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julho 8, 2015
Mostra discute a imaterialidade com obras que ficam no limiar do invisível por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Mostra discute a imaterialidade com obras que ficam no limiar do invisível
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada no jornal Folha de S. Paulo em 6 de julho de 2015.
Imaterialidade, Sesc Belenzinho, São Paulo, SP - 02/07/2015 a 27/09/2015
Exagerado, ele caminha sobre os contornos de um quadrado no chão, pondo um pé na frente do outro na mesma linha, o quadril mexendo para os lados num requebrar mais do que desajustado.
Nessa performance solitária, filmada em seu ateliê no fim dos anos 1960, Bruce Nauman dava corpo -de forma literal- a um desenho hipotético, inerte no assoalho. É dessas coisas frágeis, quase resvalando no invisível, que fala uma exposição agora em cartaz no Sesc Belenzinho.
Na montagem organizada por Adon Peres e Ligia Canongia, o filme do artista americano está um pouco escondido na segunda sala da mostra, mas serve de síntese dessa ideia de imaterialidade.
Mais histérica, uma instalação de Carlito Carvalhosa logo na entrada da exposição dá outro resumo do conceito, com lâmpadas fluorescentes e taças de cristal coladas num paredão - a potência da luz transformando tudo num borrão brilhante e intenso.
É uma imagem que demora a desgrudar da retina, deixando um eco visual como filtro para o resto das obras, como um cacho de objetos de vidro de Laura Vinci. Vista logo depois do trabalho de Carvalhosa, sua escultura parece vibrar na galeria.
Também funcionam como uma espécie de dueto visual os trabalhos do francês François Morellet, um dos nomes fortes da arte cinética, e do minimalista americano Keith Sonnier. Enquanto Morellet pendura do teto uma série de hastes arqueadas de neon vermelho, Sonnier cria prateleiras de vidro contornadas por feixes de neon colorido.
Nesse ponto, a noção de imaterialidade da mostra arrisca parecer literal demais, com trabalhos quase virando ilustração de uma ideia só por serem transparentes ou luminosos, um tanto etéreos.
Mesmo dotados de solidez inquestionável, o vidro, as lâmpadas e os neons delineiam, uma atmosfera fantasmagórica. Enquanto contornos de um terreno intangível, essas peças, como Nauman fez com o próprio corpo, acabam estruturando uma outra esfera do real.
Diante disso, a obra do americano James Turrell, uma forma geométrica que surge num canto escuro como projeção de luz, dá o passo mais decisivo da mostra. É um trabalho que clama para ser tocado, já que a intensidade da luz dá um aspecto quase sólido ao volume, mas joga com a decepção - de perto, ele não passa de uma sombra flutuante.
Na mesma pegada, Brígida Baltar aparece no alto de um morro tentando encher de neblina uma série de frascos de vidro presos a um colete. Num estranho registro visual, algo como um cruzamento entre "A Noviça Rebelde" e "O Morro dos Ventos Uivantes", Baltar cria um belo filme sobre a vontade de pôr as mãos no infinito, naquilo que se esvai.
É um prelúdio aos tubos metálicos de Paola Junqueira, na outra sala da mostra. Quase na altura dos olhos, eles chamam a atenção como estranhas lunetas, mas ventiladores lá dentro sopram um ar frio na cara de quem se aproxima - o estranho frescor dessa tal imaterialidade.