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setembro 15, 2011
Cinema transcendental por Paula Alzugaray, Istoé
Cinema transcendental
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno Artes Visuais da revista Istoé em 2 de setembro de 2011.
Meditação, transe / Mendes Wood, SP/ até 24/9
A cineasta Maya Deren dá uma aula sobre como filmar a performance em “Meditation on Violence”. Como dar conta da complexidade da coreografia em um tempo em que as câmeras eram pesadas e de difícil mobilidade? Maya (1917–1961) filmou os lutadores de artes marciais Wu-tang e Shaolin em 1945, na época em que se dedicava a documentar rituais mágicos. O efeito hipnótico produzido pela lente da artista funciona como introdução perfeita à mostra “Meditação, Transe”, em cartaz na Mendes Wood.
E se o comediante perdesse o contato com a realidade no instante em que pisa no palco?
E se em vez de contar piada, começasse um espetáculo de acessos e convulsões? É o que propõe o nova-iorquino Ryan McNamara no vídeo “The Latest in Blood and Guts” (2009). De Maya Deren a Ryan McNamara, a mostra integra clássicos e contemporâneos.
Na primeira sala, Maya está acompanhada por trabalhos de artistas contemporâneos brasileiros como Rivane Neuenschwander e Deyson Gilbert, que na escultura “Economia do Transe” (2011) orquestra o equilíbrio frágil entre cinco objetos – um deles, perecível: um cubo de gelo que derrete ao longo dia, colocando a obra em movimento e desintegrando-a. A dança dos lutadores de Maya e dos objetos de Gilbert também reverbera na performance giratória do autraliano Shaun Gladwell, em “Pataphysical Man” (2005). Situada no contexto dessa exposição, a street dance de Gladwell ganha a dimensão de um ritual sagrado dervixe.
Arte, performance e antropologia estão entrelaçados em “Meditação, Transe”. Da entidade Egum, retratada por Pierre Verger, até a performance primitivista do artista americano Kim Jones – alter ego Mudman (Homem-Lama)– e o vídeo “Changing Parts” (1984), de Mona Hatoum, há alguns litros de lama em comum.
Esse é o mérito da mostra com curadoria de Marcio Harum e Pedro Mendes: permitir um fluxo de trocas e invasões de um trabalho a outro. Nesse sentido, ao diluir as fronteiras entre obras, a curadoria se mostra eficiente e sintonizada com seu tema de abordagem: os estados alterados de percepção. A curadoria também surpreende pela escolha de nomes pouco habituais ao circuito de exposições no Brasil, como
o holandês Bas Jan Ader. Conhecido nos anos 1970 por suas performances corporais minimalistas, Ader foi visto pela última vez em 1975, quando subiu no menor barco que jamais teria cruzado o Oceano Atlântico. Na Mendes Wood, Ader é mostrado em uma projeção discreta, quase escondida. Talvez uma homenagem silenciosa ao seu desaparecimento.