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janeiro 31, 2016
Paço das Artes inaugura suas últimas mostras na Cidade Universitária por Camila Molina, Estado de S. Paulo
Paço das Artes inaugura suas últimas mostras na Cidade Universitária
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 29 de janeiro de 2016.
Instituição encerra programação no prédio que ocupou desde 1994 com exposições de Harun Farocki e da Temporada de Projetos
Este será o “ano do Paço nômade”. É como a diretora do Paço das Artes, Priscila Arantes, define a por ora indefinida situação da instituição, que, a partir de abril, terá de deixar o edifício onde realizava, desde 1994, suas atividades na Cidade Universitária.
Com a notícia, na semana passada, de que o Instituto Butantan decidiu retomar seu prédio para estruturar uma fábrica de vacina da dengue, o Paço das Artes, vinculado à Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, ficou mais uma vez sem sede. É em clima de despedida, portanto, que a instituição inaugurou nesta quinta-feira, 28, a exposição Programando o Visível, que traz obras inéditas do cineasta e artista Harun Farocki (1944-2014); e as mostras da primeira etapa da Temporada de Projetos 2016 – com exibição de trabalhos de Alex Oliveira, Anaisa Franco e Sergio Pinzón e da coletiva Jogo de Forças, projeto curatorial de Philipe F. Augusto, selecionados pelo edital criado em 1996. Mais ainda, a dupla Dias & Riedweg realizou no Paço a performance Nada Quase Nada, originada de sua instalação Blocão, de 2014 – e a ação foi registrada em vídeo.
Em 2010, Harun Farocki participou da 29.ª Bienal de São Paulo com a videoinstalação Serious Games. Na época, aquela que era sua mais recente criação fazia uma reflexão sobre o uso da animação computadorizada tomando como mote o processo terapêutico desenvolvido com soldados norte-americanos que haviam passado por situações traumáticas no Oriente Médio. Agora, em Programando o Visível, o público brasileiro tem a oportunidade de ver o passo que o diretor checo-alemão, consagrado no campo das artes visuais, deu adiante nessa pesquisa com a concepção da instalação Paralelo I-IV, de 2014, último trabalho de Farocki. É uma obra sobre “a história da imagem”, afirma a curadora Jane de Almeida – nela, o artista discorre sobre o “mistério da representação” desde a construção da perspectiva para dar “historicidade” aos games.
No Paço, Paralelo, que pode ser definido como um projeto discursivo – ou teórico, é apresentado por meio de quatro projeções nas quais Farocki compara imagens reais e computadorizadas e pergunta – “Por que estamos produzindo essa imagem dessa forma?”, sintetiza a curadora. “Suas questões são lançadas para o próximo século”, opina ainda Jane de Almeida, destacando uma das indagações principais colocadas pelo cineasta: “Será que a composição de imagem computadorizada vai liberar o cinema para outra função assim como a fotografia liberou a arte para a abstração?”.
A mostra de Farocki é formada ainda por mais dois trabalhos importantes. Interface (1995), como diz a curadora, marca a entrada do cineasta para as galerias de arte com sua reflexão sobre “editar filmes a partir de imagens existentes”. Já o histórico Frases de Impacto, Imagens de Impacto. Uma Conversa com Vilém Flusser (1986) apresenta reflexões do diretor e do filósofo sobre a mídia por meio da análise da capa de um jornal alemão. Programando o Visível será encerrada com a realização de um colóquio e o lançamento de uma publicação feita em parceria com o Cinusp que reunirá textos de estudiosos e as falas de Farocki traduzidas de suas obras.
Até 27 de março, o Paço das Artes também apresentará a obra Impermanência, de Marcia Vaitsman, mas, como o espaço tem 1,5 mil m² de área expositiva, será possível abrir no próximo dia 2, às 17 h, a mostra Antigos Artefatos / Novas Interpretações, da artista e professora Inês Raphaelian. O visitante da instituição também encontrará prorrogada a exibição da peça Títulos, de Thiago Honório. Depois de encerrada sua atividade na Cidade Universitária, o Paço distribuirá sua programação de 2016 pelo Museu da Imagem e do Som e pela Oficina Cultural Oswald de Andrade.
Diretora diz que ainda não há previsão de nova sede
O nomadismo é uma característica persistente na história do Paço das Artes. Em 1969, Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti cortaram a faixa inaugural da mostra que marcava a criação da instituição cultural, mas foi apenas em 1970 que um decreto oficializou sua fundação – e desse ano até 1973, o Paço funcionou em imóvel no número 326 da Avenida Paulista. Depois, por dois anos, a Pinacoteca recebeu suas atividades, para mais tarde, entre 1975 e 1994, o Museu da Imagem e do Som (MIS) abrigá-lo. Entretanto, com a saída, agora, da Cidade Universitária, a instituição se vê mais uma vez enfrentando o problema de não ter um espaço próprio.
Essas passagens históricas podem ser encontradas na publicação MaPA: Memória Paço das Artes. “É um momento muito difícil, mas também é a possibilidade única de o Paço encontrar a sua sede”, diz a diretora da instituição, Priscila Arantes. Ela cita como localidades ideais para a instituição o centro da cidade ou a região do “baixo Augusta”, por exemplo.
A Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, responsável pelo Paço, afirmou por meio de nota que “busca outra sede para o museu” e que a transferência e fragmentação da programação de 2016 da instituição para a Oficina Oswald de Andrade (onde será inaugurada em abril uma retrospectiva da artista Lenora de Barros) e para o MIS (que apresentará as próximas exposições da Temporada de Projetos) é uma “solução” temporária. Entretanto, “pulverizar o trabalho de uma instituição”, como pondera Priscila, não pode ser algo para se levar a médio ou a longo prazo. Para se ter uma ideia, o Paço recebeu 84.539 visitantes em 2014.
Como não há ainda uma resolução concreta do caso, Priscila Arantes afirma que não há condições de se pensar uma programação para 2017. Atualmente, a instituição conta com 11 funcionários. “Espero que continuemos com esse quadro enxuto”, diz a diretora, contando que levará sua equipe para o MIS (equipamento também administrado pela Organização Social Associação do Paço das Artes Francisco Matarazzo Sobrinho).