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novembro 23, 2012
A psicologia da arquitetura por Nina Gazire, Istoé
A psicologia da arquitetura
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na revista Istoé em 14 de novembro de 2012.
A alemã Candida Höfer, fotógrafa dos grandes espaços desabitados, mostra em São Paulo seus retratos de prédios históricos e contemporâneos
Candida Höfer - Luz, Linhas, Lugares, Galeria Leme, São Paulo, SP - 22/11/2012 a 22/12/2012
A artista alemã Candida Höfer esteve no Brasil pela primeira vez em 2005, a convite do Instituto Goethe. Conhecida por fotografar estruturas arquitetônicas, naquele ano ela realizou uma série de imagens de edifícios do período colonial do Rio de Janeiro e de Salvador, além de fotografar a modernista Brasília. O resultado do trabalho foi a publicação “Brazil Series”, que apresentava imagens relativas aos edifícios históricos do Rio e da Bahia, entre eles a Igreja de São Francisco de Assis, na capital baiana, e o Teatro Municipal do Rio.
Após sete anos da realização desse trabalho, Candida Höfer reúne, em um recorte curatorial inédito, imagens realizadas no País e em outros locais do mundo, na mostra “Luz, Linhas e Lugares”, em cartaz na Galeria Leme a partir de quinta-feira 22, em São Paulo. A exposição apresenta 11 trabalhos, quatro deles de grandes dimensões com cerca de 1,80 m de altura. Em ambientes desprovidos da presença humana, é possível perceber o rigor formal atingido pela fotógrafa, caso por exemplo da foto do Cuvilliés Theater, em Munique, Alemanha. De característica Rococó, o teatro tem sua estrutura rebuscada organizada pelo geometrismo com que Höfer trabalha.
Aluna de Bernd Becher, o maior nome da fotografia conceitual alemã, na Academia de Artes de Düsseldorf, Candida Höfer é, ao lado de Andreas Gursky, Thomas Ruff e Thomas Struth, uma das maiores representantes da nova objetividade, escola da fotografia contemporânea alemã. De sua formação, guardou uma pesquisa estética que busca apresentar uma psicologia social da arquitetura.
A artista começou sua carreira nos anos 1980, fotografando cenas cotidianas, mas na década seguinte passou a se dedicar aos grandes espaços desabitados. A luz, afirma ela, é sempre a primeira coisa que a atrai em um espaço. A luz tropical, em incidência nos amplos espaços da arquitetura brasileira, predomina nas seis fotografias que realizou em Brasília. As fotos mostram o interior do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Palácio do Itamaraty. Neste último, em vez de destacar a perspectiva curvilínea, que costuma predominar nos olhares dedicados à arquitetura modernista de Niemeyer, a ênfase é colocada na iluminação natural do edifício. Já foto do palco e da plateia do Teatro Nacional atenta para o rigor de suas linhas de fuga e simetrias. Apesar da monumentalidade dessas construções, a fotógrafa decidiu representá-las em pequeno formato. “Esse formato foi deliberadamente escolhido por causa do conteúdo das imagens, que para mim enfatizam uma intimidade imprevisível em um lugar como Brasília”, diz Candida Höfer para ISTOÉ.
Bate-papo
Confira abaixo a entrevista realizada com uma das mais importantes fotógrafas da atualidade, a alemã Candida Höfer:
Istoé-Qual foi o critério curatorial usado para escolher os trabalhos da mostra Luz, Linhas e Lugares? Por que você decidiu mostrar junto ambientes tão diferenciados como o Teatro de Munique e a igreja de São Francisco na Bahia?
Candida Höfer: Para mim, montar uma exposição é como escrever um livro, exceto que o que mostro não é uma seqüência de imagens separada por páginas. A diferença é que no caso de uma mostra, os visitantes terão uma visão compreensiva e abstrata de muitas imagens diferentes colocadas em um mesmo espaço. O importante então é criar a impressão de que as imagens estão relacionadas entre si de alguma maneira. Essa sensação é de extrema importância para mim por que ela provoca no observador uma curiosidade sobre os detalhes da imagem.
Istoé-Em 2005, você veio ao Brasil, convidada pelo Goethe Institut, para fazer uma série de imagens da arquitetura colonial brasileira. Geralmente suas fotos mostram as linhas perspectivas de um ambiente, mas nesse caso você teve que lidar com ambientes mais rebuscados como o é da arquitetura barroca de Salvador. Qual foi o seu desafio para realizar as fotografias das igrejas coloniais brasileiras?
Höfer-Essa é uma observação interessante. Sim, eu fiquei surpreendida porque, geralmente, minha abordagem mais purista da linearidade é diferente do padrão barroco brasileiro. Eu já tinha fotografado em lugares parecidos, como Portugal, mas mesmo assim não enfrentei essa tensão da mesma maneira quando vim fotografar no Brasil. O que me atraiu ao país foram as transformações que arquitetura enfrentou por aqui. Depois acabei fazendo uma série sobre Brasília que é algo completamente diferente.
Istoé-Certa vez você afirmou acreditar que a interpretação para o seu trabalho está no olhar do observador. Apesar disso, quais qualidades um lugar deve ter para ser transformado por você em um registro fotográfico?
Höfer- Essa não é uma pergunta fácil de responder. Descobrir os atrativos de um lugar que me façam querer fotografá-lo também é parte do meu trabalho e realmente não pertence ao observador. É difícil precisar o que torna um lugar atraente, porque para mim o ato de fotografar possui dois estágios. O primeiro é a fazer a fotografia do espaço. O segundo é produzir a imagem no meu estúdio. Existe uma diferença de tempo entre esses dois passos. Há também uma diferença no envolvimento emocional também. Voltar ao momento onde a imagem estava sendo fotografada: escolher o lugar guiado pelos meus interesses culturais. Mas para escolher o exato lugar de onde vou fazer a foto é algo que faço seguindo minha intuição.
Istoé-Como foi a experiência de fotografar Brasilia? Por que você escolheu fazer essas imagens em uma escala de tamanho menor do que você geralmente costuma fazer?
Höfer- Como todo mundo que quer visitar o Brasil, eu sempre tive curiosidade de visitar a capital. Escolhi mostrar em um formato menor do que costumo porque os conteúdos das imagens enfatizam a intimidade dos ambientes que fotografei em Brasília, mas eu também fiz algumas imagens em tamanho maior e que não estão na mostra. Para a mostra eu escolhi as imagens menores porque eu queria mostrar esse aspecto da intimidade aos visitantes da exposição.