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março 31, 2011
A Colômbia logo ali por Júlia Lopes, O Povo
A Colômbia logo ali
Matéria de Júlia Lopes originalmente publicada no caderno Vida & Arte do jornal O Povo em 31 de março de 2011.
Novo espaço na Cidade, Dança no Andar de Cima abre hoje com lançamento da exposição Mirador. Nela, vídeos de artistas contemporâneos da Colômbia, trazendo temas como violência e guerrilha, família e memória
Não deixe que a violência se torne banal: não se acostume. Nem Aquela que acontece no nosso espaço, nem a qualquer outra. “Todos os trabalhos têm a urgência de se apresentar, de mostrar um pedaço do realizador, aproximar a realidade colombiana. Ser sempre uma possibilidade de você tomar um susto”, descreve a artista visual cearense Simone Barreto sobre a exposição Mirador, que tem lançamento marcado para hoje, às 19 horas, e está sob sua curadoria. Nela, vídeos de artistas colombianos ocupam uma das salas do (também novo) espaço cultural que chama Dança no Andar de Cima.
Simone fez uma residência de três meses na Colômbia no ano passado, quando conheceu esses artistas em três cidades diferentes: Cali, Bogotá e Medellín. Foram eles as primeiras escolhas, as obras vieram depois: “Muitos dos vídeos ainda estavam em processo quando conheci e decidi pelos artistas”. Agora, com todos os trabalhos finalizados, Simone identificou alguns temas recorrentes, como a dita violência, muito presente na realidade colombiana – drogas e guerrilhas, aliás, também configuram nos trabalhos. “Com esses trabalhos, eles tiram uma poeirinha da frente, deixam claro o que está no cotidiano deles”, detalha Simone.
Dentre eles, Edwin Sanchez. Funcionário da Polícia de Bogotá durante um ano, Edwin fez espalhar pela selva, do alto de um helicóptero, cédulas de peso, produzidas por ele, com fotos de procurados. Por sobre os supostos acampamentos, essas notas voavam e esperavam encontrar seu destino. Edwin também fez imagens e se apropriou de algumas delas que a Polícia produziu. “Foi um processo delicado, que levou um ano de negociação para a realização”, conta a curadora. No vídeo Desapariciones, desenhos de homens que foram presos e estão em processo de readaptação (a partir de um programa de Governo) revelam assassinatos, execuções, terrorismo e mutilação de corpos.
Edwin estará em Fortaleza, dia primeiro, falando sobre seu processo de criação (às 19 horas). Além dele, Daniel Santiago Salguero, Lina Rodriguez, David Escobar, Jim Fannkugen Salas, Guillermo Marin Rico e Wilson Diaz participam da mostra. Entre os vídeos, o de Salguero, em que gestos mínimos, suaves, como os dedos entre os cabelos, uma canção de amor, um sorriso de bebê. Ou o de Lina Rodriguez e Davi Escobar, um processo inacabado, talvez frustrado, de um vídeo com Victor, garçom que queria ser ator. Lina e Davi propuseram a Victor um projeto em que ele seria o diretor. Não deu certo, e o vídeo apresentado é uma mostra da “impossibilidade de juntar os intempestivos desejos de Victor com todo o método e técnica de Davi e Lina”.
No andar de cima
A casa de um pavimento só, numa faixa delicada – perto da Via Expressa, no começo da Aldeota – se propõe a ir além da exposição Mirador. Nela, outros amigos ocupam um dos seis quartos do Dança no Andar de Cima. “Cada cômodo vai ser ocupado por um artista ou uma dupla, no nosso cotidiano. Tem um estúdio de música, de design e um ateliê propriamente dito”, explica Simone.
SERVIÇO
EXPOSIÇÃO MIRADOR
Onde: Dança no Andar de Cima (rua Desembargador Leite Albuquerque, 1523A - Aldeota)
Quando: Hoje, às 19h. Visitação gratuita de 1º a 14 de abril, no período de 14h às 20h. A programação inclui ainda palestras e debates.
SAIBA MAIS
Um ônibus vai sair do Centro Cultural Banco do Nordeste (rua Floriano Peixoto, 941 - Centro) para levar o público até o endereço da mostra. Para mais informações: 3464 3108.
Dia 2, sábado, acontece a exibição do 7º Festival de Performance de Cali . Na segunda-feira, dia 4, acontece o debate sobre Imagem em Questão, na terça, 5, é a vez de Apresentação e Representação e na quarta, 6, conversa sobre Participação e Poética. De 2 a 6 de abril, a partir das 19 horas, a programação tem início com a exibição da série documental Lo URGENTE!.
IMPRESSÕES
Cali é como qualquer cidade média de um país do terceiro mundo. Seus achaques são quase os mesmos de Fortaleza que está no Brasil, mas Cali está na Colômbia e é a terceira maior cidade. A primeira é Bogotá: um bloco cinza, alto, no centro do país, incrustada na cordilheira oriental. A segunda é Medellín que até os anos novena viveu com Cali um violento embate: a sangrenta disputa entre o Cartel de Cali e o Cartel de Medellín. Toda a violência em nome de cultivos, mercado consumidor de drogas, terra, ideologias e dinheiro. A cidade como qualquer outra tem rotas proibidas. Partes do desenho do mapa são inacessíveis, não se pode percorrer, pois são ocupados por alguns grupos específicos.
Fonte: Texto de Simone Barreto