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abril 26, 2014
As memórias visual e afetiva de Luiz Zerbini na Casa Daros por Nani Rubin, O Globo
As memórias visual e afetiva de Luiz Zerbini na Casa Daros
Matéria de Nani Rubin originalmente publicada no jornal o Globo em 26 de abril de 2014.
Artista exibe a partir deste sábado trabalhos recentes que se relacionam entre si
Exposição dá continuidade à temporada de pintura na instituição
RIO - Conchas e ouriços, padronagens de ladrilhos hidráulicos, quadrados de gelatina de diversas cores, folhagens vivas ou já ressecadas pelo tempo, insetos mortos, um grafismo ondulado que remete ao mar. É das coisas que Luiz Zerbini observa e vai catando em viagens com a mulher e as filhas, ou daquelas que aparecem em seu ateliê num sobrado no bairro da Gávea que saem as pinturas de colorido exuberante, povoadas de detalhes que forçam o visitante a se demorar sobre cada uma delas.
Galeria - Veja imagens da mostra 'Luiz Zerbini — Pinturas'
Essas telas e outras, geométricas, e ainda alguns desenhos e até mesmo uma escultura há muito esquecida num galpão compõem a mostra “Luiz Zerbini — Pinturas”, que a Casa Daros abre hoje ao público. Quem for neste sábado à tarde ao casarão de Botafogo poderá conversar com o artista sobre sua obra. Do bate-papo, às 17h, participa o diretor da Coleção Daros Latinamerica, Hans-Michael Herzog, curador da mostra. A entrada é gratuita, com retirada de senhas uma hora antes.
A exposição é pequena, cerca de 20 peças, mas cumpre o objetivo de traçar um painel da produção recente — e, em sua maioria, inédita — de Zerbini. O visitante começa o percurso por uma sala onde uma mesa de nove metros de comprimento exibe uma espécie de repertório do artista. A obra, “Natureza espiritual da realidade” (2012-2014) apresenta, por exemplo, as conchas catadas no Sul da Bahia com a filha Rita, que os dois dispuseram num desenho próprio. Zerbini fotografou o conjunto, reproduzido com exatidão na mesa e na tela “Erosão” (2014), na sala ao lado. Os ladrilhos pintados em “Erosão” também estão na mesa, em MDF recortado e pintado
Osso de pinguim e moscas
Um osso de pinguim achado na Ilha da Gipoia, em Angra dos Reis, com uma mosca morta sobre ele, também foi incluído na obra. Assim como uma tora de madeira maciça, uma nota de R$ 10 encontrada naquele dia pelo artista, e gelatinas coloridas. Estas, dispostas na parte superior da mesa, projetam seu colorido sobre a parte inferior, onde uma outra série de objetos repousa, harmoniosamente. Os grafismos ondulados, outra marca na obra do paulistano radicado no Rio, igualmente estão lá, e, com a luz que incide sobre a peça, lançam suas linhas sinuosas sobre a parte de baixo. Os mesmos traços podem ser vistos nas telas “Medusa” (2011) e “Pedra punk” (2012). Também nelas estão os quadradinhos coloridos que remetem aos trabalhos de Zerbini feitos com molduras de slides e gelatinas.
— Fico trabalhando relações. É uma maneira de conseguir fazer figuração e abstração, que é o que faço na pintura, criando a partir da cor, das texturas, das camadas — diz o artista, que costuma trabalhar cerca de dez horas por dia em seu ateliê; cada tela pode demorar até seis meses para ficar pronta, e a verdade é que nem sempre isso acontece.
Foi o que (não) aconteceu com “Erosão”, prevista para a exposição do artista na Max Wigram Gallery, em Londres, em outubro de 2013. Muito trabalhosa — quem for à Daros, verá —, a pintura não foi finalizada a tempo e será exibida ao público pela primeira vez a partir de hoje. “Pedra punk” e “Medusa” também são inéditas no Rio. A primeira foi exposta em Londres e vendida lá. A segunda, comprada por um colecionador na feira Miami Basel. Três obras geométricas — “Quadrado maior” (2013), “Favela” (2014) e “Hipermetrópico” (2014) — estão saindo pela primeira vez do ateliê do artista.
— É uma exposição muito mais silenciosa que a outra — diz Zerbini, referindo-se à sua mostra “Amor, lugar comum”, que ocupou em 2012 o MAM-Rio. — Nesta, quis mostrar os papéis (dois desenhos de 1999), as pinturas que não foram vistas, os geométricos — diz o artista, que prepara para novembro uma individual para o Galpão da Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo.
Ele ainda mostra, na Daros, uma escultura de 1996, “Peixes” (“Um trabalho de época”, comenta), e algumas peças feitas com cartas de baralho.
A mostra de Luiz Zerbini é a segunda da temporada de pintura imaginada por Herzog, e se segue à exposição do argentino Fabián Marcaccio, “Paintant stories”, em cartaz até 10 de agosto. Guillermo Kuitca, Eduardo Berliner, Vânia Mignone e René Francisco Rodriguez exporão em seguida no espaço.