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outubro 4, 2010
Bienal volta a ser epicentro das artes plásticas por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 2 de outubro de 2010.
Apesar de contradições entre obras, mostra reúne trabalhos excelentes
"Há sempre um copo de mar para um homem navegar." A 29ª Bienal de São Paulo revela-se uma mostra polifônica e aí reside sua força, e também sua fraqueza.
Em torno de arte e política -questão historicamente relevante, mas que sem um foco torna-se ampla demais- coexistem obras e propostas bastante diversas, com nexos difíceis de se compreender.
Numa exposição da dimensão do pavilhão da Bienal é compreensível que a curadoria, coordenada por Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos, opte por criar distintos eixos, mas podem-se constatar algumas contradições entre as obras, o que provoca enfraquecimento do tema.
Ocorre, por exemplo, na discrepância entre o que se pode chamar de artistas "históricos" e contemporâneos. As ações radicais, em sua maioria dos anos 60 e 70, dos argentinos Alberto Greco e do Grupo de Artistas de Vanguarda, de Paulo Bruscky, Lygia Pape e Hélio Oiticica, entre outros, reduz a produção atual, com algumas exceções, a um esteticismo pueril.
FORA DE CONTEXTO
Afinal, como se pode entender nesse contexto obras de artistas como Marcelo Silveira, David Cury ou Fernando Lindote, entre outros? Essa abrangência, por demais generosa, não só enfraquece o tema como põe em xeque a produção contemporânea, o que não parece ser a intenção dos curadores.
Contudo, essa Bienal, quando consegue realizar diálogos autênticos entre passado e presente, atesta sua pertinência.
Foi assim com leitura livre do "Bailado do Deus Morto", de Flávio de Carvalho, um dos artistas-chave da mostra, com 50 atores do Teatro Oficina, no último domingo.
Quando Zé Celso, que dirigiu a ação, vestiu uma versão do traje "New Look de Verão", de Carvalho, e esbravejou impropérios como metralhadora giratória, enquanto seu grupo movia-se praticamente desnudo, ele injetou um espírito anárquico e politicamente incorreto na Bienal, comportada demais.
Mas, felizmente, ele não é exceção e, graças à polifonia da mostra, há trabalhos excelentes e, por conta dos terreiros, especialmente os da performance, da literatura e do cinema, há uma energia vibrante no pavilhão.
Assim, apesar de conceitualmente a Bienal ser muito frágil, sua complexidade e diversidade compensam a falta de organicidade e tornam, novamente, o pavilhão da Bienal o epicentro do pensamento artístico no pais.