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julho 23, 2012
Leitura em entrelinhas por Paula Alzugaray, Istoé
Leitura em entrelinhas
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na seção de artes visuais da Istoé em 20 de julho de 2012
A Trigésima Bienal de São Paulo reúne artistas em constelações. Aqui, alguns nexos possíveis entre as obras de Moyra Davey e de Viola Yesiltaç
Trigésima Bienal de São Paulo – A Iminência das Poéticas/Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque Ibirapuera, SP/ de 7/9 a 9/12
Boa parte dos trabalhos que a artista canadense Moyra Davey apresentará na Trigésima Bienal chegará pelo correio. Cada uma das 50 fotografias das séries “157 (Men)” e “157 (Women)” será dobrada em forma de envelope, postada e enviada para o endereço: Fundação da Bienal de São Paulo. São fotografias tiradas na estação de metrô da rua 157, em Nova York, onde a artista vive há 12 anos. Moyra define o trabalho como uma atualização da “arte postal”, gênero que surgiu nos anos 1960 como forma de troca, comunicação e circulação artística alheia ao mercado e às instituições de arte. Hoje, porém, a arte postal não é a antítese do sistema e o trabalho de Moyra é endereçado diretamente às instituições.
Antes da Bienal de São Paulo, Moyra realizou séries semelhantes para o Museu de Arte Moderna de Nova York (com imagens da biblioteca do MoMA e de um café), exposta na mostra “New Photography 2011”, até janeiro de 2012; e para a Bienal do Whitney de 2012, onde expôs imagens de cartas de amor escritas em 1796 e de um diário de uma jovem escritora. A artista usa o meio fotográfico há 30 anos – além do vídeo e do texto –, mas a fotografia postal começou há cinco anos, quando dobrou fotografias e enviou para amigos, pedindo que mandassem de volta. Depois, expôs as fotos com os vestígios das viagens de ida e de volta. “Estou interessada nessa fotografia que não é apresentada como algo precioso. Para mim, mandar uma fotografia pelo correio é fazer com que ela volte a ser um pedaço de papel”, diz ela.
Se em Moyra Davey, a fotografia almeja ser um papel de carta, suporte para declarações, confidências e outros textos, na obra da alemã Viola Yesiltaç o papel é a mídia predominante – a “liga” que une todos os trabalhos de sua poética. Na Bienal, Viola vai expor nove fotografias, sete desenhos e uma escultura – todos realizados sobre papel. “Meu trabalho é formado por várias mídias, que se encontram no espaço expositivo e discutem entre si”, diz Viola. “Meu intuito é chegar ao ponto em que você não consegue identificar se o trabalho é uma foto, uma escultura, um desenho ou uma performance”, afirma ela.
Esse aspecto de debate, conferência ou simpósio que se dá entre os trabalhos de Viola é reforçado pela performance, realizada pela artista sempre ao vivo, durante a exposição, no meio dos trabalhos expostos. Viola estudou fotografia e performance em Londres. Ao se transferir para Nova York, trouxe essa espécie de fotografia performática, que não se contém em si mesma e quer sempre se disfarçar de outras mídias e interpretar novas personagens.
Durante a performance a ser realizada em São Paulo, Viola lerá um texto em que aparecem personagens realizando leituras críticas sobre o seu trabalho. Aqui, mais uma vez, seu suporte será o papel, em que estarão escritas as ações de suas obras-personagens.
Além de ambas serem estrangeiras vivendo em Nova York e de destinarem um papel protagonista aos diversos usos do papel, Moyra Davey e Viola Yesiltaç compartilham ainda o interesse em registrar o cotidiano e trabalhar com os elementos de seu contexto imediato. Moyra trata a fotografia como forma de mapeamento dos territórios em que vive. No caso de Viola, os objetos do cotidiano são apropriados, modificados e ajustados aos seus roteiros subjetivos.