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maio 20, 2004
Mídia tática X mídia estática
Emeios enviado por stewarthome@bol.com.br para o Canal Contemporâneo: o primeiro, no dia 17 de maio de 2004 sobre matéria publicada no Estado de São Paulo referente ao mesmo dia, e o segundo, no dia 18 de maio sobre matéria da coluna Informe de Arte de Cleusa Maria no Jornal do Brasil, com cópia para a referida colunista.
A semana começa especialmente fria para as artes visuais nos jornais. Tudo bem que a edição de segunda-feira seja feita no fim de semana e também que seja o dia mais morno para as artes, uma vez que a maioria dos museus e centros culturais encontra-se fechada (e que dificilmente se publique um texto inventivo desvinculado da agenda de vernissages), mas o que dizer de uma matéria de página inteira com o título infame "Van Gogh - o lado obscuro do rei dos girassóis"? O lado obscuro de Van Gogh? Puxa, isso sim é que é notícia! E rei dos girassóis??????? Faça-me o favor!
Os desserviços se encadeiam: a "linha fina", que supostamente serve para sintetizar o conteúdo do texto, informa: "o trágico corte da orelha, com o tempo, ganhou um tom divertido que suavizou a biografia do artista atormentado";
O "olho", que, segundo consta nos manuais de jornalismo, deve destacar uma passagem surpreendente do artigo, revela: "gostava de cadeiras, cebolas, botas velhas";vertido ao português do jornal britânico "the sunday times", o artigo não mereceu por parte do jornal qualquer contextualização sobre o autor, waldemar januszczak, ou sobre a relevância de sua publicação: fica parecendo que está ali para preencher um vazio, por falta de assunto? Por falta de cabeças pensantes para produzir (ou ao menos selecionar) conteúdos para o caderno? Não se sabe.
Quem, apesar de todo o desleixo por parte do jornal, tem o incompreensível impulso de ler o texto de Januszczak fica sabendo que ele é um documentarista que realizou uma série para TV sobre Van Gogh e que descobriu, de fato, novidades sobre o "rei dos girassóis". as cartas a Theo que circulam ad nauseum pelo mundo foram retalhadas pela família e, somente agora, por iniciativa do Museu Van Gogh serão publicadas com maior integridade. Os girassóis eram um tributo a Gauguin; Vincent era, na verdade, "o rei das heras", obcecado pela sujeira dos ninhos secretos de
amor; a amputação da orelha (oferecida por Vincent a uma prostituta) foi uma apropriação de um hábito das arenas perto de arles (cortar a orelha do touro e jogá-la a uma dama quando o toureiro luta especialmente bem).
Aliás, Januszczak é autor do controverso documentário que no início de 2003 causou celeuma na inglaterra ao mostrar a performance "eating people", do artista chinês Zhu Yu, em que este ingere um bebê natimorto. Na ocasião, Januszczak defendeu a exibição da performance dizendo que seu filme tentava entender o motivo de a china produzir este tipo de arte.
Bem, agora a coisa está ficando interessante, certo? Eu estou aqui fazendo o trabalho que algum editor teve preguiça de fazer para responder à convocação do Canal Contemporâneo para "atiçar a brasa". Mídia tática contra a mídia estática! Van Gogh em plena segunda-feira? Ok, mas que tal com o título: "as cartas censuradas de Van Gogh", "as heras e a obsessão sexual, segundo Van Gogh" ou qualquer coisa do gênero? Que tal com a linha fina: documentarista britânico desvenda quadros desconhecidos e propõe releitura de obras consagradas do pintor? Que tal com o olho: "em auvers, um jovem casal local afirmou tê-lo visto se masturbando na floresta"?
Maurizio Cattelan é um dos mais importantes artistas da contemporaneidade. é de uma coerência e uma seriedade que encontra pouca equivalência no mundo das artes. seus trabalhos promovem a acareação entre valores adquiridos e posturas renovadoras, entre versões pasteurizadas da história e releituras de ideologia libertária. na obra "século 20", também conhecida pelo título "a balada de trotsky", por exemplo, um cavalo taxidermizado que pende do teto do espaço expositivo, o artista consegue sintetizar, por meio de uma imagem poderosíssima, a passagem de um tempo a outro, além de dialogar criticamente com toda uma tradição pictórica e escultórica.
