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maio 11, 2012
Maior presença de galerias estrangeiras e boas vendas pautam a abertura da SP-Arte por Audrey Furlaneto - Agência O Globo, Yahoo Notícias
Maior presença de galerias estrangeiras e boas vendas pautam a abertura da SP-Arte
Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no Yahoo Notícias em 10 de maior de 2012.
SÃO PAULO - Um homem de terno masca chiclete sem parar e, alternando as mãos entre os bolsos e um iPhone, passa por obras dos britânicos Antony Gormley e Damien Hirst. Uma vez. Duas. Três. Tim Marlow não fica imóvel por mais de alguns segundos no estande da White Cube, galeria inglesa que faz sua estreia na SP-Arte, aberta anteontem em São Paulo. Um dos diretores da galeria, ele caminha com desenvoltura (e um sorriso de canto de lábios) entre as obras: não se passaram quatro horas, e a White Cube já vendeu mais de R$ 5 milhões.
- Estamos nos saindo muito bem, você não acha? - diz, radiante, antes de puxar uma gargalhada interrompida em seguida pelo mascar de chiclete.
A White Cube levou para a SP-Arte obras de Hirst - entre elas, uma das "Spot paintings" (telas de bolinhas) do artista, vendida por R$ 1,9 milhão, e uma vitrine de remédios (R$ 2,5 milhões) - além de uma escultura de Gormley (arrematada por R$ 933 mil) e um néon de Tracey Emin (vendido por R$ 156 mil).
A poucos metros dali, Luisa Strina, dona da galeria mais antiga de São Paulo (fundada em 1974), que lançou artistas como Cildo Meireles e Antonio Dias, comenta com bem menos bom humor o crescimento da feira - este ano, com o triplo do tamanho e 110 galerias (21 a mais do que em 2011).
- Acho péssimo! Gosto de feira pequena. Por quê? Porque é mais gostoso, ora - diz, enquanto pede a um dos assistentes que lhe coce as costas ("Não aí! Mais para o meio!", ela guia).
Luisa abre o sorriso quando colecionadores se aproximam. Vendeu na abertura uma série de esculturas em bronze de Edgard de Souza, uma pintura de Caetano de Almeida e uma obra de Cildo.
- Não vou falar de preço, pelo amor de Deus! - diz, ajeitando o colar de incontáveis figas, para, como afirma, "espantar o olho gordo".
Não é só ela que está um tanto tensa com o crescimento da feira paulistana. O carioca Ricardo Rego, dono da Lurixs, afirma ter "algumas dúvidas" sobre a forte presença de galerias internacionais na feira (são 27 neste ano, contra 14 no ano passado):
- Acho que toda competição é interessante. Um atleta só melhora sua performance quando disputa com os melhores. Por outro lado, essas galerias internacionais exercem um deslumbramento sobre as pessoas. E brasileiro é deslumbrado, né? Talvez prefira comprar algo internacional, porque está numa boa condição, com menos impostos. Falo também como colecionador. É muito sedutor ter a possibilidade de incluir um Damien Hirst na coleção. Ainda mais sem imposto.
Aos moldes do que fez a ArtRio em 2011, a SP-Arte deste ano conseguiu, com o governo estadual, isenção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para atrair mais galerias e, claro, compradores. Embora reduza em cerca de 20% o preço das obras comercializadas na feira, a isenção é objeto de quase desdém entre as galerias estrangeiras.
- Nós decidimos vir antes de saber disso. O imposto alto do Brasil dificulta, sim, as vendas, mas não é impossível vender ainda assim - afirma Tim Marlow.
Na francesa Yvon Lambert, que no primeiro dia vendeu trabalhos de Mario Testino e Douglas Gordon, o discurso era parecido.
- Quando se decide ir a uma feira ou não, não é por ter mais ou menos impostos - diz o francês Olivier Belot, diretor da Yvon Lambert. - Mesmo se o imposto estivesse valendo, seria bom vir.
No estande da galeria paulista Millan, que reúne artistas brasileiros como Tatiana Blass, Rodrigo Andrade e Paulo Pasta, foram vendidas obras por valores entre R$ 6 mil e R$ 90 mil. Sócia da galeria, Socorro de Andrade Lima diz que a feira sempre é muito boa, mas que ainda não sabe avaliar seu crescimento.
- Ampliar e abrir é muito bom, mas não é preciso focar em quantidade. A Basel, que é a melhor do mundo, não cresce há décadas. São 200 galerias e ponto. Só entra uma se sai outra - lembra a marchande. - É preciso crescer com caminhos certos. Não sei, por exemplo, se os colecionadores brasileiros querem ir por esse caminho de comprar obras internacionais. É deixar de estar num universo em que se transita muito bem, o da arte brasileira, e ir para outro.
Para Socorro, a SP-Arte ficou "um pouco balançada" depois da ArtRio:
- Precisaram se mexer e mostrar algo novo, o que, aliás, é muito positivo.
Para a fundadora da feira, Fernanda Feitosa, o crescimento é "absolutamente normal":
- Nunca tivemos a intenção de transformar a SP-Arte numa megafeira de 200 galerias. Crescemos 21 galerias de 2011 para este ano, não é nada demais. Temos mais espaço, sim, mas você vê que temos mais de 5 mil pessoas no pavilhão, e todas circulam livremente.
Sobre a influência da ArtRio, que surgiu no ano passado e alardeou números muito maiores do que os da SP-Arte - a feira do Rio diz ter arrecadado R$ 120 milhões, enquanto a SP-Arte, no mesmo ano, vendeu R$ 30 milhões -, Fernanda minimiza:
- Nós somos a feira líder do país e somos modelo para outras feiras. Estou absolutamente confortável neste papel.
Daniel Roesler, que trabalha ao lado da mãe na galeria Nara Roesler, comemorava a venda de uma pintura de Rodolpho Parigi por R$ 50 mil e outra de Cristina Canale por R$ 60 mil - as obras, segundo ele, ficaram cerca de 9% mais baratas com a isenção do ICMS (o percentual do desconto varia de acordo com o faturamento de cada empresa). O marchand parece se importar menos com o alvoroço em torno das galerias internacionais:
- De certa forma, talvez ainda faça mais sentido, para os brasileiros, focar em obras locais.
Na Fortes Vilaça, que vendeu, entre outras, uma tela de Janaina Tschäpe por R$ 145 mil, a marchande Alessandra d'Aloia defende que uma feira não trata apenas de negócios:
- Feira é troca, é diálogo, é dar visibilidade aos artistas e fechar exposições, por exemplo. É por isso que acredito que o mais radical aqui é a nova separação de galerias.
A marchande se refere à atual divisão da SP-Arte, que restringiu ao primeiro andar galerias de arte contemporânea de mercado primário (que cuidam da carreira do artista). No segundo andar, ficam as de mercado secundário, ou seja, que revendem obras. No terceiro, estão as mais jovens e um projeto curatorial assinado por Adriano Pedrosa - quatro curadores foram convidados a montar exposições com artistas de galerias presentes na feira.
- Não usaria a palavra separação - diz Fernanda Feitosa, já depois das 22h, no fim do primeiro dia (a feira vai até domingo no Pavilhão da Bienal). - É uma redistribuição. Isso aqui é um exercício coletivo de leitura de obras de arte. E precisamos nos reinventar.