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março 13, 2019
Mostra internacional da Bienal de Veneza não tem brasileiro por Luana Fortes, seLecT
Mostra internacional da Bienal de Veneza não tem brasileiro
Matéria de Luana Fortes originalmente publicada na revista seLecT em 11 de março de 2019.
Brasil é representado apenas em seu pavilhão nacional, com obra de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca
“Vamos assumir de saída que arte não exercita sua força no domínio da política. Arte não pode deter o crescimento de movimentos nacionalistas e governos autoritários em diferentes partes do mundo (…)”, afirmou o novaiorquino de 62 anos Ralph Rugoff, responsável pela curadoria da exposição internacional da 58ª Bienal de Veneza, que abre para convidados em 8 de maio de 2019. “Mas de uma maneira indireta, talvez a arte possa ser uma espécie de guia sobre como viver e pensar em ‘tempos interessantes’. A 58ª Exposição de Arte Internacional não terá um tema per se, mas destacará uma abordagem geral de se fazer arte e uma visão sobre a função social da arte como prazer e pensamento crítico”, continuou o curador.
Para o brasileiro dos dias de hoje, que lida diretamente com o crescimento de movimentos nacionalistas e a ascensão de um governo autoritário, a declaração de Ralph Rugoff parece estar intimamente ligada ao seu contexto político e social. De fato, seria fácil identificar paralelos entre as propostas do curador e a produção de artistas no Brasil. Mas como são muitos os países e muitas as causas urgentes, parece que a brasileira não teve lugar na mostra principal de Veneza.
O título da exposição internacional é May You Live In Interesting Times – que em português significa algo próximo de Que Você Viva Em Tempos Interessantes. A frase pode parecer uma benção, mas é um ditado popular que significa exatamente o oposto dessa boa intenção. Como de praxe, a exposição internacional ocupa os dois grandes pavilhões Giardini e Arsenale da cidade italiana, enquanto 90 países exibem mostras paralelas em pavilhões nacionais.
A lista de artistas participantes tem 79 nomes, dos quais metade são da Europa ou Estados Unidos. Apesar de haver uma considerável participação de artistas asiáticos, a América Latina aparece pouco representada. Participam dois argentinos, dois mexicanos, um uruguaio e nenhum brasileiro. Sim, cinco latinos, nenhum brasileiro. De países africanos, marcam presença seis artistas.
O pavilhão do Brasil
Com esse olhar omisso por parte da curadoria da mostra internacional, a representação brasileira ficará totalmente nas mãos de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca. A dupla foi escolhida por Gabriel Pérez-Barreiro, curador da 33ª Bienal de São Paulo, para montar uma individual no pavilhão brasileiro da Bienal de Veneza.
Os artistas apresentam uma instalação inédita criada em torno do filme Swinguerra, com aspectos musicais, ficcionais e documentais sobre um fenômeno cultural do Recife. “A Swingueira é um tipo de manifestação de dança que se apropria do pagode baiano e é performado, dançado, praticado por jovens de 15 a 25 anos que se encontram em quadras esportivas para desenvolver coreografias e participar de competições”, explica Wagner à seLecT. O trabalho mostra os três grupos Extremo, La Mafia e Passinho do Maloka e traz reflexões implícitas sobre identidade, educação e políticas públicas.
Tanto nesse trabalho, quanto nos filmes anteriores da dupla, sua metodologia depende da colaboração com artistas de diferentes circuitos culturais distintos. Wagner e de Burca fazem cada vídeo com aqueles que o protagonizam. Mostram os diferentes modos de construção de identidade das personagens/pessoas, perpassando moda, comportamento e arte. “A gente está representando o Brasil, mas o que está exibido é um filme feito em colaboração. Isso é mais representativo do país do que nosso nome”, diz à seLecT de Burca.
O filme foi registrado na escola pública Atenção Integral à Criança e ao Adolescente – CAIC, em Peixinhos, Olinda. O complexo foi desenvolvido nos anos 1990 pelo arquiteto João Filgueiras, chamado de Lelé, como uma versão brasileira de projetos realizados por Oscar Niemeyer nos Estados Unidos. Foi aplicado em diferentes lugares do país e existe até hoje, muitas vezes em situações de abandono ou sucateamento. “Ainda que não seja fácil você perceber o CAIC no filme, para nós é muito importante mostrar essa arquitetura modernista em decadência. Porque o CAIC na verdade é um projeto de educação em decadência, que é ocupado e resgatado pelos jovens com a dança. A disputa, na verdade, é por educação, por conhecimento e por cidadania”, afirma Wagner.
Serviço
58ª Bienal de Veneza
De 11/5/2019 a 24/11/2019
labiennale.org