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novembro 21, 2015
Paulo Pasta volta ao figurativo e exibe paisagens de sua cidade natal por Nina Rahe, Folha de S. Paulo
Paulo Pasta volta ao figurativo e exibe paisagens de sua cidade natal
Matéria de Nina Rahe originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 16 de novembro de 2015.
O rosto de Paulo Pasta estava rosado. O artista de 56 anos vestia camiseta polo e calças em tons cinza pálido e preto desbotado, como se ele mesmo, tal qual sua pintura, se recusasse a adquirir as cores de intensidade forte que saem das bisnagas de tinta óleo.
O paulista, que um dia achou que seria um pintor característico do fauvismo — movimento do início do século 20 que empregava nas telas cores intensas —, consolidou-se com um trabalho que por vezes parece estar prestes a se apagar.
Pasta descobriu na mistura das tintas — ele jamais as utiliza em estado puro — uma atmosfera que combina tonalidades marcantes e matizes leves. "Me reconheço nas cores mais compostas, ambíguas. Tem uma indefinição", diz ele.
Após uma trajetória que já leva 30 anos, o pintor afirma que há tempo de plantar e de colher. Atualmente, está na colheita. Na primeira semana de novembro, à frente da montagem da mostra que ocupa até 19 de dezembro os endereços vizinhos da Galeria Millan e do Anexo Millan, o artista estava irrequieto e seu rosto ruborizava conforme as decisões que tinha de tomar.
Na galeria, todas as telas já estavam penduradas, concentrando a vertente mais conhecida do paulista, com obras consideradas abstratas, ainda que o próprio prefira defini-las como se estivessem na corda bamba entre a forma e a abstração.
Já na sala principal do anexo, inaugurado na data de abertura da exposição, no começo deste mês, estão nove paisagens a óleo sobre papel, todas na média de 1,5 m de largura por 2 m de altura. O corredor de entrada e a sala ao fundo estavam repletos de quadros menores ancorados no chão.
"O Paulo tem uma produção muito lenta. Passa um mês no ateliê e produz quanto? Um quadro?", brinca André Millan, proprietário da galeria. O artista ri e concorda.
Entre os óleos sobre tela que ocupam a galeria principal, um dos quadros, de grandes dimensões (2,4 m de largura por 3 m de altura), leva um mês para ser finalizado.
"A pintura tem um tempo de amadurecimento. É preciso esperar secar antes de aplicar uma nova camada, a tinta muda de cor", explica Pasta.
A quantidade de obras ao seu redor, no entanto, quase o desmente. Nos últimos três anos, o artista pintou por volta de 130 paisagens, uma média de quase quatro por mês.
"É um prazer tão grande que não consigo parar", diz ele, que optou também por pintá-las sobre o papel porque o suporte possibilita uma resposta mais rápida do que a tela.
O ESSENCIAL
Em sua primeira exposição individual, em 1984, Pasta já havia exibido algumas paisagens. As obras, segundo ele, eram mais tímidas.
Após três décadas sem produzir pinturas figurativas, os trabalhos tomaram corpo. "Agora tenho mais massa muscular, mas naquele momento, na década de 1980, já sentia necessidade de retratar as cenas com as quais tinha grande intimidade", explica.
As paisagens são todas de sua cidade natal, Ariranha, localizada a 380 quilômetros da capital paulista. "Posso ir a um lugar lindo, mas não vou pintá-lo porque não me pertence."
O artista, que se mudou para São Paulo em 1977, realizou o trajeto entre as cidades inúmeras vezes. Desde que retomou o gosto pela paisagem, refez o percurso. A viagem que, de carro, dura cerca de quatro horas, passou a levar o dobro do tempo.
Pasta pinta a partir das lembranças. Reconhece a si mesmo na história de Alfredo Volpi (1896-1988), que saía com o grupo Santa Helena para retratar paisagens que observava enquanto enrolava um cigarro de palha. Depois, pintava-as virado de costas para elas.
"Ele gravava na memória. E a memória simplifica, sintetiza e deixa apenas o essencial. Gosto porque me identifico."
O retorno ao figurativo aconteceu por meio de Van Gogh (1853-1890). Ao ler uma biografia sobre a vida do pintor pós-impressionista, Pasta se deparou com uma série de citações a artistas que desconhecia, como os da escola de Haia, com a qual tinha pouca proximidade. Ao recorrer às imagens, o paulista foi retomando um desejo pela paisagem. Começou e não parou mais.
ADEUS
"Dessas preciso me despedir? Que pena", o artista lamentava encarando 34 pinturas. Do total de 51 paisagens pequenas, apenas 17 estão expostas no corredor de entrada. Na sala ao fundo, de 27 obras de tamanho médio, sobraram 16.
Pasta conta que teve muitas dúvidas em relação às paisagens, pois queira estabelecer alguma coerência com o seu trabalho mais conhecido. Encontrou essa relação no tempo que as duas vertentes demandam para serem apreendidas e na atmosfera evocada pela cor.
Enquanto no ateliê as obras estão todas misturadas, a galeria cumpre o papel de exibi-las de maneira organizada. "Aqui está exposto para mim também", ele avalia. "O que posso dizer? Gostei." Pasta ri. E não cora.