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novembro 7, 2011
Febre por neoconcretos provoca hipervalorização em cascata por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Febre por neoconcretos provoca hipervalorização em cascata
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 7 de novembro de 2011.
Alta de preços por procura de coleções estrangeiras deixa lacunas em instituições de arte do país
Escassez de trabalhos estrelados leva a busca por obras de artistas menos famosos, como Ivan Serpa e Barsotti
Se é verdade que o Brasil está na moda, há um consenso de que a peça-chave desse desfile é o neoconcretismo.
Enquanto a maior galeria de arte do mundo, a Gagosian, faz agora uma exposição com obras do movimento em sua filial parisiense, a galeria Dickinson, em Nova York, abriu uma mostra com peças que aumentam a febre em torno desse estilo, como os "Bichos", de Lygia Clark (leia nesta página).
Em 2014, a 13 quadras dessa galeria, o MoMA abre a maior mostra retrospectiva da história dedicada a Clark, musa do neoconcretismo.
Sozinha, a exposição deve elevar ainda mais os preços já vultosos de suas obras.
"É uma questão de gosto e moda", disse Maria Bonta de la Pezuela, chefe do departamento de arte latino-americana da Sotheby's, à Folha. "Abstração geométrica é o estilo quente no momento, que excita todos os colecionadores, não só os latinos."
ESCASSEZ E ALTA
Essa demanda sem precedentes por obras de um período que teve seu auge na virada dos anos 50 para os 60 e cujos maiores expoentes já morreram têm dois efeitos sobre o mercado: alta exponencial dos preços e uma escassez jamais vista de obras de artistas como Lygia Clark, Lygia Pape e Hélio Oiticica.
"Isso vai causar mais dificuldades para comprar", afirma Jones Bergamin, dono da Bolsa de Arte, uma das maiores casas de leilão do país. "É dificílimo achar uma boa Lygia Clark ou uma Lygia Pape. Quando aparecem, custam mais de US$ 1 milhão."
Mas, embora esses valores tenham quase quadruplicado nos últimos anos, esse é um movimento que vem se consolidando ao longo das duas últimas décadas.
De certa forma, a onda começou quando o curador brasileiro Paulo Herkenhoff trabalhou no departamento de pintura e escultura do MoMA, na década de 1990, e colecionadores poderosos como Patricia de Cisneros começaram a olhar mais para a produção artística do país.
Outro ponto crítico nessa história foi a compra da coleção de Adolpho Leirner pelo Museum of Fine Arts de Houston, há cinco anos -motivo de polêmica na época pela saída em massa do país de um conjunto de obras da era mais fértil da arte nacional.
Enquanto museus de fora compraram o que podiam com preços ainda acessíveis, instituições do país ficaram com lacunas em seus acervos.
No caso do Masp, é um "sonho distante", nas palavras do curador Teixeira Coelho, ampliar a coleção de arte construtivista. "Em vários museus, a situação está cada vez mais difícil", afirma ele.
No Brazil Golden Art, maior fundo de investimento em arte no país, com R$ 40 milhões, os neoconcretos, raros demais, ficaram de fora.
Mais uma consequência é a hipervalorização de um segundo time de concretistas que ainda não atingiram o estrelato global. Aluísio Carvão, Hércules Barsotti e Ivan Serpa, entre outros, vivem um momento de plena e sustentada ascensão no mercado.
"Eles têm a mesma qualidade, o mesmo conceito e são da mesma época, então isso vem a reboque", diz o marchand Max Perlingeiro, da Pinakotheke Cultural, no Rio. "Hoje a geometria impera."