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agosto 8, 2011
Iluminar a paisagem por Nina Gazire, Istoé
Iluminar a paisagem
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno de Cultura da revista Istoé em 29 de julho de 2011.
ESTELA SOKOL - A Morte das Ofélias / Anita Schwartz Galeria de Arte, RJ / até 8/10
Segundo o filósofo Pitágoras, a realidade e seus fenômenos físicos como luz, matéria e som podem ser manipulados harmonicamente e em consonância pela geometria e a matemática. A obra da artista paulistana Estela Sokol faz a ponte entre esse conhecimento naturalista e a escola Suprematista, movimento artístico russo centrado em formas geométricas básicas. Na maioria de seus trabalhos, a essência das formas é atingida não só pela geometria, mas também pela latência da cor. “Esta busca pela materialidade da cor e da luz está em quase todos os meus trabalhos. A ideia é criar campos físicos partindo de elementos supostamente invisíveis, porém decisivos: a irradiação do objeto e sua apropriação do entorno”, diz Estela.
Essa junção entre uma geometria milenar e a intenção pictórica se dá especialmente na sua nova série de intervenções em espaços naturais, realizadas durante uma residência artística na Áustria. A artista posicionou, na paisagem dos Alpes austríacos, objetos geométricos de cores fosforescentes. O registro dessas ações resultou em duas séries de fotografias: “Secret Forest” e “Polarlicht”, presentes em sua individual “A Morte das Ofélias”, no Rio. Exemplo dessa orquestração é “Voo” (foto), parte da série “Polarlicht”. Neste trabalho, Estela sincroniza forma e luminosidade de um triângulo pousado no gelo com as formas orgânicas das montanhas ao fundo. “Os trabalhos da série Polarlicht foram pensados para espaços naturalmente luminosos. A ideia foi explorar a relação com a luz natural. Dessa forma, o gelo e a neve passam a ser parte das obras, como materiais escultóricos essenciais e proponentes da refração da cor e da luz”, diz a artista, que na mesma exposição apresenta a obra “Ofélia”, fazendo uma referência ao personagem shakespeareano retratado por diferentes pintores ao longo da história da arte.
Entrevista com a artista Estela Sokol
Qual é o conceito por detrás da série “Secret Forest” e “Polarlicth”? Como se deu a escolha dos lugares onde as intervenções foram feitas?
Em muitos de meus trabalhos (relevos, esculturas e instalações) tenho pesquisado questões relacionadas à refração da cor e da luz. Para tanto, sempre tive muita preocupação com a escolha dos espaços expositivos, procurando lugares brancos, claros, próximos a janelas, clarabóias – ambientes que proporcionam a vibração e a refração da cor-luz. A fim de dar continuidade a esta pesquisa, surgiram estes trabalhos, assim como os trabalhos da série “Polarlicht”, realizada na mesma época nos Alpes austríacos, pensada para espaços naturalmente luminosos. A idéia foi explorar a relação com a luz natural e seu embate direto sobre os trabalhos. A refração se dá a partir do rebatimento de cor e de luz e esta potencializa a tridimensionalidade da cor-luz. Gelo e neve passam a ser elementos constitutivos das obras, como materiais escultóricos essenciais e proponentes da refração da cor e da luz. Assim, a intenção é que estes campos expandidos de cor sejam resultados de uma relação direta com a natureza da upper Áustria. A superfície de gelo e neve, os tons soturnos das florestas e bosques, as diferentes luminosidades dos dias geram um embate com as bolas de látex, com as placas de acrílico enterradas ou apoiadas nas superfícies nevadas projetando cor e luz sobre a superfície alva.
Você parece querer dar uma materialidade a luz e a cor na série Ofélias? Como isso se deu?
Na verdade eu diária que esta busca pela materialidade da cor e da luz esta presente em quase todos os meus trabalhos. A idéia é criar campos físicos partindo de elementos supostamente invisíveis, porém decisivos: o irradiar-se do objeto e sua apropriação do entorno, investindo-lhe de outra corporeidade escultórica que é evidenciada pela expansão da cor. Dessa forma, a mesma passa a ser parte do volume da obra.
Você apresentou esses trabalhos em uma mostra anterior em Londres. Existe alguma diferença na curadoria e apresentação dos trabalhos nesta exposição brasileira?
A montagem da mostra em Londres fez referencia a minha então última exposição “Clarabóia”, realizada no Paço das Artes entre novembro de 2010 a janeiro de 2011. Nesta exposição a montagem evocava uma relação com “O Habitat Natural das Obras”_ texto que a crítica Paula Braga escreveu na ocasião da exposição_ o atelier “X” e a estética museográfica moderna, como por exemplo, a exposição de obras suprematistas “0-10” de 1915. A montagem de a “A Morte Das Ofélias” pretende dar continuidade a este diálogo, mas, diferentemente das mostras “Secret Forest”, Londres e “Clarabóia”. Todos os trabalhos apresentados na grande sala terão, escala institucional.
Como a figura da Ofélia de Shakespeare aparece nestes trabalhos abstratos? Como essa figura literária foi transformada em conceito nestes trabalhos?
Minha intenção não foi transformar a figura literária em conceito, mas sim evocá-la para adensar um diálogo com a tradição da pintura, na qual a Ofélia de Shakespeare foi retratada por diferentes pintores como Millais, Delacroix e outros. No entanto, para além das possíveis relações pictóricas, a escolha da Ofélia de Shakespeare se deu também para falar da beleza congelada pela morte da princesa suicida. Por esta luminosidade simultaneamente soturna e radiante.