Os projetos com patrocínio deixam de servir de mero marketing cultural e de responsabilidade social para a boa imagem das empresas e passam a serem entendidos como negócios. Mas precisamos tomar também os cuidados para que as empresas não tomem conta da ordem da produção cultural. Precisamos pensar mecanismos para preservar a diversidade", disse Juca, em entrevista à Carta Maior.

"Isso é fundamental para que o Ministério e as Secretarias de Cultura possam atingir seus objetivos de política cultural. A proposta, portanto, não é reduzir a cultura a números, mas utilizá-los a favor dela", pontua Ana Carla, que também participou do Mercado Cultural, lembrando que a análise dos números explicita também uma característica fundamental que é a transversalidade, ou sua presença nos diversos setores e disciplinas.

Posted by João Domingues at 4:48 PM

dezembro 7, 2006

Coletivos ganham vulto nos anos 2000, por Juliana Monachesi

Coletivos ganham vulto nos anos 2000

Matéria de Juliana Monachesi, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 6 de dezembro de 2006

Ondas de "artivismo" surgem no Brasil nos últimos anos da década de 90 e início dos anos 2000, em sintonia com os movimentos antiglobalização e as tensões culturais e políticas à flor da pele vivenciadas em Seattle (1999), Gênova (2001) e Davos (2003). O papel dessa nova geração, que prefere as ruas ao espaço institucional e que privilegia as ações da troca direta com o público em lugar de obras no museu, é recriar a politização na arte.

O coletivismo brasileiro de início dos anos 2000 tinha um ar quixotesco como nas ações do grupo Laranjas, de Porto Alegre, cujas ações consistiam em distribuir gratuitamente suco de laranja aos pedestres em ruas movimentadas da capital gaúcha, instalar longas faixas de lambe-lambe cor de laranja (sem quaisquer frases de mobilização) em túneis da cidade ou, como fizeram em uma intervenção em 2003, bater de porta em porta (todos devidamente uniformizados com macacão laranja) e oferecer aos moradores de Porto Alegre o "Minuto Laranja", vídeo de um minuto de duração em que o monitor de TV era preenchido pela cor. O grupo registrava a visita às casas daqueles que os convidavam a entrar e a reação das pessoas.

Os artistas gaúchos Cristina Ribas, Cristiano Lenhardt, Fabiana Rossarola, Jorge Menna Barreto e Patrícia Francisco, integrantes do grupo, hoje espalhados pelo Brasil, continuam atuando como coletivo em certas ocasiões, como em recente exposição na Fundação Joaquim Nabuco, em Recife, quando montaram um QG na galeria disponibilizada para sua exposição, que funcionou como pólo irradiador de suas intervenções nas ruas do Recife.

Peça-chave
Uma figura central na articulação dos coletivos brasileiros foi a artista Graziela Kunsch, que manteve entre 2001 e 2003 o Centro de ContraCultura de São Paulo, espaço dedicado a residências artísticas -sua própria casa, na Vila Mariana-, por onde passaram grupos como Urucum, de Macapá; Transição Listrada, de Fortaleza; EmpreZa, de Goiânia; GRUPO, de Belo Horizonte; TelephoneColorido, de Recife, além do próprio Laranjas.

Vários dos coletivos dessa época se desfizeram ou se reagruparam em novos -é da natureza desses grupos ter um tempo limitado de vida uma vez que, conforme ensina Hakim Bey em "TAZ - Zona Autônoma Temporária", uma das balizas teóricas dos coletivos, a potência transformadora, cristaliza-se, torna-se poder.

O que havia de romântico nas ações de início de 2000 ganhou tom mais explicitamente político a partir de iniciativas como a ocupação artística em dezembro de 2003 em edifício na av. Prestes Maia, ocupado pelo Movimento dos Sem-Teto do Centro.

Sintomático desta "virada" é a atuação de Graziela Kunsch em anos recentes: engajada no CMI (Centro de Mídia Independente), a artista defende o uso da bicicleta contra a poluição em São Paulo, organiza manifestações em "comemoração" do aniversário da Rede Globo e atua em jornais como "O Independente", de Florianópolis.

