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abril 6, 2014
Adriana Varejão investiga matizes do racismo em novas obras e livro por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Adriana Varejão investiga matizes do racismo em novas obras e livro
Matéria de Silas Martí originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo em 4 de abril de 2014.
Adriana Varejão - Polvo, Galpão Fortes Vilaça, São Paulo, SP - 08/04/2014 a 17/05/2014
Branca-melada, branquiça, encerada, morena-canelada, retinta e rosa. Essas, entre muitas outras, são cores de pele declaradas por entrevistados em pesquisa feita nos anos 1970 pelo governo.
Quatro décadas depois, a artista Adriana Varejão criou uma tinta para cada um desses 33 tons e se autorretratou numa série de telas com intervenções que refletem essa gama espontânea de raças.
Esse panorama, que será exposto agora na galeria Fortes Vilaça, é também uma espécie de ponto de chegada de um processo de cinco anos, em que Varejão e a historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz passaram investigando a obra e referências históricas uma da outra.
"É uma síntese de ideias que estavam pairando no ar. Minha ideia era que ela escrevesse um livro de história tendo a minha obra como bússola", diz Varejão. "A história não é um monolito estático do passado. Estamos reconstruindo o passado no presente, arejando as coisas."
Nesse ponto, o livro reflete a lógica interna da obra plástica de Varejão, que sempre atravessou tempos históricos, incorporando a azulejaria barroca, a violência da escravidão ou relatos exagerados do canibalismo tribal.
Mas também esbarra nos métodos da historiografia contemporânea, tanto que Moritz Schwarcz se diz agora "canibalizada" pela artista.
"Ela é uma detonadora de histórias", diz Moritz Schwarcz. "Tem um anacronismo muito bonito no trabalho dela. Talvez estejamos num momento distinto, de perceber como a história é uma construção sempre voltada às indagações do presente."
E poucos temas têm aflorado com tanta força agora na indústria cultural quanto as questões raciais. Enquanto acadêmicos fazem uma revisão histórica da escravidão, artistas investigam esse assunto com certa inquietação.
"Eu comecei esse trabalho contra e terminei a favor das cotas raciais", diz Varejão. "Sempre me perguntavam se o Brasil não era o paraíso do povo cordial, mas digo que não. Esses nomes das cores são maneiras de ludibriar, de não dizer negro para falar baiano, queimado. É sintomático de um país racista."