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novembro 11, 2011
Do lixo ao pixo por Paula Alzugaray, Istoé
Do lixo ao pixo
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na seção de artes visuais da Istoé em 4 de novembro de 2011.
Itaú Cultural convida os cinco curadores mais ativos da década para montar exposições sobre a arte dos próximos dez anos
O princípio é o caos. O ponto de partida mais certeiro e radical da exposição “Caos e efeito” é a mostra “Contrapensamento selvagem”, curadoria de Paulo Herkenhoff. Lá, no segundo subsolo do Itaú Cultural, encontra-se a crítica de Herkenhoff ao pensamento selvagem de Claude Lévi-Strauss e “artistas cujos trabalhos dão a ver certa indomesticação existencial do pensamento”, segundo o curador. Nesse andar mais profundo de “Caos e efeito”, encontra-se Oriana Duarte e seu autorretrato em forma de “Selvagem sabedoria”; Solon Ribeiro e sua des-homenagem ao cinema de Hollywood; Thiago Martins de Melo e sua pintura torturada; e Jaime Figura e sua performance terrorista, entre muitas outras obras, objetos, redes e tendas. Hélio Oiticica teria adorado. Há ainda muita videoperformance e muita pichação, conformando uma museografia anticubo branco, em que o limite entre arte e poluição visual é praticamente nulo. O segmento “Contrapensamento selvagem” consegue a proeza de ser uma exposição de pixo, sem que qualquer um de seus integrantes seja de fato um pichador. Ou uma mostra de indomáveis, sem que os artistas estejam necessariamente à margem do sistema. As telas expostas de Martins de Melo, por exemplo, estão nas coleções de José Olympio Pereira e Gilberto Chateaubriand. Caos controlado? Pode ser, mas poucas vezes uma exposição conseguiu tamanha eficiência em mostrar a arte como fator libertário e espontâneo.
Subindo as escadas, no primeiro subsolo, o curador Moacir dos Anjos selecionou obras que traduzem o espírito das ruas. Entram nesse grupo uma instalação de Marepe com garrafas de aguardente e pneus e “Atrás da porta”, de Rivane Neuenschwander, uma coleção de desenhos obscenos de portas de banheiros transferidos para silk screen sobre quadros de madeira. Mas foto de capoeira não é capoeira. E, quando a rua é levada para dentro do museu, lamentavelmente seu espírito fica enquadrado pela moldura institucional.
No mezanino, a curadoria de Tadeu Chiareli salienta justamente a arte e seus esquemas de representação do mundo. Com obras de artistas como Rosângela Rennó, Lais Myrrha, Paulo Nazareth e Felipe Cama, que investigam temas como memória e imagem como construção da história, esse é o segmento mais documental da mostra – um viés bastante central, se pensarmos o impulso arquivista que domina a arte contemporânea desde os anos 1990.
Completam esse panorama da curadoria brasileira – com os cinco curadores mais ativos dos anos 2000 – as mostras de Fernando Cocchiarale e de Lauro Cavalcanti. Este último, em sua tentativa de organizar o conceito de brasilidade e de nacionalidade dentro do circuito da arte, acaba apontando para uma vocação que “Caos e efeito” tem como um todo. Os três andares de exposição e as cinco curadorias, afinal, funcionam como um belíssimo panorama prospectivo da arte brasileira. Poderiam perfeitamente estar hoje no Museu de Arte Moderna no lugar de “Itinerários, itinerâncias”.