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setembro 26, 2012
Dragão do Mar, uma "refinaria da cultura" por Pedro Rocha, O Povo
Dragão do Mar, uma "refinaria da cultura"
Matéria de Pedro Rocha originalmente publicada no caderno Vida & Arte em 26 de setembro de 2012.
Novo presidente do IACC, o sociólogo Paulo Linhares fala pela primeira vez sobre seus planos para o Dragão do Mar
Há 20 dias o nome de Paulo Linhares foi confirmado pelo governador Cid Gomes como o novo presidente do Instituto de Arte e Cultura do Ceará (IACC), instituição responsável pela gestão do Dragão do Mar. O anúncio, em meio ao que se chamou de “virada cultural”, um pacote de investimentos do Governo do Estado para reorientar a política da Secretaria da Cultura, gerou grandes expectativas, principalmente em torno do nome de Linhares. Ex-secretário da cultura no governo Ciro Gomes, o sociólogo foi o idealizador do maior centro cultural do Estado, mas nunca havia gerido o equipamento, inaugurado após sua saída da Secult.
Na última segunda-feira, antes de sua primeira reunião com a nova diretoria, ele concedeu entrevista exclusiva ao Vida & Arte, quando falou sobre seus inúmeros projetos para os próximos dois anos à frente do Dragão do Mar (tempo que resta do segundo mandato de Cid). Entre as propostas, o fortalecimento da formação, da criação e da difusão cultural – os três eixos estabelecidos para sua gestão –, assim como o estreitamento da relação com os moradores do entorno do espaço. Projetos ambiciosos, como já se deve esperar de Linhares, e com verba garantida, segundo ele, pelo próprio governador. Confira abaixo, trechos dos depoimentos de Paulo ao O POVO.
Refinaria da Cultura
Eu falo brincando que o Dragão é a refinaria da cultura, porque ele tem que qualificar do ponto de vista de formação e tem que incentivar a criação, por isso que a gente tá trabalhando com a ideia de “laboratório”, onde essa a criação se dá juntamente com o processo de qualificação. E depois o Dragão tem que ter uma preocupação com a difusão. Isso aqui recebe dois milhões de pessoas por ano, pode chegar a três, quatro, principalmente se você tiver uma diversidade de públicos.
A nova formação
Nós temos um grande projeto que é a criação do Porto Iracema, que é o novo Instituto Dragão do Mar. No Porto Iracema, teremos duas vertentes, uma de formação básica e outra de laboratório. A formação básica são cursos de mais ou menos 50 horas/aula e a gente vai criar um modelo em que o aluno não faça só um, mas pelo menos cinco cursos. Se ele vai ser cinegrafista, então ele faz luz, fotografia etc., aí quando ele completar tem o básico. O Instituto Dragão do Mar me ensinou uma coisa: quando você tem gente qualificada, se cria o mercado. Vamos terminar de reformar ali a Capitania (dos Portos, prédio que está à disposição do centro cultural agora). A segunda fase são os laboratórios, que serão destinados aos profissionais que já estão no mercado. A gente selecionou as 10 principais linguagens e para cada linguagem será criado um laboratório. Música, por exemplo, a gente escolhe oito projetos musicais naquele ano e vai supervisionar e dar qualidade pra esses projetos. Então vamos trazer um diretor de cena, um diretor musical e, de comum acordo com o pessoal do projeto, produzir esse espetáculo. É uma maneira de fazer formação com criação. Projetos de um ano.
Ciclos temáticos (difusão)
O que eu sempre pensei, que era o projeto original do Dragão e que eu acho que é um certo padrão dos centros culturais do mundo, é eleger grandes ciclos temáticos de discussão. No caso específico do Dragão, nós vamos eleger trimestralmente um grande tema, que tem um diálogo com o Ceará, com o Brasil. Não vou te dizer logo os quatro, não, que perde a graça, mas o primeiro vai chamar “CEPIRA: o pop e o caldo popular”. Vai ser uma discussão em janeiro, fevereiro e março. Ceará, Piauí e Pará. Uma discussão sobre esse fluxo de cultura que se criou a partir do Ceará e que vai pro Pará no que eu chamo o “rastro do boi”, e volta pra cá também. Não é o axé baiano, nem a cultura pernambucana, é um eixo completamente diferente que vamos discutir, essa questão do brega-pop, que gerou essa onda todinha da Gabi Amarantos, Aviões do Forró... Acho que uma das tarefas dos centros culturais é dar visibilidade a esses fenômenos que são mais ou menos conceitualmente invisíveis, então vai ter ciclo de debates, exposição, shows... Esse é o primeiro.
