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março 19, 2012

Nova meta de Inhotim é se tornar referência em educação por Audrey Furlaneto, O Globo

Nova meta de Inhotim é se tornar referência em educação

Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de São Paulo em 19 de março de 2012.

RIO - Seis anos depois de ser inaugurado distante do principal eixo cultural do país (a 545 km de São Paulo e a 400 km do Rio), o Instituto Inhotim já se consagrou como o principal centro de exposição de arte contemporânea do país. Os visitantes saltaram de pouco mais de sete mil, no ano de inauguração, para 247 mil em 2011. A forma como estão distribuídas as cerca de 500 obras de arte pelo parque - com nada menos que dois milhões de metros quadrados - chama a atenção de espectadores e especialistas em todo o mundo. Unanimidade na área, Inhotim tem nova ambição: tornar-se referência em educação.

Em abril, a megainstituição, cujo empreendimento é avaliado em algo como US$ 200 milhões, dará um importante passo para isso. Vai sediar o primeiro curso intensivo de curadoria - a arte de montar exposições - de um dos mais importantes institutos voltados para a profissão, o Independent Curators International (ICI), de Nova York. A presidente da escola, Kate Fowle, visitou Inhotim pela primeira vez em 2010 e sentiu estar num lugar "incrivelmente único para pensar curadoria".

- Se tivesse que ilustrar o trabalho de um curador, desenharia um iceberg. A exposição seria a parte que se vê acima da água, e toda a pesquisa e o engajamento que se produz seriam o que está escondido debaixo da superfície - diz Kate. - O tempo que curadores gastam vendo arte, falando com artistas e entendendo contextos de produção artística supera de longe a duração de uma exposição.

Maioria dos inscritos não é do Brasil

Na próxima semana, ela e o corpo de curadores de Inhotim anunciam os 15 escolhidos entre os 48 candidatos que apresentaram projetos para conseguir uma vaga no intensivo. São apenas seis dias, de 22 a 28 de abril, ao custo de R$ 4 mil por aluno, para ter encontros com a presidente do ICI, os curadores independentes Victoria Noorthoorn e Adriano Pedrosa, o codiretor da galeria Artangel, de Londres, James Lingwood, e o corpo curatorial do instituto, formado por Allan Schwartzman, Rodrigo Moura e Jochen Volz.

A maioria dos inscritos não é do Brasil: curadores europeus, latino-americanos, turcos e até da Oceania tentam uma vaga no intensivo do ICI no país. Todos têm pelo menos cinco anos de experiência - ou, como define o curador de Inhotim Jochen Volz, "um bom repertório de fiascos e sucessos".

- Inhotim é diferente de qualquer outra instituição que conheci no mundo, pela evolução única de um incrível programa de arte. Além do lugar magnífico e das atitudes inovadoras, que são simplesmente incríveis de se vivenciar, a equipe curatorial tem pensado e abordado questões como a adaptação de obras site-specific e a recriação de projetos perdidos ou não realizados.

Fowle se refere a trabalhos como a Galeria Cosmococa, que reúne num único ambiente e em caráter permanente as cinco cosmococas de Hélio Oiticica e Neville d'Almeida. As obras, de 1973, ganham espaço raro no instituto e, antes, só haviam sido vistas juntas em uma exposição temporária. Há ainda a recriação da obra "Narcissus Garden", que a japonesa Yayoi Kusama fez para a Bienal de Veneza de 1966. Em Inhotim, as esferas brilhantes de aço inoxidável da obra de Kusama flutuam em espelhos d'água imaginados especialmente para abrigá-las.

Para o curador Rodrigo Moura, que entre 2004 e 2006 esteve à frente do Museu de Arte da Pampulha, em Belo Horizonte, o curso com o ICI é o "reconhecimento de Inhotim como ponto de discussão".

- O que temos constatado é que há um número crescente de estrangeiros que têm Inhotim como destino principal da viagem. O instituto parece ter entrado para a proposta do turismo de peregrinação, de procurar lugares remotos para conhecer, espécie de tendência do mundo contemporâneo - avalia Moura.

Há, por exemplo, um grupo de colecionadores da Coreia com visita agendada para o segundo semestre. Assim como os grupos leigos - ou seja, não especializados em artes plásticas, que, segundo Moura, costumam ter "respostas muito generosas" -, colecionadores e estudiosos mostram-se "surpresos, parecem estar diante de algo muito novo":

- Os museus normalmente fragmentam a presença do artista. Nós fazemos o oposto: buscamos o aprofundamento e a intensificação de uma trajetória, da individualidade de um artista.

Formação para o lidar com o mercado

Para Jochen Volz, a curadoria de Inhotim ainda se beneficia de um elemento: a jornada. O instituto não é exatamente próximo do eixo turístico do país e, para conhecê-lo, os espectadores (exceto os da vizinha Brumadinho) farão uma viagem.

- O espectador já se deslocou de seu lugar, está num parque, caminha e, de repente, está numa obra de Cildo Meirelles. Temos a ideia de ele ser guiado, sem ser conduzido - explica Volz.

Ele foi, entre outras mostras, curador da Aichi Trienal de Nagoya, no Japão, em 2010, da 53 Bienal de Veneza, na Itália, em 2009, e curador convidado da 27 Bienal de São Paulo, em 2006.

- Curadoria se aprende fazendo e vendo. Eu mesmo nunca fiz um curso - diz, rindo. - Mas pude ver muitas exposições.

Ainda assim, Volz defende a necessidade de formação de curadores com "pensamento mais elaborado e sofisticado" para lidar com "um mercado de arte também cada vez mais sofisticado e complexo". Inhotim, ele completa, reforça essa complexidade:

- É desafiador criar um conjunto que será permanente e que ganhe, com os anos, mais relevância. Vejo o curador também como um produtor que facilita e provoca o trabalho do artista. O curador é um pouco sócio no crime.

A proposta dos intensivos do ICI é colocar frente a frente profissionais de diferentes origens e expectativas, a fim de criar debates e, claro, soluções expositivas.

O ICI, segundo Fowle, reconhece a "invisibilidade" da profissão e foi criado em 1975 para apoiar mostras de curadores independentes que já buscavam levar a arte a públicos maiores. A primeira exposição, aliás, ocorreu no Brasil, na Bienal de São Paulo de 1975. O ICI viabilizou o projeto dos Estados Unidos, trazendo ao país obras de 32 artistas que estavam começando a ter notoriedade. Entre os nomes, por exemplo, estava Nam June Paik.

Posted by Guilherme Nicolau at 1:29 PM