No limite entre realidade e ficção, os trabalhos de Maurizio Cattelan simulam e subverte as regras da cultura e da sociedade em um jogo contínuo de insubordinação. Sucateando toda uma trajetória e um conhecimento construídos em torno do nome do artista, o "informe de arte" (!!!!) do Jornal do Brasil, assinado pela colunista (????) Cleusa Maria, brinda-nos hoje com a pérola "para provocar". Trata-se de uma nota com esse brilhante título que, de maneira conservadora e atestando completa ignorância sobre a estatura de Cattelan, "analisa" a destruição de uma obra pública que o artista realizou este mês na cidade de Milão commissionada pela fundação Nicola Trussardi e concebida para a "Piazza XXIV Maggio", em Milão, "um ambiente monumental nos cruzamentos da história", em que cattelan "faz referência às campanhas napoleônicas e à primeira e segunda guerras mundiais, [a obra] encena o epílogo de um conto de fadas macabro, um antigo ritual popular e uma nova lenda urbana", conforme texto no site da Fundação. Cattelan escolheu a árvore mais antiga da cidade para pendurar três esculturas hiper-realistas representando crianças que, apesar de amarradas pelo pescoço, vigiam com olhos atentos o que se passa ao redor.
Para Cleusa Maria, "depois de chocar o público e indignar autoridades", a obra foi "desmontada" por um transeunte embuído da "tarefa". "Os bombeiros terminaram o serviço", explica a colunista de suposto conhecimento sobre arte contemporânea. Bem, vamos aos fatos: o prefeito de Milão, Gabriele Albertini, afirmou, na inauguração da peça tratar-se de "um bom exemplo de cultura anti anti-conformista"; a obra foi encomendada e chancelada pelo curador da instituição, Massimiliano Gioni. A inauguração, dia 5 de maio, foi badalada, gerando curiosidade e reflexão não apenas no público especializado como nas pessoas leigas que circulavam pela praça."É uma 'mise-en-scene' de uma fábula popular que captura e, ao mesmo tempo, remove as tensões e horrores de nosso presente. Maurizio Cattelan apresenta uma imagem de esperança, sugerindo que por último nós temos a capacidade de escapar de nosso destino, de nossas raízes, de nossas obsessões e pesadelos", escreveu um crítico. O que ocorreu foi que, alguns dias depois, um homem se sentiu tão ofendido que se julgou no direito de pegar depredar uma obra de arte pública. a reação causada foi tão apaixonada que o senhor franco de Bernardo, 42, foi até um lugar conseguir uma escada para poder atingir as esculturas. Depois de ter retirado duas delas, perdeu o equilíbrio e caiu, batendo a cabeça em um trilho, e acabou o dia em um hospital. considero a queda e as contusões mais do que merecidas.
A senhora Cleusa Maria, pasmem, continua e consegue, apesar das ínfimas onze linhas dedicadas ao assunto, cometer mais tolices em sua nota "para provocar" (só pode ser "para provocar" o leitor, penso, a esta altura do texto), afirmando, com ironia, que uma obra de Cattelan foi arrematada por dois milhões de dólares em leilão da Sotheby's [que, aliás, vem grafada de modo errado: "Sothby's" (sic)] recentemente. Trata-se da instalação "Século 20", que ela identifica apenas como "a balada de Trotsky", demonstrando que nunca ouvira falar da obra antes das notícias de agência anunciando a venda, e que descreve assim: "[o trabalho] é um cavalo empalhado, selado e suspenso do teto".
Azar do leitor, que fica achando que o trabalho é realmente só isso. e este é só mais um exemplo do desserviço que o jornalismo presta às artes visuais...
Bomba na precária vida artística carioca
Emeio enviado por Carlos Eduardo Bernardi para os jornais cariocas, Jornal do Brasil e O Globo, no dia 18 de maio de 2004.
Prezado jornalista,
Faço parte de uma boa parcela da população interessada no bem-estar da cidade e que ingenuamente se entrega às intenções artísticas como uma opção genuína para uma ampla reavaliação de nossa realidade. Parece-me que o contexto da administração das políticas públicas de cultura urge de auto-crítica, pois confesso, não tenho a menor habilidade de compreender certas andanças de seus responsáveis.
Se enxergo bem, e bem o faço, existe um hiato voraz entre as vozes administrativas e artísticas. Diante do inacreditável silêncio das instituições municipais, os planos da Prefeitura para o fomento às artes plásticas (visuais?) são colocados em xeque nesse momento. Parece que ronda a cabeça de nosso Secretário de Cultura, o Sr. Ricardo Macieira, a brilhante iniciativa de brindar-nos com o fechamento das galerias de arte do Espaço Cultural Sérgio Porto!