Posted by João Domingues at 10:56 AM

Grupo faz "artivismo" em ação em São Paulo, por Adriana Ferreira Silva

Grupo faz "artivismo" em ação em São Paulo

Matéria de Adriana Ferreira Silva, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 6 de dezembro de 2006

Experiência Imersiva Ambiental propõe questionamento da vigilância

Performance em câmeras instaladas na cidade se inspira em exemplos anteriores; projetos como esse estão na Bienal de SP

Numa cidade como São Paulo, não é novidade andar pelas ruas e assistir a cenas inusitadas, que parecem ter saído de um filme. Hoje, no entanto, alguns movimentos duvidosos podem fazer parte de um projeto artístico.

A partir das 11h, num local não-divulgado -para não estragar a surpresa-, cerca de 25 pessoas irão protagonizar performances diversas diante das câmeras que vigiam as ruas. A atuação, batizada de "Atitude Suspeita", faz parte da semana de eventos proposta pelo Experiência Imersiva Ambiental (EIA), grupo que reúne artistas de todo o país para fazer trabalhos de arte pública, que tanto podem ser uma festa como uma ação, como a desta manhã.

Essa atividade se encaixa em duas categorias que, segundo o pesquisador Ricardo Rosas, 36, criador do site Rizoma (endereço ao lado), têm proliferado no Brasil: a da "mídia tática" e a da "arte ativista", engajada ou "artivista". A exemplo de artistas, grupos e coletivos espalhados pelo mundo todo, os brasileiros têm desenvolvido trabalhos que questionam a mídia, a política e a própria arte por meio de instalações, performances, vídeos etc.

Por trás das ações que irão ocorrer hoje -que também não foram descritas, para não estragar a surpresa- estão questões como "Quais são os direitos sobre o uso da imagem?" ou "Por que devemos ser vigiados?" . "Recebemos pela internet o número de câmeras que existe em SP e o local onde se encontram. Pensamos que seria engraçado se estivessem acontecendo coisas suspeitas em frente a elas", explica Eduardo Verderame, 35, integrante do EIA.

Vigiados
Críticas tendo como ponto de partida as câmeras de vigilância estão longe de ser uma novidade. Em Nova York, o grupo Surveillance Camera Players (www.notbored.org/the-scp.html) mapeia locais onde estão esses equipamentos em cidades americanas e realiza performances.

Na 27ª Bienal de São Paulo, o paulistano Marcelo Cidade espalhou câmeras de papelão pelo prédio da mostra. "A câmera de vigilância faz parte de nosso cotidiano. Cada vez mais as imagens ali geradas podem ser também assistidas em público. Isso sugere que, na sociedade em que vivemos, o espetáculo e a vigilância se sobrepõem. Questões ligadas à privacidade, ao direito individual, ao testemunho legal se interpenetram com a arte", explica Cristina Freire, 44, co-curadora da Bienal e professora do MAC-USP.

"Acredito que não basta apenas valer-se das imagens da câmera de vigilância, mas refletir sobre seu sentido e significados mais profundos", completa Freire. No caso do EIA, Verderame diz que o grupo prefere acreditar no "poder simbólico" da "Atitude Suspeita".

"A atuação vai repercutir em outros lugares, os registros serão mostrados para outras pessoas, e o número de pessoas a tomar contato com a questão cresce, outros se envolvem", aposta Verderame.

O inusitado é que a crítica ao uso desses dispositivos pelo poder público para vigiar os paulistanos foi desenvolvida dentro de um órgão público: a Oficina Oswald de Andrade, onde o EIA realizou o curso "Vigilia", que preparou os artistas para a "Atitude Suspeita".

"Nós usamos o equipamento público para o que ele deve ser usado: em prol das pessoas, da liberdade de pensamento e expressão", fala Verderame.

Engajados
As ruas não são o único cenário dos "artivistas". Na Bienal, além de Marcelo Cidade, houve a controversa participação do coletivo dinamarquês Superflex, que ficou de fora da mostra porque pretendia reapropriar-se dos ingredientes de um refrigerante e, eliminando a marca, converter o lucro aos produtores comunitários.

