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novembro 23, 2010
O bom anfitrião por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 19 de novembro de 2010
Museu do escultor russo Zadkine, em Paris, recebe a visita do artista brasileiro Julio Villani
O escultor russo Ossip Zadkine migrou para Paris em 1910 e, com tantos outros estrangeiros que se instalaram na França nas primeiras décadas do século 20, integrou a Escola de Paris. A casa e o ateliê do artista no bairro de Montparnasse, convertidos em museu em 1982, hoje expõem um acervo de 400 esculturas, 300 desenhos e fotos de arquivo. Hospitaleiro e bom anfitrião, o museu iniciou em 1995 uma política de diálogo com a arte contemporânea e já recebeu exposições individuais da fotógrafa francesa Sophie Ristelhueber (que está expondo na 29ª Bienal de São Paulo) e da dupla brasileira Detanico e Lain. Até janeiro de 2011, recebe a visita do artista brasileiro Julio Villani, que expõe esculturas, objetos, colagens e vídeos realizados nos últimos dez anos.
O jardim e as cinco salas do charmoso museu reverberam uma sonora conversa entre Villani e Zadkine. Na primeira sala, originalmente o ateliê do artista, Villani expõe “Bilboquets ou L’origine du Monde” (2002). Emblemático, esse brinquedo agigantado cujo título se refere à pintura de Courbet “A Origem do Mundo” – devido ao caráter sexual das peças – representa o entrelaçamento entre as duas infâncias do artista: a vida passada na fazenda do interior de São Paulo e a história da arte modernista.
Infância e modernismo pontuam toda a exposição e aqui Villani assume as suas origens: do construtivismo russo ao minimalismo poético, passando pela arte popular brasileira e a escultura pré-colombiana. Os trânsitos de Villani evidenciam o nomadismo de Zadkine, que também se move entre influências primitivistas de uma antiguidade greco-latina até migrar para as fases cubista e surrealista.
Para além dos paralelismos entre os artistas, norte e sul se encontram nas duas cartas celestes da escultura “L’Arpenteur” (O esquadrinhador – 2010), instalada no jardim. Também entre as folhagens, “Partie de Cash Cash” (uma espécie de brincadeira de esconde-esconde) apresenta dois coelhos de alumínio, em branco e preto. Entre as coleções de pássaros e as cabeças de bichos que compõem a mostra, o coelho é a mais reincidente das figuras. Aparece inclusive em retratos e autorretratos nas paredes, talvez para representar o humor e a desenvoltura com que Villani salta entre uma influência e outra, relacionando-se seja com a máscara africana fotografada por Man Ray, seja com as fantasmagorias de Ismael Nery.
Todas as origens se encontram na última sala da exposição na “Vênus Antropofágica” (1988). Ao lado das vênus surrealistas de Zadkine, a boneca dadaísta de Villani tem o pescoço muito comprido, formado por dezenas de bonequinhos de plástico. “Esse pescoço é um engasgo antropofágico. Nós comemos, comemos de tudo, indiscriminadamente, e não conseguimos digerir tanta coisa”, diz Julio Villani.