Desarticular um grupo cultural retirando dele um legítimo lugar de encontro é, fora de qualquer questionamento, uma covardia. Se pensarmos além, trata-se também de um desencanto. Se adequarmos mais ainda nosso pensamento, trata-se sim de uma contradição, já que há pouco a "Cidade" pensava num alto investimento para uma instituição - a construção do Museu Guggenheim - que trata dos mesmos elementos estéticos do Espaço Sérgio Porto - sem julgamento de valores. Não podemos perder de vista que foi deles a iniciativa de colocar-se em saudável discussão esse empreendimento "multi-nacional-estético.
A Rua Humaitá 163 tem sido reduto de encontros interessantes - e interessados - de uma classe de artistas que merece ser reconhecida por sua capacidade de transpor certos limites estéticos, como também ultrapassar uma lentidão cândida das políticas culturais da cidade.
Mas o que me causa certo constrangimento de ser representado por esses co-cidadãos é um certo esmero na falta de inteligência política. Mal saímos de um transtorno judicial de um contrato que perambulava por corredores incertos do dinheiro público, nossos administradores nos dão outro chute para fora, causando um novo embate com a classe dos artistas plásticos. E não percamos de vista que estamos em pleno ano eleitoral! Pergunta freqüente, se falta dinheiro às instituições da cidade, por que sobravam recursos ao Museu Guggenheim?
Essa realidade crítica, ou ausente de crítica, pode ser parcialmente explicada pela condução da política de financiamento cultural. Seguindo o fluxo que se impõe na Lei do ISS, o Espaço Sérgio Porto provavelmente se transformará em salas de cinema. É injusto um lugar para pensar e escoar a produção cinematográfica? Não. Seria produtivo escolhermos um lugar consagrado às artes plásticas para transforma-lo num espaço destinado ao cinema da cidade? Mas por que a Lei do ISS não prevê uma solução para o caso, a construção de espaços na cidade destinados à apreciação cinematográfica? A ação soa um pouco arrogante, uma pretensa manobra política que deseja colocar uma classe artística contra a outra, que em nada agita a cidade senão ao caos improdutivo.
Que lugar da história cultural da cidade pretendem o Prefeito César Maia e o seu Secretário de Cultura Ricardo Macieira ao infestarem a cidade com a praga Mazeredo e deixando órfã a arte contemporânea carioca com o fechamento das galerias do Sérgio Porto? Será essa a política cultural que precisamos para a cidade anfitriã dos Jogos Pan-Americanos de 2007?
Na minha ambição de cidadão, sogro de artista, pai de futura produtora cultural, espero empenho da imprensa em discutir essa questão. Lembrem-se: não temos um Conselho de Cultura no município.
Grato,
Carlos Bernardi
Mazeredo X Amilcar
Emeio enviado por Patricia Canetti para os jornais O Globo e Jornal do Brasil em 20 de maio de 2004.
Caros Jornalistas,
Vi nessa matéria na Folha de sábado (reproduzida abaixo) que o nosso Secretário de Cultura, Ricardo Macieira, depois dele mesmo ter arrombado o Espaço Público Carioca, resolveu colocar a tranca e inventou uma Comissão de Proteção da Paisagem Urbana da Cidade do Rio de Janeiro, formada por 14 pessoas.
Gostaria de pedir a vocês que investiguem os propósitos de nosso Secretário e de nossa Comissão, que por ter sido criada em período de eleições, parece querer separar as atitudes desse mesmo governo e criar um factóide para que se apague os demandos do mesmo Secretário nessa área.
Tenho curiosidade de saber o que pensam os participantes dessa Comissão a respeito das obras da escultora Mazeredo.
Agradeço desde já um posicionamento desse jornal em defesa de nossa cidade e da verdade, tão necessária no momento em que temos que julgar as ações do governo que aí está e que pretende se reeleger.
Patricia Canetti
Matéria originalmente publicada na Folha de São Paulo no sábado, dia 15 de maio de 2004.
PATRIMÔNIO PÚBLICO - Comissão irá avaliar novos pedidos e opinar sobre monumentos
Rio definirá destino de estátuas
LUIZ FERNANDO VIANNA DA SUCURSAL DO RIO
Entre estátuas, monumentos e peças contemporâneas, há cerca de 500 esculturas nas ruas do Rio. O destino delas e dos novos projetos de intervenção nos espaços públicos está, a partir de agora, nas mãos de 14 pessoas. O secretário municipal das Culturas, Ricardo Macieira, criou, por decreto, a Comissão de Proteção da Paisagem Urbana da Cidade do Rio de Janeiro.