Ainda na Bienal, Cristina Freire destaca a instalação da brasileira Renata Lucas e a obra da mexicana Minerva Cuevas, que, descreve a curadora, "criou a empresa virtual Mejor Vida Corporation, com estrutura similar à das grandes corporações". "Essa corporação artística opera na "www" [internet], subverte o sentido de comércio na rede e questiona dali a paisagem social em tempos de globalização", diz a curadora.

De longa data
Ricardo Rosas destaca que as ações de mídia tática e arte ativismo -veja definições ao lado- estão, "aos poucos", amadurecendo no Brasil. Um exemplo disso é o curso sobre intervenção urbana ministrado pelo artista catalão Antoni Muntadas, na USP.

Mas Rosas faz questão de lembrar que os que atuam hoje são herdeiros de grupos como o 3Nós3, formado por Mario Ramiro, Rafael França e Hudnilson Jr.. Em 1979, o trio fez a intervenção "Ensacamento", cobrindo com sacos de lixo a cabeça de esculturas e monumentos públicos de São Paulo.

"Nos anos 60 e 70, muitos artistas no Brasil e em outros países da América Latina valeram-se de estratégias e práticas que extrapolaram o restrito campo da arte em seus meios e técnicas convencionais. A situação política vivida naquele momento é importante para compreender essas proposições", avalia Freire.

Posted by João Domingues at 10:54 AM

dezembro 5, 2006

Curadores e críticos evitam pôr a mão na cumbuca, por Marcos Augusto Gonçalves

Curadores e críticos evitam pôr a mão na cumbuca

Texto de Marcos Augusto Gonçalves, originalmente publicado na Folha de São Paulo, no dia 2 de dezembro de 2006

Mal ou bem, alguma discussão sobre a Bienal vem se travando, com artigos em jornais e em sites especializados. Vai-se configurando uma opinião simpática ou elogiosa em relação a aspectos como o fim das representações nacionais, os seminários, o esforço didático e os bons artistas selecionados.

Em oposição, questiona-se o viés "politicamente correto" da mostra e a gritante presença de facilitações politizadas e trabalhos documentais que mal roçam o estatuto de arte, embora possam causar grande efeito para um público em busca de sentido -afinal, não é tão difícil assim assimilar "mensagens" bem intencionadas que questionam a desigualdade social, a opressão etc.

Sente-se, no entanto, no debate acerca da Bienal, uma ausência marcante: a de alguns dos principais curadores e críticos (ou ex-críticos e curadores?) do país.

A consolidação da curadoria como uma opção efetiva de inserção no mercado para intelectuais especializados em arte tem a vantagem, ao menos teórica, de qualificar a organização de exposições e acervos. Ganham, com isso, as instituições e o público. A contrapartida desvantajosa é que a expansão dessa categoria tem se realizado por meio do recrutamento de profissionais, em geral ligados ao meio universitário ou editorial, que se dedicavam -ou poderiam fazê-lo- à crítica de arte.

Pode-se argumentar que o exercício da atividade "curatorial" implica uma dimensão crítica: ao selecionar, correlacionar ou confrontar obras, artistas e tradições, o curador exprime uma opinião, um conceito, um ponto de vista acerca da arte -e o defende em textos publicados em catálogos.

Mas ainda que o raciocínio seja verdadeiro, a tarefa da curadoria não substitui a da crítica propriamente dita. Mais do que isso, ou pior do que isso, o que às vezes se observa neste meio é uma formidável complacência, ou então o silêncio estratégico, em relação às diversas propostas que se apresentam ao público.

O "esprit de corps" ou a ética entre colegas ou os interesses individuais presentes e futuros, de resto perfeitamente legítimos, acabam subtraindo do debate opiniões que poderiam se mostrar valiosas.

No caso da Bienal, a Ilustrada procurou, nas semanas que se seguiram à inauguração, colher avaliações de alguns críticos-curadores, com o intuito de ampliar a discussão pública e o leque de opiniões acerca deste que é, enfim, o principal evento de arte do país, com notória repercussão internacional. Sem sucesso. Nessa cumbuca poucos quiseram colocar a mão.

A omissão empobrece ou pelo menos torna a discussão mais opaca -pois, em parte, ela se realiza intramuros, nas internas, de maneira pouco transparente e sistemática.

