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setembro 8, 2013
ArtRio: feira carioca, projeto internacional por Audrey Furlaneto, O Globo
ArtRio: feira carioca, projeto internacional
Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no jornal O Globo em 4 de setembro de 2013.
Em terceira edição, que abre nesta quinta-feira ao público, evento tenta atingir padrão de qualidade dos maiores eventos do gênero
Cidade é um dos principais atrativos para estrangeiros
ArtRio 2013: Panorama, Pier Mauá, Rio de Janeiro, RJ - 05/09/2013 a 08/09/2013
RIO - Faltavam dez minutos para as 11h, horário marcado para a abertura da ArtRio, quando o primeiro micro-ônibus de convidados da feira de arte estacionou no Píer Mauá. Na chuva, os VIPs se espremiam diante das catracas à espera da abertura de fato. Passavam por detectores de metais, recebiam seus catálogos e, em seguida, corriam em busca dos escassos guarda-chuvas oferecidos pela organização da feira até chegar à entrada de um dos quatro armazéns.
Se nessa prévia para convidados, na quarta-feira, a ArtRio distribuiu oito mil ingressos, nesta quinta-feira, quando a feira abre ao público pagante, o evento espera receber 12 mil pessoas, número máximo estabelecido dentro de um projeto de “enxugamento” da feira. Após uma segunda edição permeada por queixas de galeristas diante do excesso de público e da falta de organização, a ArtRio, em nome de um alardeado “padrão internacional”, optou pela restrição: o público não poderá passar dos 12 mil visitantes diários (até domingo, poderá chegar a 60 mil; em 2012, foram 74 mil). A venda antecipada de ingressos, pelo site www.ingressorapido.com. br, também faz parte da medida de organização — até anteontem, porém, o site só havia vendido 15 mil ingressos dos 48 mil postos à venda.
Com mais espaço (a área passou de 17 mil m² para 20 mil m²), é mais agradável transitar entre as galerias (ao menos no dia em que a feira se abriu aos VIPs). Há mais área livre não só entre as representantes, mas dentro delas, em estandes de 40m² a até 120m² — apesar de o número de trabalhos total da feira ter aumentado, de seis mil para sete mil. Ao aumento da área da feira soma-se o fato de o evento ter reduzido o número de galerias participantes, que passou de 120 para 106 neste ano. A queda está, sobretudo, entre as estrangeiras, que, no ano passado, eram 60 e, agora, são 45. Não se trata, porém, de desistência, defende uma das sócias da ArtRio, Brenda Valansi.
— Em todas as edições de feiras pelo mundo, há transição de galerias e, neste caso, foi por decisão do nosso comitê, que se baseou não na porcentagem de galerias nacionais e estrangeiras, mas na qualidade delas. Tenho certeza de que internacionalmente a ArtRio é bem avaliada — diz Brenda.
“O Rio é um lugar a que se deseja vir”
No estande da estreante Marian Goodman, o diretor da filial parisiense da galeria Andrew Heyward parecia concordar com a sócia da feira (“Está me parecendo bem organizada, sem crise”), mas ponderava o motivo para sua vinda ao Rio:
— Nós vamos a muitas feiras todos os anos, algo entre seis e nove eventos. Ouvi falar bem da ArtRio, sim, mas a verdade é que escolhemos estar aqui porque setembro é um bom mês e porque o Rio é um lugar a que se deseja vir em algum momento — explicou Heyward.
No estande, ele mostrava aos colecionadores obras de Gerhard Richter, Cristina Iglesias e William Kentridge — os dois últimos com exposições institucionais no país (Iglesias na Casa França-Brasil, no Rio; Kentridge na Pinacoteca de São Paulo). Para Heyward, as mostras em instituições daqui foram a primeira entrada de seus artistas no Brasil, e a feira é a segunda parte da estratégia para estreitar laços com o mercado nacional.
