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setembro 22, 2010
Hora da virada por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010
Fundação paga contas, troca de sistema de gestão e arrecada quase o triplo da edição anterior da mostra
Nicholas Serota, diretor da Tate (Londres), e Carolyn Christov-Bakargiev, diretora da 13ª Documenta de Kassel (Alemanha), são os principais nomes de uma constelação de curadores, galeristas, críticos, colecionadores e artistas que hoje participam da inauguração para convidados da 29ª Bienal de São Paulo, que é aberta ao público no próximo sábado.
Após uma década de crises, a fundação recupera a imagem da Bienal e seu prestígio nacional e internacional. "Realmente passamos por uma retomada, e em vários sentidos. Da parte dos conselheiros, é a retomada do engajamento e da vontade de participar", diz Elizabeth Machado, presidente do conselho da instituição.
A ideia de retomada ganha sentido quando se tem em mente a edição passada, de 2008, apelidada de Bienal do Vazio, que semanas antes de abrir sofreu um corte no orçamento. Na época, o curador Ivo Mesquita afirmava que isso era comum, pois nas oito Bienais em que havia trabalhado havia um problema de "fluxo de caixa".
"Não temos problema de fluxo, a exposição está garantida", disse Emilio Kalil, diretor de produção da 29ª Bienal, orçada em R$ 30 milhões.
O responsável por essa transformação é o empresário Heitor Martins, eleito presidente no auge da crise que perdurava havia dez anos.
"Heitor reflete a mudança dos tempos e faz parte de um perfil de pessoas que usam seu nome para projetar a Bienal, e não o contrário", diz Andrea Matarazzo, atual secretário da Cultura do Estado e sobrinho-neto do fundador da Bienal, Ciccillo Matarazzo (1898-1977). Ele chegou a analisar as contas da Bienal, mas desistiu de se candidatar, "porque nas circunstâncias do momento era muito complicado".
Empossado em agosto do ano passado, em um mês Martins conseguiu R$ 4 milhões do Ministério da Cultura para reformar o prédio. As dívidas da Bienal anterior, estimadas em cerca de R$ 4 milhões, também foram saldadas. Em seis meses, o empresário reuniu R$ 26 milhões. A Prefeitura de São Paulo também cumpriu sua parte e, em dois anos, repassou R$ 4 milhões.
"A situação da Bienal era tão precária que, mesmo quando o MinC queria ajudar, não era possível, pois havia uma inviabilidade institucional de manter convênios. Mas essa crise estava relacionada a um modelo de empreendimento centralizado e, quando Edemar Cid Ferreira [do Banco Santos] faliu, a Bienal foi junto", diz Afonso Luz, assessor do Ministério da Cultura.
De fato, uma das razões do sucesso da gestão de Martins foi reforçar a instituição do ponto de vista operacional. "Percebemos que a Bienal estava esvaziada. Quase todos os serviços eram terceirizados. Então revertemos esse quadro", conta Martins.
Para o empresário, a Bienal do Vazio também ajudou na mudança: "Havia uma frustração muito grande, porque a sociedade não achava que a Bienal podia acabar. Quando chegamos com uma agenda positiva, houve um reconhecimento imediato".
Graças a esse processo, nos bastidores já se comenta que, independentemente da qualidade da mostra, esta edição já é ótima. Ou, como resume o artista Tunga: "Trata-se de um movimento das elites em tomar a rédea do que estava sem rédeas".