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julho 19, 2012
Daisy Xavier usa madeira para criar formas de 'quase ficção' por Audrey Furlaneto, yahoo notícias
Daisy Xavier usa madeira para criar formas de 'quase ficção'
Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no yahoo notícias em 18 de julho de 2012
RIO - Na entrada da galeria Anita Schwartz, onze pontiagudas lanças de madeira saem da parede rumo ao chão. Algumas delas, porém, não chegam a tocar o piso e estão equilibradas pelo resto do que um dia foi uma taça de vidro azul. Daisy Xavier chama este primeiro trabalho da exposição "Arqueologia da perda" (que a galeria abre nesta quarta, para convidados, às 19h) de "Batalha", em referência à "A Batalha de São Romano", de Paolo Ucello, do século XV - e talvez a seu próprio trabalho.A batalha de Daisy está em criar na galeria obras que não repitam a bem-sucedida exposição que apresentou recentemente no Museu de Arte Moderna do Rio. Lá, móveis, ora inteiros, ora despedaçados, equilibravam-se sobre copos, taças e vasos de vidro azul.
Destruir para remontar
Da batalha rumo à galeria, restaram a madeira e poucos vidros. Não há mais formas definidas. Há, sim, a memória do que um dia já foi forma, criando o que a artista define como "quase ficção" .
Depois de ver a "Batalha", de 2012 (assim como todos os demais trabalhos da mostra), o espectador adentra o espaço principal da galeria para se deparar com 15 esculturas - a maioria na parede. Três delas são menores e e precedidas por uma delicada lente de aumento pela qual se pode ver um número talhado.
Todas as formas são feitas de madeira antiga, que já era usada na mostra do MAM. Para Daisy, o material antigo, que um dia foi móvel, "dá a sensação de coisa vivida". No museu, diz a artista, ela tentava mostrar "a memória da casa prestes a desmoronar". Na galeria, tudo é "mais abstrato, e o móvel já não surge mais como cadeira, como mesa, mas como quase ficção".
- Foi difícil dar continuidade ao trabalho depois da exposição no MAM. Lá, foi a primeira vez que usei esculturas e, agora, sabia que queria fluidez de linhas e formas, mas já não queria mais a madeira esculpida, talhada, desenhada.
Daisy, então, desmontou móveis e usou, por exemplo, pernas de cadeiras para criar uma escultura no chão, que não chega a sugerir uma forma definida. Na parede, remontadas, as partes dos móveis criam formas sinuosas, curvilíneas que podem passar de três metros de altura.
O título da exposição, "Arqueologia da perda", diz muito da proposta da artista: "Usar coisas destruídas para remontar algo e criar uma ficção", como ela mesma define. Aos 60 anos, Daisy atende pacientes (ela é psicanalista) pelo menos três vezes na semana. Nos demais dias, dedica-sa ao ateliê, no andar de cima do consultório. Não à toa, vê muito de psicanálise no trabalho artístico.
- O processo de análise é também este, o de destruir tudo para remontar e rearticular de outra forma - explica. - Perdas existem o tempo todo. A ideia é sempre aprender a reinventar o sentimento.
No terceiro andar da galeria, ela apresenta algumas telas que usa para a "formalização das esculturas". A sala com pinturas em preto, marrom e azul anil (o mesmo dos vidros que Daisy costuma usar nas obras) funciona como um bloco de anotações da sala principal, de esculturas. Já no contêiner da galeria, na varanda do terceiro andar, ela mostra o vídeo "Mar sem orla", de 2010. Nele, um poema numa folha de papel queima aos poucos, deixando ver, abaixo dele, o mar azul.