Em reuniões mensais, a comissão avaliará os pedidos que chegam à prefeitura, proporá temas e locais para novas esculturas e poderá opinar sobre os monumentos e obras que já estão instalados na cidade.
"Vamos discutir critérios para as intervenções artísticas, algo de que o Rio precisava há muito tempo", diz Macieira, que presidirá a comissão.
Ele está acabando de fazer os convites, mas já lista os nomes: Paulo Herkenhoff, diretor do Museu Nacional de Belas Artes; Lauro Cavalcanti, diretor do Paço Imperial; Fernando Cocchiarale, curador do Museu de Arte Moderna; Luciano Figueiredo, diretor do Centro de Artes Hélio Oiticica, entre outros.
"A idéia é muito boa, porque nunca houve uma política consistente em termos de qualidade e planejamento para as esculturas", diz Luciano Figueiredo.
"A idéia da comissão é excelente", apóia o escultor Ascânio MMM, para quem o grupo deve preferir esculturas a estátuas. "Esta cidade já está cheia de estátuas, algumas lamentáveis. É preciso avaliar bem as ofertas."
Macieira pensou na comissão após rejeitar projeto de monumento para os Jogos Pan-Americanos de 2007, pedido pelo Comitê Olímpico Brasileiro.
Matéria originalmente publicada no jornal O Globo na quinta-feira, dia 20 de maio de 2004.
Tribuna da arte pública
DANIELA NAME E PAULO HENRIQUE FERREIRA
A prefeitura anunciou esta semana a criação de uma comissão para julgar os projetos de esculturas públicas apresentados para a cidade. O grupo, presidido pelo secretário municipal das Culturas, Ricardo Macieira, e composto por 15 artistas, arquitetos e críticos de arte, vai avaliar se cada peça tem qualidade estética e se é adequada urbanisticamente.
Macieira afirma que a comissão foi criada para evitar favorecimentos e também impedir que o município aceite instalar uma obra em lugar nobre apenas porque ela foi patrocinada, saindo a custo zero para a prefeitura. Fontes ligadas à secretaria dizem ainda que a gota d'água para a criação do comitê teria sido a recusa, há 15 dias, da peça "Mãe da paz", da artista Marly Mazeredo, para a Avenida Niemeyer. A obra acabou sendo instalada no Mirante Dois Irmãos.
Não estou sabendo de nada. Foi uma encomenda de uma entidade contra a violência e a obra só não foi instalada no Mirante do Leblon, na Niemeyer, porque ele é tombado diz Mazeredo. É formidável a criação desta comissão. É importante que pessoas da área de artes julguem as obras.
Mazeredo que tem 15 esculturas em bairros diversos também recebeu autorização da Secretaria municipal de Esportes e Lazer para a realização de dez obras para as vilas olímpicas que vão abrigar atletas de toda a América durante os Jogos Pan Americanos de 2007. A primeira peça da série já está no Complexo Miécimo da Silva, em Campo Grande.
Estas esculturas para a Secretaria de Esportes foram fechadas sem qualquer concorrência diz uma fonte ligada ao prefeito Cesar Maia. Na hora da aprovação da peça de Mazeredo para a Avenida Niemeyer, houve uma celeuma imensa, já que a artista é muito bem relacionada.
O projeto de esculturas sobre esporte existe há dois anos e, depois de uma consulta à Secretaria de Esportes e Lazer, foi aprovado pelo RioArte diz Mazeredo, que conta que a série de esculturas está sendo financiada, através das leis de incentivo, por um grande hotel da cidade.
A nova comissão é formada pelo arquiteto Augusto Ivan, pelos críticos Paulo Herkenhoff, Fernando Cocchiarale, Luiz Camillo Osorio e Luciano Figueiredo; pelos artistas Ernesto Neto, Carlos Zilio, Waltercio Caldas e Otto Dumovic; o marchand Jean Boghici; pelo colecionador João Sattamini e por representantes das secretarias de Educação e Meio Ambiente e da Fundação Parques e Jardins.
maio 9, 2004
Golpe de doação
No dia 6 de maio de 2004 a coluna Abalo, do jornal de Bairros/Zona Sul de O Globo publica:
"Mãe - Domingo, na Praia do Leblon, será inaugurada a escultura de Mazeredo: 'Mãe da Paz'. Quem comparecer deve usar branco total."
