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novembro 25, 2015
Casa Daros cumpriu promessa reunir arte latino-americana, diz diretor por Nani Rubin, O Globo
Casa Daros cumpriu promessa reunir arte latino-americana, diz diretor
Entrevista de Nani Rubin originalmente publicada no jornal O Globo em 16 de novembro de 2015.
Instituição fecha as portas em dezembro
RIO — Prestes a fechar definitivamente suas portas, em 13 de dezembro, a Casa Daros, instituição que se instalou no Rio, prometendo ser uma plataforma de difusão e circulação da arte latino-americana contemporânea, vive em clima de “foi bom enquanto durou”. Na sexta-feira passada, exatamente um mês antes da data marcada para o fim das atividades da Daros, o diretor Dominik Casanova admitia que uma de suas tarefas era tentar manter o ânimo da equipe, arrefecido desde o anúncio do fechamento.
A outra era explicar por que, depois da surpreendente decisão de fechar as portas da instituição (alegando os altos custos de manutenção do prédio), o conselho da Coleção Daros Latinamerica, sediada em Zurique, decidiu levar embora também sua biblioteca de 7.500 itens. Além de um importante acervo de livros sobre arte latino-americana, a biblioteca tem também periódicos, DVDs e todo o registro dos encontros e palestras realizados na casa. Uma parte vai para Zurique, e a outra, para o Metropolitan Museum of Art, em Nova York.
— A biblioteca do Rio foi montada com base na biblioteca da Daros Latinamerica, a princípio espelhando a de Zurique, que tem 11 mil volumes e é com certeza uma das mais importantes desse segmento na Europa. Com o tempo, começamos a comprar vários livros que não havia em Zurique. Os livros daqui que não temos na Suíça, algo entre 20% e 25% do total, vão para lá — conta ele.
E o restante? Não havia instituição no Brasil que pudesse recebê-la?
— Sim, pensamos nisso. Fomos procurados por algumas delas. Mas tínhamos premissas, como não desmembrar o acervo, por exemplo. Outra era que quem recebesse o acervo pudesse fazer rapidamente a catalogação das obras e disponibilizá-las ao público. E queríamos que essa doação tivesse um impacto, isto é, não adiantava oferecer a uma biblioteca que tivesse títulos em duplicidade — diz Casanova. — Algumas disseram que não tinham condições, ou por não possuírem espaço ou por não terem braços para fazer a catalogação.
Foi o conselho da Daros Latinamerica, mais uma vez, que considerou o Metropolitan o local mais adequado, por atender a “todos os critérios”.
Constituída como uma empresa, a coleção — a maior de arte latino-americana da Europa, com 1.200 peças — foi formada a partir de 2000 pela milionária suíça Ruth Schmidheiny, e tem obras de 19 artistas brasileiros. Uma de suas particularidades é possuir um número expressivo de obras de cada artista. Na exposição “Made in Brasil”, em cartaz de março a agosto deste ano, só as obras de Antonio Dias, por exemplo, poderiam compor uma mostra individual do artista paraibano. Agora que a casa se prepara para fechar as portas aqui, o conselho pretende aumentar o empréstimo de obras para exposições mundo afora.
— A Daros não foi uma tentativa que não se realizou — defende Casanova, suíço criado no Brasil, desempregado a partir de janeiro. — A filosofia de ser um centro aglutinador de arte latino-americana foi vivida não só durante dois anos e meio, mas por sete anos, desde 2007 (quando o casarão de Botafogo foi comprado e começou a ser reformado). Aqui aconteceram palestras, encontros de artistas, instalações ainda durante a obra, como a de Iole de Freitas. É uma pena que acabe. Mas teve vida enquanto durou. Não é uma promessa frustrada.
Os encontros a que ele se refere aconteceram com nomes como o venezuelano Carlos Cruz-Diez, a mexicana Teresa Serrano, o argentino Julio Le Parc (responsável pela exposição “Le Parc Lumière”, em 2013, que alavancou a visitação ao centro cultural) e os brasileiros Waltercio Caldas, Lenora de Barros, Vik Muniz e Iole de Freitas, entre outros. Era o prenúncio de um caso de amor, que durou pouco. Acabou de forma unilateral, sem consenso. E nem mesmo o casarão, comprado e reformado ao custo de R$ 83 milhões, será usufruído como espaço de visitação da cidade — foi comprado por um grupo privado, para abrigar uma escola.
— O ideal seria continuar como centro cultural, um museu — admite Casanova. — Infelizmente não conseguimos. Houve propostas, mas era preciso atender às condições, o que não aconteceu.
Dominik não detalha as condições a que era preciso atender nem diz por quanto o prédio foi vendido.
— Com certeza, por menos do que foi investido nele — é tudo o que adianta a respeito, esclarecendo que a instituição não contou com isenção fiscal nem qualquer tipo de benefício para restaurar o prédio tombado. — Tudo o que foi gasto aqui saiu da Daros.
VÍDEOS ESTARÃO NO SITE
Até o último dia, seguem em cartaz as exposições “Cuba — ficción y fantasía”, com obras de artistas cubanos pertencentes à Coleção Daros Latinamerica, e “Nada absolutamente nada”, da dupla Mauricio Dias & Walter Riedweg, realizada a partir de verba concedida pela própria Daro. A visitação, Casanova reconhece, teve um pico logo após o anúncio do fechamento, mas caiu recentemente. A partir do dia 28, porém, a instituição não cobrará mais ingresso (hoje, a entrada é gratuita apenas às quartas-feiras).
Quanto à biblioteca, resta aos interessados em arte latino-americana consultar o site da Daros Latinamerica (daros-latinamerica.net). Ali, a partir de janeiro, será disponibilizado todo o material em vídeo produzido pela casa. Preciosidades como uma conversa entre o marchand Jean Boghici (1928-2015) e o colecionador Gilberto Chateaubriand, promovida pelo antigo curador da coleção, Hans-Michael Herzog, ainda dependem de edição.
A lojinha do museu terá “queima total” em dezembro.