|
julho 27, 2015
Sobre os livros "Words Not Spent Today Buy Smaller Images Tomorrow" e "Post-Photography: The Artist with a Camera" por Francisco Quinteiro Pires, Folha de S. Paulo
Fazer imagens é fácil, difícil é decifrá-las, analisa crítico
Matéria de Francisco Quinteiro Pires originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 27 de julho de 2015.
David Levi Strauss é um otimista. Embora corra o risco de ser chamado de arcaico, o crítico defende uma antiga crença sobre a fotografia em seu livro mais recente, "Words Not Spent Today Buy Smaller Images Tomorrow".
Para ele, as imagens permanecem na era digital como instrumento de evidência e conscientização sobre a realidade.
Em "Words Not Spent...", coleção de "ensaios sobre o presente e o futuro da fotografia", Strauss faz uma leitura do poder político de fotos documentais e artísticas em um momento em que a pós-fotografia propõe um novo entendimento sobre o uso da imagem.
O ensaísta britânico John Berger elogiou os escritos de Strauss, professor da School of Visual Arts, em Nova York, e um dos críticos de fotografia mais prestigiados dos Estados Unidos, por priorizarem "o que tem sido esquecido, o que é sistematicamente censurado e o que nós precisamos lembrar amanhã".
Nos ensaios, o americano alerta para os efeitos de uma produção crescente e uma distribuição mais ampla em plataformas digitais como Flickr, Snapchat, Instagram, Facebook e WhatsApp. Segundo o Yahoo, 880 bilhões de fotos foram produzidas em 2014.
"Podemos produzir, guardar, manipular e selecionar fotografias com uma rapidez inédita, mas não conseguimos decifrá-las. Esse é um processo que exige mais tempo do que aquele imposto pela economia de mercado", diz ele.
"Nós examinamos as imagens com menos frequência e menos cuidado". De acordo com o crítico, uma observação descuidada leva à perda de autonomia política. "As fotografias perdem significado e viram informação, um elemento que precisa ser apenas administrado."
Ao contrário da escritora Susan Sontag e dos críticos pós-modernos, Strauss considera as fotografias uma oportunidade legítima para lidar com o mundo real e o aparente.
"Muitos têm tratado o ponto de vista dos pós-modernos como uma verdade inquestionável. Mas com o 11/9, que abalou as teorias persistentes sobre os significados das imagens, o nosso pensamento pôde tomar um rumo novo", defende Strauss.
ESCOLHA HUMANA
"Mais uma vez reconhecemos e confrontamos a nossa atração irracional e persistente pelas fotografias, capazes de ser um termômetro confiável das aspirações que orientam um sistema político e social."
Ao argumentar a favor dessa opinião, Strauss analisa os trabalhos de artistas (Chris Marker, Frederick Sommer, Carolee Schneemann, Jenny Holzer, Larry Clark), de fotojornalistas (Susan Meiselas, Kevin Carter, James Natchwey) e de fotógrafos de rua (Helen Levitt, Daido Moriyama).
Haveria entre eles um elemento comum: "O testemunho de um escolha humana sendo realizada em uma certa circunstância". Tal noção, diz Strauss, "é o que faz o exame das fotografias importante para qualquer discussão sobre a liberdade humana".
A fotografia morreu; viva a "pós-fotografia"
Matéria de Francisco Quinteiro Pires originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 27 de julho de 2015.
Ao contrário de David Levi Strauss, o crítico Robert Shore não vê mais sentido na discussão sobre o poder das imagens para representar a realidade.
Autor de "Post-Photography: The Artist with a Camera", um dos primeiros livros sobre o fenômeno da pós-fotografia, Shore acredita que "o verdadeiro valor do registro fotográfico passou por um teste destrutivo no passado".
Centrada na edição, reinterpretação e apropriação de imagens espalhadas pela web, "a pós-fotografia é um momento que permite a expansão dos meios tradicionais de trabalhar com fotos", diz Shore.
"Uma obra concebida a partir de imagens disponíveis são uma resposta à capacidade da internet de engolir em segundos o que é criado."
Nenhum dos 53 profissionais elencados em "Post-Photography" se considera pós-fotógrafo. De acordo com Shore, além do emprego de tecnologias digitais, não haveria diferença entre praticantes da pós-fotografia e artistas como Sherrie Levine e Richard Prince, protagonistas da arte realizada a partir da apropriação.
A espanhola Laia Abril prefere se apresentar como "uma contadora de histórias multimídia", embora adote recursos da pós-fotografia. Em 2011, ela iniciou um projeto sobre anoréxicas que resultou no fanzine "Thinspiration".
O trabalho de Abril foi selecionado para a exposição "From Here On", em 2013, com trabalhos de pós-fotografia, após um manifesto assinado pelo pesquisador espanhol Joan Fontcuberta e pelo fotógrafo Martin Parr.
"A princípio, pensei na abordagem tradicional para registrar garotas que sofrem de anorexia e participam de uma comunidade virtual", explica Abril. "Elas compartilhavam autorretratos para reforçar um estilo de vida, e não para revelar uma doença. Passei a fotografar as fotos que as anoréxicas tiraram de si mesmas para denunciar o uso que faziam das imagens."
Diante da circulação crescente de informações tanto Abril quanto Shore enfatizam a necessidade do papel do editor, responsável por selecionar e reinterpretar, entre bilhões de imagens, o que merece ser observado.
WORDS NOT SPENT TODAY BUY SMALLER IMAGES TOMORROW
autor: David Levi Strauss
editora: Aperture
quanto: US$ 19 (192 págs.)
POST-PHOTOGRAPHY: THE ARTIST WITH A CAMERA
autor: Robert Shore
editora: Laurence King
quanto: US$ 28 (272 págs.), ambos na amazon.com