Posted by João Domingues at 10:35 AM

Na mostra, a ética eclipsou a estética, por Juliana Monachesi

Na mostra, a ética eclipsou a estética

Matéria de Juliana Monachesi, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 2 de dezembro de 2006

Ao eleger a arte colaborativa, documental, com pretensões políticas, exposição assume risco de ser monocórdia e redundante

Contexto marcado por propostas sem transcendência acaba por prejudicar a leitura de poéticas singulares

A 27ª Bienal de São Paulo é um problema, na melhor acepção do termo. Depois de duas bienais corretas e "agradáveis", a presente mostra equipara-se à 24ª edição -em que o conceito de antropofagia cultural iluminava os processos de construção de identidade-, que gerou debate e propiciou uma releitura da historiografia da arte.

"Como Viver Junto" elege uma vertente da produção contemporânea -a de práticas colaborativas, arte engajada política e socialmente e, por decorrência, arte documental- e busca dar consistência teórica a essa produção ao apresentá-la, em massa, como uma tendência forte na cultura de hoje. Não por acaso a aposta curatorial em obras e artistas que têm como referente conflitos étnicos, religiosos e ideológicos, questões de gênero, raça e desigualdade socioeconômica coincide com uma avalanche de lançamentos editoriais sobre a realidade no Oriente Médio, na África, sobre o dessemelhante.

O assunto está no ar e a curadoria o apanhou no ato, propondo a sua discussão no âmbito da arte. O risco, como apontam certas críticas à Bienal, é um resultado monocórdio. Expor lado a lado, para tratar do esfacelamento das utopias, as impressões em papel de parede de Barbara Visser -fotografias de poltronas e cadeiras modernistas quebradas-, a videoinstalação de Lars Ramberg -que documenta a construção de um edifício onde antes se erigia a sede do governo da República Democrática Alemã- e as "Ant Chairs" de Arne Jacobsen "corrigidas" pelo coletivo Superflex é de fato redundante.

Por outro lado, enfileirar as fotos de Guy Tillim, que retratam a paisagem urbana de Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, os resquícios da era colonial no país e a mobilização e ativismo durante as eleições em 2006, em frente à série de Mauro Restiffe que flagra Brasília no dia da posse de Lula, em 2003, gera confusões, podendo sugerir que ambos são fotojornalistas, o que não é fato no caso do artista brasileiro. Nestes dois exemplos, o resultado é o enfraquecimento dos trabalhos pela opção desastrada no estabelecimento de diálogos.

Mas a monotonia não está apenas na montagem da exposição, está na escolha dos curadores de privilegiar a postura ética do artista em detrimento da experiência estética que as obras poderiam gerar. Assim, vê-se o cuidado da artista palestina Ahlam Shibli ao fotografar gays e transexuais que abandonaram os países do leste para poderem viver suas opções sexuais; vê-se nos vídeos de Esra Ersen, nascida em Ancara, o interesse pelas dificuldades de imigrantes turcos para se adaptar ao idioma alemão ou pelos meninos de rua que relatam seus problemas em Istambul.

Prevalece no embate com grande parte das obras em vídeo e fotografia a impressão de que tudo foi negociado e muito respeitoso entre artista e retratado (Paula Trope, Claudia Andujar, Pieter Hugo etc.). A prerrogativa ética em detrimento da estética é ainda mais evidente nos projetos colaborativos: Tadej Pogacar & Daspu, Eloisa Cartonera, Taller Popular de Serigrafía, Long March Project. Causas nobres -defesa de minorias, de economias paralelas, do direito à manifestação política, das práticas artesanais etc.- cuja apresentação em um espaço dedicado à arte peca pela ausência de qualquer tipo de transcendência. E esse contexto acaba por prejudicar a apreensão de poéticas singulares: a instalação de Jane Alexander logo na entrada da Bienal, com cercas, arame farpado e seguranças uniformizados, é de uma literalidade no conjunto da exposição que inviabiliza o fascínio pela produção de uma artista renomada que logrou com seus "garotos carniceiros" (seres híbridos de homem e monstro) construir um emblema dos paradoxos da condição humana.

