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outubro 22, 2012
Mostra de Cinema exibe 'Hélio Oiticica' por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
Mostra de Cinema exibe 'Hélio Oiticica'
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 22 de outubro de 2012.
Premiado documentário sobre o artista carioca, realizado por seu sobrinho, recupera imagens históricas e inéditas
A velocidade frenética das imagens de Hélio Oiticica, dirigido por César Oiticica Filho, é proposital. Premiado no último Festival do Rio como melhor documentário, o filme, que integra agora a programação da 36.ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, apresenta vida e obra intensa do artista. "Hélio viveu pouco tempo, promoveu várias revoluções em 30 anos de trajetória", diz o diretor. Hélio Oiticica (1937-1980) é retratado, assim, como em "delírio" - ou em "Delirium Ambulatorium", para usar uma expressão que o próprio artista cunhou.
O criador referencial do neoconcretismo brasileiro é retratado no documentário por meio de sua voz, com destaque para seus depoimentos registrados em cerca de 12 filmes super-8 que Hélio mesmo realizou. Grande parte desse material é inédito, resgatado do acervo particular do artista, em posse de sua família. Como conta César Oiticica Filho, de 44 anos, seu tio já fazia "quase cinema" com seus super-8 e fotografias - o mais conhecido é Agrippina É Roma-Manhattan, de 1972, sem dizer as projeções da série Cosmococa, criadas com o cineasta Neville D'Almeida.
Mas é importante ressaltar que mais do que usar os super-8 de Hélio, o documentário recupera filmes importantes dos anos 1960-70 - como Mangue Bangue, de Neville D'Almeida, Câncer, de Glauber Rocha, o achado "sobrenatural" de Mitos Vadios, e Uma Vez Flamengo, que tem a participação de Hélio; traz imagens de arquivos - de Carlos Vergara, Jards Macalé e Jean Manzon, por exemplo -, apresentando o criador brasileiro e sua época por meio de uma cuidadosa e premiada pesquisa realizada pelo carioca Antônio Venâncio. O filme também utiliza imagens aceleradas feitas pelo diretor, fotógrafo e sobrinho do artista retratado; e coloca uma trilha sonora que tem como auge a gravação especial da música You Don't Know Me, de Caetano Veloso, por Jards Macalé.
Curador da obra de Hélio Oiticica e artista da "quarta geração" em sua família - geração artística que tem também como destaques o poeta e anarquista José Oiticica e o fotógrafo José Oiticica Filho -, César Oiticica Filho, prefere dizer que o filme que realizou é mais uma obra experimental do que um documentário sobre criador dos parangolés e das instalações penetráveis que visava a "uma vivência total do espectador" em sua obra. "Queria apresentá-lo no Brasil de uma maneira íntima, por meio de um discurso próximo. Ele fala da desintelectualização de sua obra", afirma o diretor do filme. Como vemos no documentário, Hélio Oiticica queria que "tudo fosse reduzido ao mais banal" - e no trajeto de sua "desmistificação", há passagens, até polêmicas, que se referem à relação natural do artista com as drogas e o sexo. "Toda cultura brasileira é underground", diz Hélio em um depoimento espontâneo captado em super-8.
O conhecido curta-metragem H.O. (1979), de Ivan Cardoso, é fonte recorrente do novo documentário sobre Oiticica, mas o filme quer com sua edição frenética - feita com o montador Vinicius Nascimento - e pela própria criação de César Oiticica Filho "colocar o espectador no olho do artista" e transformar "a câmera" em "ator", diz o diretor. "Hélio é sol, é o fogo de Hendricks, que ele sempre cita, é explosivo", completa César. "O documentário tem uma lógica cronológica", afirma o diretor, mas é de certa forma fragmentado, concebido por blocos - infância e rua; neoconcretismo; samba; Londres; Nova York (com sexo e drogas e Cosmococa); a volta ao Rio; mitificação e desmistificação; e final. Até o incêndio ocorrido em 2009 na casa de César Oiticica (pai do diretor do documentário), no Rio, residência que abrigava obras do artista plástico, é mencionado de uma maneira "positiva", como define o documentarista, ou discreta, poder-se-ia dizer - imagens deterioradas são colocadas no filme, entre elas, o registro de um homem que usa um parangolé no metrô de Nova York. Por enquanto, o premiado documentário não tem um distribuidor comercial, mas César Oiticica Filho está bem otimista quanto à participação de sua obra no próximo Festival de Cinema de Berlim.
HÉLIO OITICICA
Cinesesc – Nesta segunda-feira, 22, às 14 h
Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca – Dia 29, às 13 h