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junho 1, 2018
O problema do MAM não é o Pollock por Luiz Zerbini, O Globo
O problema do MAM não é o Pollock
Opinião de Luiz Zerbini originalmente publicada no jornal O Globo em 30 de maio de 2018.
Percorrer o prédio do museu, por dentro e por fora, é encontrar um elenco interminável de instalações maltratadas, sujas, paredes pichadas, vidros quebrados
Vender ou não vender a obra do artista Jackson Pollock é o menor dos problemas do Museu de Arte Moderna (MAM). Mas é aquele que veio à tona. Veio à tona como uma boia de salvação destinada a premiar a incompetência. A nítida incompetência da atual administração da instituição.
Este parágrafo acima tem, de fato, um caráter subjetivo: pode-se concordar ou não. No entanto, o que segue são fatos concretos. Quem acessa a internet e procura o estatuto do MAM encontra... o do MAM de São Paulo. O do Rio não é dado a conhecer. Conseguimos lê-lo por demanda escrita ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas. Portanto, não há transparência no que se faz na instituição carioca.
Dois fatos: em tempos de eleição, pode-se imaginar que o atual presidente do MAM é eleito por apenas duas pessoas? Sim, os dois que integram, com ele, o “Conselho Administrativo”. Mais: o atual administrador vem de forma sistemática modificando o estatuto, a ponto de estabelecer que o presidente pode ser eleito “com prazo de gestão de três anos, admitindo a recondução, sem limite de mandatos”. Sem limite... pode?
Outro fato: há poucos anos, num almoço no MAM, os colecionadores João Sattamini e Gilberto Chateaubriand selaram a formação de um acervo único, o maior de arte do século XX no país. O MAC de Niterói não ficaria desassistido, mas todas as obras estariam reunidas no MAM. Perfeito! O que ocorreu depois? Já ao sair do almoço, o atual presidente disse que ia impedir isto. Impediu. Por quê? Da mesma forma, o Clube da Gravura do MAM — que gerava mais de R$ 1 milhão/ ano para a instituição — foi desativado. Por quê?
Mais fatos visíveis: percorrer o prédio do MAM hoje, por dentro e por fora, é encontrar um elenco interminável de instalações maltratadas, sujas, paredes pichadas, vidros quebrados. Falta o mais comezinho cuidado, carinho mesmo em relação ao prédio por parte de quem o administra. Ao invés de olhar para si mesmo, o atual presidente da instituição passou a olhar, de forma obtusa, para os mais de 250 artistas, críticos, curadores e profissionais da arte que assinaram o Manifesto Pró-MAM, a ponto de ter declarado à imprensa que, no tocante à venda do Pollock, “a gente tem de perder esta mania no Brasil de ser contra o capitalismo... não é possível passar 90% do tempo buscando recurso”.
É possível, sim. Ninguém da classe artística pode ser contra a geração de recursos para um museu amado por todos e extenuado por exposições que se prolongam e um estafe reduzido. O dirigente de uma instituição do porte do MAM tem de passar o tempo todo zelando pelo patrimônio, buscando recursos, querendo um museu forte, capitalizado e bem gerido. Nada disso ocorre.
O MAM foi criado, construído e mantido, em sua maior parte, com recursos públicos. Seu acervo permanente, no qual se inclui o Pollock, foi constituído para ter uma destinação pública. Culpar o país e os outros — incluindo aí a classe artística – não soluciona a situação. Vender o patrimônio, muito menos.
Luiz Zerbini é integrante do Grupo Pró-MAM, do qual fazem parte ainda Paulo Sergio Duarte, Raul Mourão, Álvaro Piquet, Marcio Fainziliber, Leonel Kaz e Luiza Mello