Nada contra todos os honoráveis valores em jogo na exposição (ética, respeito, inclusão etc.), mas a Bienal fica mais instigante justamente nos momentos em que real e ficcional se confundem (Ola Pehrson, Yael Bartana, Michael Snow, Shaun Gladwell, Ann Lislegaard), em que política e humor se mesclam (Minerva Cuevas, Jarbas Lopes, Antal Lakner, Sanghee Song, Loulou Cherinet) ou quando a crítica está amparada em uma formalização genial, como na obra "Costumes", de Laura Lima.

O maior problema, e aqui na acepção negativa do termo, é entender como uma Bienal que assume um tal esgarçamento de fronteiras entre as práticas culturais pode ignorar as experiências de arte colaborativa on-line e os movimentos de a(r)tivismo que eclodiram com a democratização do acesso à internet, cuja atuação é inseparável da organicidade da rede?

Posted by João Domingues at 10:33 AM

Proposta é consistente e inovadora, por Fabio Cypriano

Proposta é consistente e inovadora

Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 2 de dezembro de 2006

Novidades e conceitos adotados pela instituição e curadoria representam um aporte importante para o circuito de arte

Projeto assumido pela curadoria tirou da Bienal o caráter espetacular e efêmero, investindo na formação e no intercâmbio

"Como Viver Junto", a 27ª edição da Bienal, é resultado de uma série de novos conceitos na realização das bienais paulistanas: teve seu time curatorial escolhido em processo de seleção por projeto, acabou com as representações nacionais, estendeu a temporalidade da mostra com seminários, criou residências artísticas.

Tudo isso representou um significativo aporte ao circuito artístico da cidade, pois tirou da Bienal o caráter espetacular e efêmero, investindo na formação e no intercâmbio. Palestras como as dos artistas Rirkrit Tiravanija e Marjetica Potrc ou do professores em arquitetura Eyal Weyzman e Beatriz Colomina devem ser considerados pontos altos da Bienal.

Criada a partir de conceitos do artista Hélio Oiticica (1937 1980), a Bienal, tendo à frente Lisette Lagnado, é, claramente, construída a partir de um projeto consistente e ai está seu grande mérito. Como uma lente, esse projeto pode direcionar o olhar do visitante. E surge aí um dos dilemas da mostra: certos trabalhos se tornam ilustração das teses dos curadores.

Um exemplo disso está nas fotos do sul-africano Guy Tillim, realizadas no Congo, com registros da casa do ex-ditador do país e das eleições. Contudo, o caráter documental das fotos é seu próprio limite, mesmo problema que ocorre com Randa Shaath e suas fotos de coberturas de edifícios e de calçadas no Cairo. Nesses casos, é patente a ilustração do "como viver junto": no primeiro caso como conflito, no segundo como ocupação do mesmo espaço. Os curadores usam essas obras para abordar temas, como a ditadura ou o uso informal dos espaços. Por isso, as legendas tornam-se tão marcantes na mostra, explicando por demais as obras, o que, às vezes, as reduz.

Os retratos de índios numerados, de Claudia Andujar, estão nesse contexto, mas possuem uma contundência que escapa ao mero registro e apresentam complexidade superior aos trabalhos dos fotojornalistas, até mesmo na maneira como a obra está exposta.

Esse dilema, contudo, está presente nas próprias propostas de Oiticica, com o "adeus ao esteticismo", e nas discussões da arte conceitual nos anos 70 e 80. Assim, ganha extremo sentido a presença de contemporâneos históricos como Gordon Matta-Clark, Ana Mendieta e Dan Graham. Por tudo isso, tornam-se emblemáticas obras que conseguem questionar conceitos de Oiticica, como a loja de Laura Lima e a instalação de Thomas Hirschhorn. A artista propõe que visitantes vistam trajes. Mas, diferentemente dos Parangolés, para serem usados caminhando-se na mostra, eles são apenas para serem experimentados como numa loja, produto de fetiche, o que acaba sendo irônico.

Já Hirschhorn, com "Restaure Agora", apresenta uma instalação com dezenas de livros de filosofia e ferramentas, ambos símbolos da transformação -seja pela idéia, seja pela ação, em meio a fotos de pessoas esquartejadas. Livros e ferramentas estão amarrados, não servem. Em monitores, quem se movimenta é o artista, apenas com os braços, sem sair do lugar. Seu silêncio é revelador.

