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fevereiro 13, 2012

Mostra no CCBB reúne 85 obras de Tarsila do Amaral por Audrey Furlaneto, O Globo

Mostra no CCBB reúne 85 obras de Tarsila do Amaral

Matéria de Audrey Furlaneto originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 13 de fevereiro de 2012.

RIO - Foi no Rio de Janeiro que, em 1929, Tarsila do Amaral fez sua primeira mostra individual no Brasil. Depois, expôs na cidade em 1933 e em 1969. Desde então, a artista modernista que talvez seja a mais frequente no imaginário popular nunca mais teve uma exposição na cidade. O CCBB vai quebrar o jejum de 43 anos com "Tarsila do Amaral — Percurso Afetivo", reunião de 85 obras da artista que será inaugurada hoje, às 19h, para convidados, e amanhã para o público. Há, no entanto, uma falta que será rapidamente identificada: "Abaporu" (1928), sua pintura mais famosa, não integra a exposição. Segundo o curador Antônio Carlos Abdalla, o colecionador Eduardo Costantini, dono da tela que é o carro-chefe de seu museu, o Malba, em Buenos Aires, não se mostrou muito "disposto" a um novo empréstimo da tela, que veio ao Brasil em 2008, para uma retrospectiva na Pinacoteca de São Paulo, e em 2011, para uma mostra em Brasília — na ocasião, aliás, a presidente Dilma Rousseff posou ao lado da pintura.

— Se tivesse sido muito fácil, teria vindo. Nunca fui muito a favor de trazer "Abaporu", porque a gente corre o risco de fazer a exposição do "Abaporu", e não da Tarsila do Amaral. Estava consciente disso — afirma o curador. — Também não temos o original de "A Negra" (1923), porque o MAC (Museu de Arte Contemporânea) de São Paulo está em reinauguração e não podia emprestar. A solução foi trazer "Antropofagia" (1929).

Em "Antropofagia" (1929), para o curador da exposição no Rio, estão reunidos os personagens das telas "Abaporu" e "A negra" — esta última, conta ele, foi criada pela artista a partir de uma foto de sua babá. O retrato dela foi encontrado pela família de Tarsila num de seus diários e será parte da montagem carioca. Outro dos diários, o de viagens que ela fez quando casada com Oswald de Andrade, foi usado como fio condutor da exposição.

— Tarsila pega notas de restaurantes, bilhetes de viagens de trem, fotografias, pouquíssimas coisas escritas e cria um diário visual da viagem. Não é textual. Isso tem uma forma um pouco caótica. Não se tem domínio absoluto de uma recordação. As memórias surgem no momento e vão sendo coladas no papel de uma maneira um tanto aleatória — conta o curador.

Inspirado pelo diário visual da modernista, ele optou por não organizar as obras no CCBB a partir de classificações acadêmicas. "Tarsila do Amaral — Percurso afetivo" é, como define, "uma mostra de colagens de obras da artista".

A proposta livre permitiu a Abdalla, por exemplo, agrupar três telas em que Tarsila retrata o Rio no que chama de "trilogia carioca". Assim, o público verá na sequência "Morro da favela", "Estrada de ferro Central do Brasil" e "Carnaval em Madureira", telas que são da fase conhecida como "Pau brasil", todas de 1924, ano em que ela chegou à capital fluminense.

Do Rio, Tarsila e os modernistas partiram para Minas Gerais, onde, conta Abdalla, fazem "a redescoberta do Brasil, em que se valoriza o barroco mineiro".

Dois anos depois da chegada ao Rio, Tarsila abre sua primeira individual em Paris, com crítica bastante favorável. No mesmo ano, ela se casa com Oswald de Andrade, e os dois viajam pela Europa e pelo Oriente Médio.

— Conta a lenda que a beleza estonteante de Tarsila parava pessoas nas ruas de Paris. Ela sempre teve essa coisa de mito da mulher deslumbrante, bonita, elegante, com dinheiro e talento. Mas não gosto de deixar de lembrar que, ao mesmo tempo, ela teve a vida muito marcada pela tragédia — defende.

Dor e esplendor

Tarsila perdeu a única filha, Dulce, e, mais tarde, a única neta, Beatriz, que pintou em vários retratos. Sua família, bastante rica, perdeu recursos na Crise de 1929.

Ainda assim, o esplendor de Tarsila é presença marcante na exposição seja pela exuberância de cores nas telas ou pelos objetos pessoais. Uma estola e um bracelete criados para ela por Paul Poiret, o estilista da alta sociedade francesa na década de 1920, foram cedidos pela família para a montagem.

A responsável pela obra de Tarsila entre os descendentes da modernista é sua sobrinha-neta, que carrega seu nome — e ganhou o apelido carinhoso de Tarsilinha, para se diferenciar da célebre tia-avó. Ela ainda cedeu para a mostra no CCBB pincéis, espátulas e um Moleskine com desenhos e anotações.

— É sempre um conjunto tão bonito de ser exibido reunido — diz Tarsilinha, 47 anos, que tinha oito quando a artista morreu, em decorrência de complicações após uma operação na vesícula, em 1973. — Era uma tia muito próxima, eu era a queridinha. Me lembro tanto dela, dos corredores da casa na (rua) Albuquerque Lins (em Higienópolis, São Paulo), da sala, dos quadros, de nós duas na casa.

Tarsilinha, que organizou o catálogo raisonné da artista, diz que conseguir 85 obras de Tarsila é "uma tarefa árdua". O curador concorda. Para ele, os colecionadores têm uma relação afetiva com a obra da artista.

— Todos são muito ciosos de suas telas — afirma.

Além da exposição aberta agora, a artista ganhará em março mais uma reunião de suas obras — no livro "Tarsila — Os melhores anos" (M10 Editora), que trará imagens de seus trabalhos e sua história contada pela crítica Maria Alice Milliet.

Posted by Cecília Bedê at 3:32 PM