CARTA de 6/5/04
A notícia sobre a inauguração de mais uma escultura da sra. Mazeredo na cidade não seria motivo de notícia, mas de denúncia.
De 1999 até 2007 (conforme noticiado neste próprio caderno) serão 22 (vinte e duas!) esculturas da mesma senhora em exposição permanente nesta cidade; evidentemente sem concorrência, e sob o recurso da homenagem-doação (bancada pelo erário público, via renúncia fiscal do patrocinador). O abuso do privilégio econômico e político extrapola quaisquer considerações estéticas e culturais. Em tais proporções, e permanente, passa a ser agressão impositiva de interesses privados sobre o espaço público. Nenhum artista em qualquer época ou lugar mereceu tanto espaço. Sob a chancela da prefeitura, a título de generosidade, em nome da paz, e ampla cobertura da mídia. Engulamos.
RT
No dia 11 de setembro de 2003 o jornal de Bairros/Barra publica a matéria "os jogos traduzidos em esculturas":
De olho no Pan, a artista plástica Mazeredo desenvolve obras com temas esportivos. ( ) seis esculturas. A maior delas ficará exposta na Vila Pan-Americana, próximo ao Autódromo de Jacarepaguá. As cinco demais deverão ser instaladas em praças de outras regiões da cidade. ( ) caberá à Secretaria Municipal de Esportes e Lazer a avaliação das obras.(a artista) - As peças serão feitas com recursos de leis de incentivo à cultura das esferas municipal, estadual e federal. ( ) (e de novo) - Este é um projeto patrocinado pela lei de incentivo à cultura municipal, com ajuda de empresas como o Hotel Inter-Continental. Essa parceria atenderá à Barra e a outros nove bairros - anuncia a escultora."
CARTA de 19/9/03 (*publicada com cortes)
Esculturas para o Pan
De acordo com a matéria veiculada no dia 11 de setembro, no caderno Globo-Bairros/Barra da Tijuca, 16 novas esculturas serão instaladas em praça pública no Rio de Janeiro, tendo como motivação a realização dos jogos Panamericanos de 2007.
Isto seria muito bom, não fosse pelas condições, descritas na própria matéria: (1) as referidas esculturas foram patrocinadas por empresas, com apoio nas leis de renúncia fiscal para projetos culturais aprovados oficialmente por órgão competente; (2) não foi aberto concurso de esculturas públicas para os Jogos Panamericanos de 2007; (3) a autoria (única) das esculturas apresentadas (e em execução) é a mesma de, pelo menos, seis outras esculturas já espalhadas pela cidade do Rio de Janeiro.Diante disso, cabem as seguintes questões:
1- como conseguiria-se a aprovação do projeto sem a especificação (e garantia) da instalação das obras em determinado local da cidade (já que sem essa garantia não se justificaria a aprovação para renúncia fiscal pelo patrocinador)?;
2- em tendo sido aprovado, como foram então (como são) avaliadas, sem concurso (estética e eticamente), essas peças temáticas?;
3- e, finalmente, a se crer no que a matéria promete, como é possivel a mesma artista ser aprovada/eleita vinte e duas vezes (já há, pelo menos, seis delas por aí) para a ocupação permanente do espaço público da cidade do Rio de Janeiro, sem ser (pela promoção física e evidente) o maior escultor público da cidade e do país?
Poderia-se alegar a oportunidade de quem apenas antecipou-se aos acontecimentos e por isso ganhou o privilégio de ocupação. Acontece que, a se defender isso repetidamente, não estaríamos mais falando de cidade, planejamento urbano, ou estética, mas entregues apenas às disputas de poder pela prevalência de interesses particulares sobre territórios públicos. O que, por aqui, parece ser sempre definido pelos mais armados.
RT Rio de Janeiro, Brasil.
No dia 8 de dezembro de 2003 a coluna de Ancelmo Gois destaca, com duas grandes "fotos de divulgação":
"Um ladrão carregou do Aterro do Flamengo, acredite, uma das duas pesadas peças de bronze que compôem - ou melhor, compunham - a escultura 'Harmonia', da artista plástica Mazeredo. O sem-vergonha deve ter tido um trabalho danado. A obra, doada à prefeitura pela artista para celebrar a Rio-92, mede sete metros (ou media, porque, a esta altura, pode ter virado bronze derretido). Foi na semana passada. O larápio deixou lá só uma das hastes. Ninguém sabe, ninguém viu."