Os curadores da Bienal também assumiram um risco: obrigar os artistas a apresentarem novas obras. Especialmente no Brasil, onde há tão pouco incentivo à produção, essa proposta não deixa de ser valiosa, mas, ótimos artistas como Marepe, com seus guarda-chuvas, ou Jarbas Lopes, com o resultado de sua expedição à Amazônia, têm trabalhos aquém do que já realizaram.

O que os valoriza, no entanto, é a proposta de apresentar várias obras do mesmo artista, sinal de de respeito dos curadores aos artistas, valorizando sua obra e evitando sua instrumentalização. Também se percebe na mostra as dificuldades da instituição em lidar com obras que extravasam o campo artístico, caso positivo do grupo Superflex. Proibido de apresentar o "Guaraná Power", a bebida que de fato contém guaraná, ao contrário de produtos de grandes corporações, a censura foi assumida e incorporada à exposição. Já "Fogo Amigo", de Marcelo Cidade, um bloqueador de celulares, não funciona, e o pedestal com o aparelho representa a falta de apoio da instituição ao trabalho.

Acabar com as representações nacionais tornou a mostra menos suntuosa, com um tom mais intimista -e, em alguns casos, é preciso atenção redobrada para descobrir trabalhos como o vídeo "Seqüência da Tempestade", de Shwan Gladewll, uma surpreendente fusão de Caspar David Friedrich com skate e samba, os desenhos alucinantes de Simon Evans, ou a instalação misteriosa de Renata Lucas. É no silêncio, como na gestualidade de Hirschhorn, afinal, que a mostra cumpre seu programa. Seria essa a nova política?

Posted by João Domingues at 10:32 AM

dezembro 4, 2006

Carta Apoio Gilberto Gil

Carta Apoio Gilberto Gil

Prezado(a) Senhor(a),

Vimos por meio deste encaminhar documento que expressa o apoio do segmento cultural brasileiro em prol das políticas iniciadas pelo Ministro Gilberto Gil. Tal documento será entregue ao Ministro em evento no próximo dia 07 de dezembro, a partir de 19h, no mezanino do Pavilhão da Bienal de São Paulo, para o qual o convidamos neste momento.

Caso esteja de acordo com o conteúdo, favor encaminhar sua adesão para o e-mail cartagil@bienalsaopaulo.org.br para que possamos registrar sua assinatura no texto final.

Certos de contar com sua participação no evento e sua assinatura nesta carta aberta, reiteramos votos de estima e apreço.

Atenciosamente,

Manoel Francisco Pires da Costa
Presidente da Fundação Bienal de São Paulo

Carta Aberta pela Cultura Brasileira

Nós - artistas, produtores, instituições - reunidos neste dia na Fundação Bienal de São Paulo, gostaríamos de manifestar o nosso apoio à continuidade das linhas diretivas dadas nos últimos quatro anos pelo Ministério da Cultura.

Trata-se de uma política exemplar introduzida pelo Ministro Gilberto Gil de interlocução com o setor cultural, que pode ser ampliada neste próximo mandato, possibilitando grandes conquistas.

Ressaltamos abaixo alguns pontos que consideramos centrais na política desta gestão e porque a consideramos valiosa para a cultura brasileira:

- Implantação do programa "Arte Democracia", que prevê a ampliação do acesso aos eventos culturais para toda população;

- Promoção dos programas setoriais de exportação de produtos culturais brasileiros;

- Consolidação de um Plano Nacional de Cultura capaz de ampliar, potencializar e institucionalizar a atual política deste governo;

- Fortalecimento das políticas internacionais, visando à proteção e à promoção da diversidade cultural brasileira, avançando nas políticas de comércio internacional e promoção da produção cultural brasileira no exterior; Continuidade dos programas de promoção, tal como o "Ano do Brasil na França" e "Copa da Cultura na Alemanha";

São apenas alguns aspectos que fazem com que a política do Ministro Gilberto Gil mereça prosseguimento. Por esse motivo, manifestamos, pelo presente, nosso desejo de que esta política possa permanecer à frente do Ministério da Cultura para dar continuidade ao exímio esforço desenvolvido, avançando nos projetos iniciados e colhendo os frutos que certamente virão.

Posted by João Domingues at 10:59 AM