— Os impostos são sempre difíceis, é verdade. É mais complicado aqui do que em qualquer outro lugar do mundo, mas é parte do mercado, não podemos nos lamentar — completou, lembrando que trouxe à feira obras a partir de US$ 20 mil.
Agaleria Marian Goodman está no último armazém da ArtRio que, neste ano, optou por começar pelas galerias jovens, numa espécie de recompensa pelo fato de, no ano passado, elas terem ficado no final do percurso, com obras expostas à chuva e aos pássaros da Zona Portuária. Assim, à esquerda da entrada, o público logo verá as galerias novas, com até seis anos de existência. Do lado direito, estão os estandes de arte moderna. É só mais adiante, no terceiro e no quarto armazéns, que estão as grandes casas internacionais e o primeiro time das brasileiras de arte contemporânea.
No terceiro, por exemplo, a gigante Gagosian é separada apenas por uma parede da londrina White Cube — soa irônico que nela, aliás, esteja uma tela de Damien Hirst, artista que recentemente debandou da vizinha Gagosian. É lá também que estão potências nacionais, como as paulistanas Fortes Vilaça e Luisa Strina.
No quarto e último armazém, a Pace, também estreante no evento, dedica boa parte de seus 120m² a obras de Alexander Calder. Embora as próprias galerias evitem falar de números, comenta-se que é dele a obra mais cara da feira (algo em torno de R$ 20 milhões). Próxima dali, a galerista Juliana Cintra, da carioca Silvia Cintra + Box 4, contava que vinha recebendo e-mails de colecionadores a caminho da feira, mas sem conseguir pousar na cidade (o Aeroporto Santos Dumont ficou fechado durante boa parte da manhã de ontem).
— Eles ligam tensos, mandam e-mails, pedem para reservar obras e até compram antes. Já temos uma longa relação com alguns deles — afirmou Juliana. — Estamos aqui no último armazém e, para nós, a feira começa mais tarde, depois que as pessoas cruzarem tudo.
Sua vizinha de pavilhão, a galerista Eliana Finkelnstein, da paulistana Vermelho, dizia estar contente com a distribuição de galerias nos armazéns:
— O que estava desproporcional no ano passado era aquele espaço da Gagosian (a galeria tinha uma área para expor esculturas, além do espaço de seu estande). Para a feira, é interessante dividir.
Números:
Investimento total na feira:
R$ 9,5 milhões
Quantidade de galerias:
106 , sendo 61 nacionais e 45 internacionais
Área total da feira, que ocupa quatro armazéns no Píer Mauá:
20 mil metros²
Público:
60 mil esperado entre quinta e domingo
Um breve questionamento: estou há muito tempo distante do contato pessoal com o universo da arte contemporânea e, por isso, me sentindo incomodado com o fato do Brasil ter se curvado ao credo da arte como negócio, ou a gana pelo capital, de fato, ensandeceu, nossos artistas, críticos, curadores...? Só mais um pouquinho. Onde fica o papel crítico, contestador, de denúncia contra o capitalismo, o neoliberalismo, a desumanização da vida, tão caro à arte? Dá para combinar este papel com o valor econômico que se atrela a um trabalho e, consequentemente, o transforma em essencial na história da arte?
Posted by: Talvez Mário Simões at setembro 9, 2013 2:48 AMUm breve questionamento: estou há muito tempo distante do contato pessoal com o universo da arte contemporânea e, por isso, me sentindo incomodado com o fato do Brasil ter se curvado ao credo da arte como negócio, ou a gana pelo capital ensandeceu, de fato, nossos artistas, críticos, curadores...? Só mais um pouquinho. Onde fica o papel crítico, contestador, de denúncia contra o capitalismo, o neoliberalismo, a desumanização da vida, tão caro à arte? Dá combiná-lo com exposições como essa, emblematicamente, rotuladas como feira? Arte = Mercado = Ode ao Capital?
Posted by: Talvez Mário Simões at setembro 9, 2013 2:52 AM