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junho 30, 2011
A arte da interação por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
A arte da interação
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 30 de junho de 2011.
'Rumos Cibernética' apresenta obras que conjugam tecnologia e poética
Não foi de propósito, mas o júri do edital Rumos Arte Cibernética, do Itaú Cultural, selecionou na última edição do programa, de 2009, apenas criações de artistas jovens. "Existe uma demanda muito grande nesse segmento", diz Marcos Cuzziol, gerente do Itaulab, núcleo de arte cibernética da instituição. As obras escolhidas no edital foram produzidas pelo Itaú - sendo três prêmios para trabalhos de até R$ 50 mil e cinco de até R$ 25 mil - e agora são apresentadas para o público em mostra que ocupa todo o prédio do instituto, na Avenida Paulista. Além das oito criações inéditas, duas, do edital de 2006, também foram incorporadas à exposição.
É a interatividade que permeia a mostra deste Rumos, com obras que misturam tecnologia e poética. "Cibernética trata de interação entre agentes, que podem ser máquinas, softwares, sistemas ou pessoas", explica Cuzziol, exemplificando ainda que até uma peça de teatro pode ser considerada "cibernética".
Por três andares do Itaú Cultural, as dez instalações, todas de brasileiros, são diversificadas, mas, curiosamente, algumas características destacam-se na exposição, como a recorrência do som em muitos trabalhos; criações com robótica, o que Cuzziol acha interessante em se tratando do Brasil; e "uma tendência de trabalhar entre o real e o virtual". Um seminário ocorre paralelamente à exposição.
Pista de dança. A complexidade cibernética, muitas vezes, é algo mais dos bastidores do processo de criação de obras que se utilizam da tecnologia. Quando o visitante da exposição chega a uma instalação como Idance, do curitibano Leandro Trindade, basta a ele, literalmente, apenas se movimentar - ou dançar, se quiser. É uma obra que Cuzziol acredita ter, até mesmo, um potencial "mercadológico" - um software cria imagens e sons ao reagir com as pessoas, "diferente do trabalho de DJ".
O movimento também é o gatilho da obra 12i - A Roda da Vida, do paulistano Marcio Ambrosio. Em uma homenagem ao zootrópio, máquina circular criada no século 19 na qual desenhos giram ganhando vida, o trabalho contemporâneo de Ambrosio pede que o espectador crie animações com 12 imagens.
Ainda no segmento do jogo, Campo Minado, do paulistano Claudio Bueno, é "game-performance" que ocorre diariamente (exceto, às segundas-feiras), das 11 às 15 h, na Praça Alexandre de Gusmão, na região do Trianon. Por meio de celulares, os "jogadores" são orientados por um mapa a caminhar em uma área repleta de "minas" virtuais. "É um trabalho de ocupação de espaços públicos sem grande estrutura física", comenta Bueno, que se utilizou de ferramentas do Google Maps e do GPS, por exemplo, para criar a obra. "É crítico, porque trata de desvios de caminhos e tem um dado poético também, porque fala do imponderável", continua o artista, que recebeu menção honrosa do prêmio Ars Eletronica. O jogo é exibido em tempo real no Itaú.
Mas a interatividade pode ser suave também ou apenas contemplada (porque ocorre entre sistemas ou máquinas). É o caso dos trabalhos Reações Visuais, do mineiro Leandro Araujo - o ruído captado da esquina da Paulista com a Rua Leôncio de Carvalho faz reconstituir em imagem uma paisagem da mata atlântica; ou RePartitura, que Mariana Shellard criou com o músico José Fornari - desenhos ganham representação sonora. No campo da robótica, Alexandre da Silva Simões criou I, Hamlet, humanoide que interpreta Shakespeare a partir de estímulos dos visitantes, e Amigoide, do coletivo CAYCE POLLARD - um robô cilíndrico "carente" que tenta se relacionar com os espectadores.