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fevereiro 6, 2014

Carioca ocupa Guggenheim de Bilbao por Camila Molina, Estado de S. Paulo

Carioca ocupa Guggenheim de Bilbao

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no jornal Estado de S. Paulo em 31 de janeiro de 2014.

Museu ganha retrospectiva do artista Ernesto Neto

Dançando debaixo de uma árvore, olhando-a como se fosse um pulmão, o artista Ernesto Neto descobriu, como conta, uma frase – “A Terra é o corpo”. Escrita em néon e em círculo, é ela que vai receber os visitantes da grande exposição que o carioca inaugura no próximo dia 13 no museu Guggenheim de Bilbao, Espanha.

O Corpo Que Me Leva, título da mostra, apresenta obras criadas pelo brasileiro desde 1989, como o trabalho Copulônia, uma de suas primeiras experiências com formas orgânicas, neste caso, feitas de meias de nylon que carregam esferas de chumbo – “semente de tudo”, ele a exibiu pela primeira vez na Galeria Macunaíma da Funarte, no Rio –, até a monumental Leviathan Thot (Fêmea) de 2006. Dependurada no átrio do edifício, na “garganta” do espaço interno do museu – que, do lado de fora, é a expressão máxima da arquitetura espetaculosa de Frank Gehry –, a instalação faz menção ao organismo feminino e ao monstro do mar descrito no Antigo Testamento.

“Acho que a gente tem visto a Terra como imagem, e há anos trabalho com essa transição do corpo para a paisagem, da paisagem para o corpo. Precisamos ver a Terra como um corpo para termos com ela uma interlocução mais profunda, menos extrativista. A exposição é calcada nesse pensamento”, diz Ernesto Neto, que participa agora da montagem da mostra, concebida com a curadora-chefe do Guggenheim Bilbao, a belga Petra Joos. Não se trata de uma retrospectiva, prefere definir o artista, prestes a completar 50 anos e desde a década de 1990 celebrado na cena internacional. “A exposição não é pensada linearmente, é um acontecimento atemporal.”

A mostra, considerada uma das maiores individuais do brasileiro no exterior (não há itinerância prevista), é formada por nove núcleos. Leviathan Thot (Fêmea), já exibida na França, é tão grande, que será apresentada em Bilbao apenas em um quinto de seu tamanho, ficando a 55 metros de altura com suas formas molengas feitas de nylon, bolas de espuma e de areia. Debaixo da instalação estará Olhando o Céu (2013), com “macas-carrinhos de bate-bate” para o visitante se deitar e ver, em movimento, a obra.

A exposição, em cartaz até 18 de maio, é também pensada como um organismo, conta o escultor, mas de um colibri – ou como nove partes de uma “abelha-beija-flor” (com cabeça, antenas, asas, enumera). “Eu e Petra pensamos no que seria importante mostrar e fomos encaixando as coisas no espaço”, conta. Há, por exemplo, uma versão de sua obra Tambor, que ocupou o Museu de Arte Moderna de São Paulo em 2010, e outras criações participativas.

Diversão. Tendo como “grande avó” a artista Lygia Clark e seu conceito de participação do público na obra de arte, os trabalhos de Ernesto Neto são criações sensoriais (principalmente, suas peças feitas com especiarias), pensados para a relação com o corpo e estimulados pela reflexão sobre o brasileiro e a miscigenação. “Precisamos estudar os índios, os africanos, a conexão da nossa cultura com a japonesa”, afirma. Ele cita como uma novidade em sua pesquisa a experiência recente que teve em agosto no Acre, quando visitou a comunidade indígena Huni Kuin. Para o índio, “a cultura se transforma em natureza e a natureza em cultura”, explica Ernesto Neto – dessas reflexões, surgiu a frase “A Terra é o corpo”, seu comentário atual para o título da famosa instalação de Lygia Clark, A Casa É o Corpo, de 1968 (uma época de “interiorização” que agora “se expande para uma camada ecológica”).

“Nosso colibri quer muito voar, beijar as flores, trazendo pólen daqui para lá. Que a vida nos carregue! Chega de venerar a morte”, afirma Ernesto Neto. “Me perguntaram sobre o caráter de viver, divertir, aproveitar, que existe no meu trabalho. Acho que Jesus defendia que devíamos nos divertir. A polícia matou Jesus e eu não gosto de quem mata as pessoas libertárias”, diz o artista, fazendo referência, também, aos protestos que ocorrem desde o ano passado em todo o mundo.

Posted by Patricia Canetti at 6:28 AM