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junho 29, 2011
Sétima temporada do projeto Multiplicidade, que começa nesta quarta-feira, leva a interatividade ao extremo por Carlos Albuquerque, O Globo
Sétima temporada do projeto Multiplicidade, que começa nesta quarta-feira, leva a interatividade ao extremo
Matéria de Carlos Albuquerque originalmente publicada no caderno de cultura do jornal O Globo em 29 de junho de 2011.
Vai começar de forma chocante a nova temporada do Multiplicidade. Há sete anos unindo imagens e sons, de forma inusitada e sob as bênçãos da tecnologia, o projeto inicia 2011, nesta quarta-feira, no Oi Futuro Flamengo, com uma apresentação conjunta do americano Zach Lieberman - que altera sinais de vídeo em tempo real, com sua instalação "Drawn" - e o japonês Daito Manabe - que cria sons a partir das suas expressões faciais, com o projeto "Electric stimulus".
- Imagine que você faz uma pintura, e a tinta ganha vida - explica Lieberman. - É mais ou menos assim.
VÍDEO: Veja 'Eletric viral', de Daito
Por sua vez, como o nome "Electric stimulus" indica, Daito, um dos destaques do último festival Sonar, realizado há duas semanas em Barcelona, recebe estímulos elétricos - em média, 96 mil volts a cada apresentação. Tudo em nome da arte. Da arte avançada.
- Faço isso há algum tempo e já estou acostumado com os choques - garante o artista japonês, que iniciou o projeto em 2009. - Mas para outras pessoas isso pode ser realmente incômodo.
Idealizador e curador do Multiplicidade, Batman Zavareze reconhece que ficou impressionado com a performance superplugada do japonês.
- Fiz as contas com o nosso chefe eletricista e chegamos a esse número, que é impressionante. Mas tudo é feito com muito cuidado, claro, para não ultrapassar esse limite. É um trabalho de grande impacto, que deve se casar perfeitamente com as coisas que o Zach faz. Digo isso porque é a primeira vez que eles se apresentam juntos nesse formato e ninguém sabe o que pode acontecer. Só sabemos que os dois se complementam.
O "deve" da frase de Batman e suas dúvidas dizem muito sobre o sucesso do Multiplicidade. Desde o começo, o projeto se desenvolveu cruzando música e imagens, mas longe de lugares-comuns ("Só não vale projetar em tela branca", diz o curador), procurando sempre as zonas de risco.
Foram assim as 70 apresentações nesses seis anos de Multiplicidade, unindo músicos como João Donato, Arnaldo Antunes, Fausto Fawcett, Diplo, DJ Spooky e Cinematic Orchestra e artistas visuais como Muti Randolph, Gualter Pupo, Arterial, Breno Pineschi Peter Greenaway.
- Tentamos sempre instigar o artista, oferecer condições para que ele vá ao seu extremo e faça coisas inéditas - explica Batman. - E isso também tem sido uma forma de nos reinventarmos a cada temporada.
Nessa busca de novos formatos para o projeto, num momento em que a tecnologia se populariza e seu uso se aproxima perigosamente da banalização, a interatividade é a palavra-chave do Multiplicidade 2011.
- Uma marca dessa nova geração digital e dos artistas que vamos trazer este ano é a total interação, é a troca de informação, o compartilhamento completo de conhecimento - garante Batman. - Tanto o Zach como o Daito são perfeitos exemplos disso. Eles têm um profundo conhecimento em suas áreas, mas atuam em grupo, cada um trazendo o seu saber, convergindo para um produto final. Isso dá a eles um potencial incrível.
No projeto, que terá cinco edições este ano (em vez das dez de 2010), a interatividade começa no camarim, que é minimamente abastecido, forçando os artistas a sair da toca e fazer contato com o público.
- Isso também tem sido uma marca do Multiplicidade: o camarim praticamente pelado - brinca o curador. - É uma forma de quebrarmos os vícios do show business e fazermos com que os artistas saiam da clausura e se misturem com o público. No final, todos acabam adorando essa interação.
Depois de Zack Lieberman e Daito Manabe, as próximas atrações são: o coletivo carioca Moleculagem (dia 28 de julho), o músico e produtor inglês Scanner (18 de agosto), que tem Björk como fã; e a dupla Lise + L-Ar, com seu projeto Reações Visuais (29 de setembro), além de uma semana inteira de ocupação do Oi Futuro Flamengo, com ações que vão de projeções de filmes a performances (de 27 de outubro a 3 de novembro).
Mas o extremo da interação e o namoro com um formato que Batman chama de "analógico" devem acontecer na última apresentação do ano, nos dias 24 e 27 de novembro. É o inusitado projeto Cavalo. Idealizado pelo músico e artista plástico Cadu, o projeto colaborativo inclui a performance de uma banda ("Chamamos de Orquestra Equestre de Libertação") com os sons obtidos através de microfones colados no corpo de um cavalo. Depois do show, o animal ficará a postos numa charrete, para quem quiser fazer um estranho passeio pela área em torno do Oi Futuro Flamengo.
- Já testamos esse projeto ano passado, mas nunca fizemos algo nessa dimensão - conta Cadu. - Vamos ter caixas de som na charrete, amplificando os sons do animal. É uma coisa muito fora do normal. Ninguém sabe direito o que vai acontecer. Mas acho que a graça é essa.