CARTA de 8/12/03
Caro Sr. Ancelmo Gois,
É com grande interesse que acompanho a sua campanha contra a ocupação abusiva do espaço público desta cidade.
Na sua coluna de hoje (8/12) o senhor denuncia o roubo de uma escultura doada pela sra. Mazeredo para a cidade do Rio de Janeiro. Artista que, na última década, doou e teve instalada na cidade, em caráter permanente, mais de seis grandes esculturas-homenagens públicas; e que garantiu (neste jornal) instalar até 2007 (para os Jogos Panamericanos), mais dezesseis (16) peças monumentais em praça pública na cidade. Evidentemente sem concorrência, e com o seu devido patrocínio, apoiado nas leis de renúncia fiscal para a produção cultural. Contando então, a cada inauguração (e roubo), com a mídia garantida para esses atos de generosidade pública.
Este é um caso escandaloso (são 22 esculturas espalhadas pela cidade!) de apropriação privilegiada (privatização) do espaço público.
Atenciosamente RT
(O crédito das imagens como "fotos de divulgação" suscita uma incômoda curiosidade pelo seu remetente.)
CARTA de 17/12/03
Sr. Ancelmo,
É com grande decepção que vejo que o senhor resolveu ignorar a minha mensagem de 8/12. A sua coluna denunciou, então, algo como (aproveitando um tipo de abuso apontado pela coluna): "Vândalos derrubaram a varanda do restaurante 'X", esquecendo-se de mencionar que a referida varanda projetava-se sobre o espaço público, privatizando-o.Tendo o senhor denunciado o sumiço de uma escultura pública, a omissão quanto a uma contra-denúncia (pelo menos. Cá entre nós) não se justifica. A não ser por desinteresse ou preguiça. Ou o senhor, também, tem boas relações com a maior escultora da cidade, autora das 22 (vinte e duas) esculturas que o Rio de Janeiro orgulhosamente poderá ostentar até 2007?
(Nem Gaudí, nem Miró, nem Oscar Niemeyer, nem Richard Serra, conseguiram
tanta exposição pública em uma única cidade.)
Atenciosamente RT
RESPOSTA
Ricardo,
Peço desculpas, sinceras. A turma da coluna , somos quatro, recebemos mais de 300 e mails por dia. Não é possivel atender ou mesmo abrir espaço para todos. Peço desculpas. Acredite. Eu não conheço a tal escultora que voce falou. Nunca vi. Aliás, eu não conheço nenhum escultor pessoalmente. Sou meio bicho do mato.
Grato por escrever
Paz, saúde Ancelmo
Sr. Ancelmo,
obrigado pela resposta. Mas fica a questão: pode o jornal denunciar uma situação apenas parcialmente? Deve o jornalista acomodar-se a noticiar apenas o que lhe cai nas mãos, e como lhe cai (fotos de divulgação?!)?
Assim arrisca tornar-se manipulável (e não caberia a uma coluna alegar inocência): a propaganda (ou merchandising), atravessa-lhe os caminhos, atropela-lhe as boas intenções. Também não conheço a escultora que você (!) falou, destacou ou promoveu no dia 8/12. E não haveria mal em uma, talvez duas peças doadas por um artista poderem ser aprovadas, por comissão competente, para instalação na cidade. Se não concursadas, já seriam, duas, talvez excessivo para esta condição privilegiada - exceção feita, publicamente por aqui, apenas a Oscar Niemeyer.
O recurso da doação, aliado aos desmandos sobre o espaço público da cidade (submetido às considerações estéticas da secretaria de parques e jardins, e a interesses, escandalosamente, particulares), propiciou o absurdo da situação que vemos atualmente (já são mais de seis peças da mesma artista instaladas na cidade), e do que está ainda por vir: segundo este jornal, mais dezesseis grandes peças até 2007 de mesma autoria, aprovadas por lei de renúncia fiscal, e assim patrocinadas, com a garantia inquestionável de sua instalação.
