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julho 2, 2012
Correspondência artística por Nina Gazire, Istoé
Correspondência artística
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 29 de junho de 2012.
Exposição reúne obras trocadas via correio por artistas da América Latina e Europa Oriental durante os anos de chumbo da ditadura
Redes Alternativas / Museu de Arte Contemporânea da USP, São Paulo até 30/09
A arte postal, também conhecida como mail art, surgiu em meados dos anos 1960 movida por um espírito libertário. Suas obras seriam consumidas e trocadas por artistas que usariam os correios para fazer circular a sua produção longe das imposições do mercado de arte e do espaço estanque das galerias e instituições oficiais. Essa prática artística, no entanto, vai muito além da troca de experiências e uma ótima oportunidade de repensar o seu papel acontece com a exposição “Redes Alternativas”, em cartaz no Museu de Arte Contemporânea da USP, em São Paulo.
Se na Europa Ocidental e na América do Norte essa produção visava liberar a própria arte de suas amarras institucionais, nos países latino-americanos, que viviam sob regimes ditatoriais, ela era uma arma contra o sufocamento cultural. Foi por meio dos correios que durante as décadas de 1960 e 1970, período em que os efeitos da Guerra Fria também asfixiavam nações do Leste Europeu, importantes nomes do Brasil, Argentina, Polônia, Alemanha Oriental e Hungria, entre outros, iniciaram uma correspondência prolífica, não só de trabalhos, mas principalmente de ideias. “O correio foi um lugar seguro para essa troca que escapava da censura e acabou por encontrar acolhimento em um lugar neutro, como foi o caso do Museu de Arte Contemporânea da USP”, comenta Cristina Freire, curadora da mostra que reúne o intercâmbio de obras entre a América do Sul e o Leste da Europa.
A exposição é o resultado de uma pesquisa feita dentro do acervo do MAC-USP, que a partir de 1963, sob a direção do professor Walter Zanini, procurou dar abrigo a uma produção de resistência, como é o caso da arte postal. Está centrada, principalmente, no uso da fotografia como registro de performances que depois eram trocadas entre os artistas, acompanhadas de textos descritivos. Tal experiência gerou uma série de proposições que funcionaram como estratégias de sobrevivência. A ironia dá o tom, por exemplo, da obra “Veículo”, do polonês Krysztof Wodiczko. O artista criou uma espécie de esteira rolante móvel que se desloca com o caminhar do usuário. “Na estrada do progresso, na rodovia para um futuro melhor, o intelectual precisa contribuir para o processo racional”, escreveu Wodiczko no texto ao lado das fotografias que foram enviadas ao museu em 1973. Em “Sequela”, de Fernando Cocchiarale, o artista registra as marcas deixadas em seu braço por uma corda apertada. “Representantes de ambas as regiões fizeram amplo uso da fotografia por ser um meio de reprodução acessível que ficava longe de um controle oficial”, explica Cristina, cuja pesquisa teve origem em uma curadoria anterior, realizada em 2009, para uma exposição na Alemanha, denominada “Práticas Subversivas”.