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fevereiro 21, 2011
Bienal vai homenagear Bispo do Rosário por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Bienal vai homenagear Bispo do Rosário
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 19 de fevereiro de 2011.
Luiz Pérez-Oramas, curador do evento de 2012 em SP, pretende evidenciar artista, que foi interno de hospital psiquiátrico
Venezuelano também quer diminuir número de participantes e ter mais trabalhos pensados para a mostra
Arthur Bispo do Rosário (1911-1989), marinheiro que foi interno de um hospital psiquiátrico e nunca produziu obras para o circuito das artes, será um dos artistas centrais da 30ª Bienal de São Paulo, em 2012, adiantou à Folha, anteontem, o curador Luis Pérez-Oramas.
"O que me interessa no Bispo do Rosário é que ele foi uma figura periférica, cuja obra está centrada na invenção da linguagem", disse Oramas, no café do Circullo de Bellas Artes, em Madri. Para ele, uma das questões centrais de sua Bienal será discutir os limites da arte.
"Retorno das poéticas" é o "motivo aglutinador" da Bienal paulista: "Eu sou poeta e gosto de poesia, mas por poética estou me referindo à capacidade retórica da arte".
Ao abordar o caráter discursivo da arte e seus limites, Oramas vai questionar uma das tendências importantes dos anos 1960 e 1970, liderados por Lygia Clark (1920-1988) e Hélio Oiticica (1937-1980). "Se formos observar, a Lygia, com suas propostas, chegou de fato ao fim da arte. Agora, é preciso revisar a ideia da arte, que não é um instrumento de emancipação, apesar de poder ajudar", diz Oramas.
Segundo o curador, um dos problemas da produção atual é que, ao se aproximar da vida, a arte "tem se afirmado mais como comentário da realidade, da sociedade e por isso não se questiona mais como discurso".
Com isso, a Bienal entra num velho debate, que se renova permanentemente, sobre a autonomia da arte, no modernismo, e seus desdobramentos no contemporâneo, para alguns chamado de pós-moderno, outros hipermoderno e mesmo altermoderno. "É preciso tomar cuidado com conceitos messiânicos", alerta o curador.
Outros artistas importantes na conceituação da mostra são o alemão Hans-Peter Feldmann, que atualmente está em exposição no museu espanhol Reina Sofia, e o brasileiro Waldemar Cordeiro (1925-1973). "Ele é um bom exemplo para pensar limites, pois vai do meio artístico para a informática", afirma.
CAMPO EXPANDIDO
Entre seus planos, o curador pretende reduzir pela metade, em relação à última edição, o número de artistas no pavilhão, chegando a cerca de 80. "Mas queremos ter muitas obras feitas especialmente para a mostra", conta. Espacialmente, o curador planeja que entre 12 e 15 dessas novas obras sejam de grande porte.
Oramas também reserva à arte latino-americana papel importante na mostra: "Devemos dar lugar a artistas latinos importantes que não tiveram ainda a atenção merecida, mas não penso em termos quantitativos". O curador refere-se à última edição que, entre seus 159 artistas, tinha 45% de latinos.
Até setembro, Oramas pretende apresentar a lista de artistas. Assim como vem ocorrendo desde 2006, ele planeja estender a Bienal no tempo, com debates durante todo o ano de 2012.
"Como grande parte dos trabalhos será comissionado, poderemos organizar encontros com os artistas."
A 30ª Bienal também deve ocorrer de forma mais sistemática fora do pavilhão.
"Uma das perguntas que queremos fazer é qual a tensão da obra com seu entorno e, por isso, será muito importante que tenhamos trabalhos em museus da cidade, pois a Bienal, por seu caráter específico, pode muita coisa que eles não podem."
Agora, experiente, o curador sabe que tem pela frente um grande desafio: "Aqui no Bellas Artes tudo soa bonito", brinca.
Gostei das propostas de Pérez-Oramas, especialmente a redução do número de artistas, o que, em tese, possibilitará um aprofundamento maior por parte do público nas poéticas dos artistas selecionados (diferentemente do que ocorre na maior parte das megaexposições do tipo "bienais"...).
No entanto, discordo dele quando afirma que a arte "não é um instrumento de emancipação, apesar de poder ajudar". Se a arte não fosse umas das formas mais privilegiadas de emancipação do sujeito, a Filosofia Contemporânea, bem como diversos outros importantes saberes humanos, não se interessariam tanto por ela. O caráter crítico - e mesmo o poético -, da arte são ferramentas de elevada importância na ativação da consciência e alargamento da capacidade perceptiva, vetores essenciais em qualquer processo emancipatório.