Mas o que é que se vai fazer, né? As coisas são assim mesmo, não podemos fazer nada
Cordialmente RT
Bom ano novo para todos
CARTA de 31/01/01
Novas Esculturas em Praça Pública
Já foi com surpresa que o carioca deparou-se com novas pedras em seu caminho. Ao longo do tempo acostumou-se e hoje já não dá mais bola ao que lhe acontece debaixo dos olhos. Tropeça e, se bobear, pede desculpas com toda a garantia de sua indiferença ético-estética. Isso no Rio é um perigo. Muito tem se falado recentemente sobre a caótica ocupação visual dos espaços públicos da cidade por outdoors, placas, galhardetes, e todo tipo de displays, eletrônicos ou não, de propaganda comercial que vem agredindo a cidade, sempre crescentemente, nos últimos anos - corroborada pela maciça propaganda política espalhada em época de eleições (esta que, ordinária, rasga-se e balança pendurada entre vias de alta velocidade, ameaçando atodos).
Contra esse estado de coisas ouvimos regularmente vozes levantarem-se, partindo dos mais diversos setores da população (inclusive o nosso atual prefeito) no sentido de se criar alguma forma de controle sobre a ganância humana em cima do espaço visual urbano. E é claro que têm razão em sua preocupação e deve-se dar ouvidos a essas vozes para que não tornemo-nos reféns de um processo de poluição visual acelerada que (já experimentaram desenhos hiperanimados japoneses) é capaz de causar sérios danos à população. Acontece que outro tipo de poluição visual vem tomando a cidade sem que atentemo-nos para o fato. E seus mecanismos de engendramento chegam a ser mais perniciosos, por eludirem suas reais intenções e lucros. Se a propaganda em espaço público é paga periodicamente pelo anunciante em função evidente de seu próprio lucro, no caso aqui em questão o anunciante vem recebendo esse espaço por tempo indeterminado gratuitamente ou até mesmo recebendo por esse bem sucedido exercício de marketing pessoal e profissional. Nos últimos anos assistimos impotentes à proliferação de esculturas públicas plantadas em nossos jardins da noite para o dia, sem que tenhamos o menor acesso ao processo de sua aprovação (infeliz e evidentemente) e, o que é mais grave, à maneira como esse processo toma forma.
Se no loteamento comercial do espaço visual público pode-se alegar que a receita da prefeitura reverteria em benefícios objetivos para a própria cidade, no caso dessas esculturas fica difícil vislumbrar qualquer lucro que não o particular dessa artista - além de seu objetivo alegado, a melhoria estética da cidade. E é aí que nos aproximamos do cerne da questão. O que é um benefício estético para a cidade, e quem é que tem o poder de determiná-lo, controlando a ocupação de logradouros públicos por obras artísticas?
O fato é que esses responsáveis vêm aceitando presentes em nome da cidade (não se pode garantir até agora a cobrança de contrapartida, o que não diminui o risco evidente dessa prática), e vem pagando imediatamente por isso, na forma de renúncia fiscal, logo, às nossas expensas. A vista ou a prazo o custo é alto o bastante (a olhos e bolsos) para exigir prestação de contas. Quem decidiu a compra, encomenda ou recebimento de doação, e a colocação dessas esculturas na cidade do Rio de Janeiro nos últimos anos?
Quem bancou a instalação de, pelo menos, seis esculturas de uma mesma artista em pontos de destaque de nossas vias públicas, espalhando sua estética e currículo rapidamente, em nome da cidade (com sua mídia incluída)?
As autoridades responsáveis deveriam vir a público explicar o mais recente fenômeno dessa onda de invasões, ou o processo que levou à instalação de uma escultura em frente ao Estádio de Remo da Lagoa na última semana. A escolha dessa mesma artista que já brindou-nos com suas oportunas peças-homenagens, hoje adornando vias públicas em São Conrado e Barra, permite vislumbrar brevemente um roteiro turístico para o acompanhamento de suas esculturas pela cidade. Como temos certeza de que vários outros artistas (de tão profícuo talento) também gostariam de poder, por meios próprios ou financiados, prestar suas próprias homenagens a esses ou a outros personagens relevantes da história da cidade e do país, gostaríamos de ter acesso ao processo que veio a autorizar a instalação dessas vistosas esculturas em praça pública.
RT
maio 6, 2004
Hora de crescer - como atiçar a brasa?
A primeira vez que ouvi Eduardo Kac falar de seu biobot (http://www.ekac.org/8thday.html), contando sobre como o robô era movimentado pela multiplicação e movimentação de organismos vivos, imediatamente pensei no funcionamento do Canal Contemporâneo, relacionando a sua atuação à multiplicação e à movimentação dos indivíduos conectados à rede, mas pensei também no nosso próprio funcionamento como indivíduos, a partir das infinitas conexões que o nosso código genético faz com outros organismos vivos.
