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setembro 10, 2010
Dias mostra arte, política e ironia na Pinacoteca por Marcos Augusto Gonçalves, Folha de S. Paulo
Matéria de Marcos Augusto Gonçalves originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 10 de setembro de 2010
Exposição reúne meia centena de trabalhos das décadas de 1960 e 70
Artista participou da exposição "Opinião 65", no MAM do Rio, antes de mudar-se para Europa, onde fez sua carreira
Um dos mais sólidos artistas contemporâneos brasileiros, Antonio Dias mostra a partir de amanhã, na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, meia centena de obras realizadas nas décadas de 1960 e 1970.
São desenhos, pinturas, vídeos e instalações de um período em que arte e política caminharam de braços dados. "É uma oportunidade para ter uma visão mais ampla de trabalhos que raramente são exibidos em conjunto, mesmo porque há poucos deles em museus brasileiros", diz o artista.
A idéia de reuni-los veio de Hans-Michael Herzog, curador da coleção Daros, fundação suíça que possui uma seção de obras latino-americanas, com sede no Rio.
Juntamente com a curadora Katrin Steffen, Herzog organizou a exposição, inaugurada em Zurich, em setembro do ano passado, com o título "Anywhere Is My Land" -o mesmo de uma pintura do artista realizada em 1968.
Nascido em Campina Grande, Paraíba, em 1944, Dias participou das experimentações estéticas da década de 60. Foi um dos artistas presentes na lendária "Opinião 65", mostra realizada no Museu de Arte Moderna do Rio, que marcou uma data na arte contemporânea do país.
Organizada pelo galerista Jean Boghici e pela jornalista e marchand Ceres Franco, a exposição reuniu brasileiros e europeus -e terminou uma referência da versão nacional da "nova figuração", com nomes como Carlos Vergara, Rubens Gerchman e Roberto Magalhães.
Dois trabalhos que participaram da "Opinião 65" poderão ser vistos na Pinacoteca -"Acidente no Jogo" (1964) e "Nota Sobre a Morte Imprevista" (1965).
Para Dias, as obras daquele período preservam uma certa "naievety" -"uma inocência de quem ainda não sabia dos jogos de mercado e coisas assim".
São trabalhos marcadamente gráficos, que refletem situações pessoais, eróticas, críticas -e discutem temas artísticos da época, como a idéia de "sair do quadro".
Um ano depois da mostra do MAM carioca, Dias trocou o Brasil por Paris, ponto inicial de uma trajetória que se desenvolveu, desde então, em países europeus, notadamente Itália e Alemanha.
A mudança de lugar refletiu-se na obra. Ao visitante da Pinacoteca não escapará a passagem. As cores fortes e as figuras desaparecem, dando lugar à palavra, com influência da poesia visual e concreta, e a um novo tipo de padrão gráfico.
"Houve naquele momento a perda da ingenuidade e do romantismo", avalia Dias, que vê nas suas criações da década de 70, das quais fazem parte a série "The Illustration of Art", uma atitude mais cética e irônica.
E é com uma ponta de ironia que ele se refere à "arte política" que se anuncia como um dos traços da próxima Bienal Internacional de São Paulo: "Se tiver um pouco de arte já será muito bom; e se não tiver política, não vai fazer falta nenhuma".