Casa de criação
A parte de incentivo à criação tem uma dupla mão, desde os laboratórios, até a questão da programação do Dragão, que deixa de ser uma casa de recepção e passa a ser uma casa de criação. Claro que nós vamos receber exposições também, mas vamos deixar de ser uma casa passiva para ser uma casa de criação. E aí tem dois projetos interessantes. Nós vamos fazer um grande festival anual que vai se chamar “Ceará, Mostra a tua Cara”, que vai envolver toda a Praia de Iracema. Vai acontecer em janeiro, todo ano, e pretende ser um balanço anual do que aconteceu na cultura. Começa em 2014. Vai ter festival de cinema, música... Vai ser um grande movimento.
Segurança
A gente tem três projetos. Primeiro a gente tem um problema, a gente precisa trabalhar o entorno do Dragão. Quando o Dragão começou, tínhamos um projeto para que, se tivesse uma opção entre o pessoal do Poço da Draga, eles seriam privilegiados em possíveis contratações. Então a gente tem que retomar essa relação, o Dragão tem que sofrer as dores e as alegrias do Poço da Draga, tem que estar ligado com eles, tem que ter um trabalho social com o entorno, incentivar o trabalho e a participação, a vivência dessas pessoas com o Dragão. Depois a gente quer fazer um “Centro de Criação Cultural” pra esse pessoal. Não adianta a gente imaginar que vai eliminar esse pessoal por decreto. É um trabalho a longo prazo, um trabalho extremamente delicado. E a terceira coisa, a gente vai colocar aqui seria um “Batalhão de Cultura e Arte” da Polícia Militar. Queremos selecionar (os policiais) de acordo com o nível de ligação que têm com a cultura, aí a ideia é que a gente tenha em oito pontos do Dragão um casal fixo e estabelecer também um sistema de câmeras de segurança e uma central de inteligência.
Dinheiro
Já arranjei. O orçamento do Dragão hoje é de apenas 9 (milhões) para os três equipamentos. Mas já negociei dinheiro pra formação, pra programação, aquele dinheiro que foi apresentado lá (no lançamento da virada cultural). Não estou nem contando com esse dinheiro da reforma (R$ 11 milhões para integração com a Biblioteca Menezes Pimentel). Eu tenho negociado 49 milhões pra dois anos. São dois anos só (até o fim do mandando de Cid gomes). Esse dinheiro é o seguinte. Existem dois fluxos de investimentos no Dragão, tem um contrato de gestão e tem investimentos fora do contrato de gestão que o governador aprova via MAPP (Monitoramento de Ações e Projetos Prioritários). No contrato de gestão, é claro, vamos colocar o máximo, mas ele tem limites orçamentários, porque na verdade os orçamentos fixos sobem no máximo 10%, aí já vai ser uma luta. O resto vai ser via MAPP. Você cria projetos, o governador aprova e eles entram via Secretaria da Cultura. O governador já aprovou os projetos. Eu fiz uma grande discussão com ele, item por item. Aquela fase todinha em que eu não falava nada foi uma grande conversa com o governador. A preocupação número 1 dele é formação. E nesse dinheiro praticamente não existe obra, ele é quase todo é pra a cultura mesmo.
Saiba mais
Nova diretoria no IACC
Paulo Linhares trocou vários cargos da diretoria do IACC com a sua chegada. A professora de audiovisual Beth Jaguaribe assume a nova Diretoria de Formação. A jornalista Isabel Andrade passa a ser a diretora de Ação Cultural e Maninha Morais, secretária adjunta da Secult, entra na Diretoria de Planejamento e Gestão. Valéria Sales permanece na Diretoria Financeira, assim como Diana Pinheiro no comando do Centro Cultural Bom Jardim. A ex-presidente do IACC Isabel Fernandes agora comanda a gestão da Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho. Linhares ainda assume provisoriamente a curadoria do Museu de Arte Contemporânea do Dragão do Mar.