O Oitavo Dia (1) nos coloca diante da condição transgênica do ser humano, do fato do Projeto Genoma Humano ter demonstrado que carregamos DNA descendente de vírus em nosso código genético, e "sugere que as noções "românticas" do que é natural têm de ser questionadas..."
O que mais me interessa no conhecimento do Genoma Humano é o fato dele nos evidenciar uma ampla ascendência e, a partir dela, podermos entrar em contato com o fato de sermos feitos de pedaços. Pedaços esses que nos estruturam e que nos conectam ao exterior e ao coletivo. É a percepção inédita do coletivo em nosso interior, mesclada à vivência de rede das novas tecnologias, que nos possibilitam vislumbrar novas relações entre a individualidade e a coletividade na condição humana.
Hora de crescer - como atiçar a brasa
Proposta de um trabalho de mídia tática
Como um jornalista vai conseguir dar continuidade a uma matéria e convencer o seu editor da importância da mesma, se o jornal não recebe um único comentário a respeito?
Tenho ouvido de jornalistas e críticos de várias áreas que o nosso silêncio nos jornais é determinante para a falta de espaço que encontramos na mídia. Que ao nos calarmos diante das matérias realizadas e da falta das mesmas, apenas contribuímos para a idéia de que somos um assunto sem importância para o público.
A questão que se coloca é a seguinte: se nós mesmos somos o nosso público número 1, por que não atuamos como tal?
Por que não cobramos dos Cadernos de Cultura dos jornais de nossas cidades que cubram certos eventos? Por que não comentamos as boas matérias? Por que não pedimos continuidade no desenvolvimento de algumas delas? Por que não reclamamos de certas matérias maldosas e pouco embasadas? Por que não criticamos a postura pouco responsável de alguns jornalistas?
A resposta, que mais tenho ouvido, se baseia sempre na idéia de não termos consciência de classe e de não sabermos atuar em nome da coletividade. Será? Tanto classe, como coletivo são conjuntos. Melhor então começarmos da base, olhando para os elementos que os formam.
Quando cada um de nós se cala diante do jornal e evita qualquer interação com o veículo de comunicação, estamos sendo indivíduos apáticos. Mesmo estando indignados, não somos capazes de reagir. Se formos um conjunto de indivíduos abatidos, que espécie de coletivo isso forma?
Se começarmos individualmente a reagir, em diversas cidades, isso pode provocar uma reação em cadeia que nos leve a uma soma de elementos atuantes. Elementos atuantes é igual a um conjunto atuante? Um conjunto atuante pode levar a uma formação de classe e de coletivo? Só saberemos as respostas, começando a partir da atuação de cada um.
A brasa está aí para ser atiçada. Abana daqui, sopra de lá, aos poucos, com delicadeza e perseverança, podemos fazer dessa brasa um foguinho. Individualmente, ou em pequenos grupos, podemos traçar estratégias que tenham como objetivo aumentar a nossa visibilidade nos jornais. É importante lembrar que o aumento de visibilidade gera aumento de público, que por sua vez pode ampliar o mercado e a circulação de recursos. Estamos acostumados a achar que esses fatores, tão cruciais para o desenvolvimento da produção artística, estão estagnados, num beco sem saída. (Será que existe alguma ligação entre a nossa estagnação de mercado e a nossa apatia política?)
Como atiçar a brasa?
1 - Escreva um emeio para o editor do Caderno de Cultura do seu jornal fazendo comentários sobre matérias publicadas e/ou a falta delas, com cópia oculta para canal@canalcontemporaneo.art.br;
2 - Se tiver sido sobre uma matéria, envie a mesma para o Canal Contemporâneo, juntamente com a data e o nome do jornal em que foi publicada;
3 - O emeio e a matéria serão publicados nesse blog, no Como atiçar a brasa, www.canalcontemporaneo.art.br/brasa;
4 - Essas publicações no Como atiçar a Brasa terão chamadas periódicas nos e-nformes do Canal Contemporâneo;
5 - Caso receba alguma resposta do editor e quiser publicá-la, coloque-a como comentário no Como atiçar a brasa.
Patricia Canetti é artista e criadora do Canal Contemporâneo.
(1) O Oitavo Dia, texto sobre a obra de mesmo nome de Eduardo Kac publicado no livro Redes Sensoriais: arte, ciência, tecnologia; organização de Kátia Maciel e André Parente, Rio de Janeiro, Contra Capa Livraria, 2003.