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julho 20, 2010
Arte em movimento por Camila Molina, Estadão.com.br
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno Cultura do Estadão.com.br em 20 de julho de 2010.
A relação com o cinema é forte vertente da 29.ª Bienal de São Paulo, que exibirá obras de Harun Farocki e Apichatpong Weerasethakul
SÃO PAULO - Alemão com ascendência checa, o artista e diretor de filmes Harun Farocki é celebrado como um dos criadores principais em atividade no cenário contemporâneo. Estava desde o início do ano na primeira lista de participantes da 29.ª Bienal de São Paulo, que será inaugurada em 25 de setembro para o público no Ibirapuera, integrando, assim, o forte time de criadores da mostra que trabalham na linha do audiovisual e as artes visuais de raiz cinematográfica - ao lado de outros como o português Pedro Costa, o tailandês Apichatpong Weerasethakul (leia mais na pág. 3) ou o inglês Steve McQueen, que transitam em suas obras sempre impactantes entre a grande tela e o cubo branco em instalações.
Sendo assim, é a imagem - a produção de filmes como "forma de pensamento", numa expressão do próprio Farocki - a grande questão de sua arte. Como ele diz na entrevista que concedeu ao Estado enquanto participava de programa cultural na África do Sul, sua preocupação maior é a discussão sobre "o status da arte digital". Na Bienal, nessa que será de fato sua primeira mostra no Brasil, Farocki vai exibir uma obra nova, a videoinstalação Serious Games, deste ano e ainda em produção. Ele traz mais uma vez a questão da guerra, propondo uma relação entre experiência e memória e utilizando animação computadorizada.
No ano passado, em uma palestra em São Paulo, a crítica de arte americana Rosalind Krauss o elogiou e afirmou que o sr. é um dos rebeldes da arte contemporânea ao lado de criadores como Ed Ruscha, William Kentridge, James Coleman, Sophie Calle e Marcel Broodthaers. Concorda com Rosalind Krauss?
Uma vez eu sonhei em ser um rebelde - hoje sou feliz de apenas fazer um trabalho que tem uma atualidade, de certa maneira. Uma obra que contribui para se refletir sobre questões urgentes, como: O que abastece as pessoas em nossas sociedades?
Considerando a ideia anterior, o sr. acredita que haja espaço na arte para continuar a ser radical hoje em dia?
Talvez esse rótulo não seja tão importante. Um artista pode ser radical apenas sendo um criador preciso. Ou abrindo um novo acesso para uma questão ou questionamento.
O que está planejando apresentar na 29ª Bienal de São Paulo? Considerou realizar um trabalho especial tendo como referência alguma questão relacionada ao Brasil ou a um tema especial?
Uma parte do trabalho que vou exibir na Bienal de São Paulo utiliza imagens digitais que preparam soldados para o "teatro da guerra". E há outra parte que se faz quase das mesmas imagens, só que interativas, criadas com animações computadorizadas, para propostas terapêuticas. De um lado se mostra para veteranos de guerra cenas do Afeganistão ou do Iraque com o objetivo de lembrá-los da experiência traumática que eles vivenciaram nos conflitos. Já produzi a obra e exibi uma parte desse projeto. Mas só mais tarde conseguirei completar as três faces da obra.
O que o sr. pensa do tema desta 29.ª Bienal de São Paulo, que propõe uma discussão sobre a relação entre arte e política?
Não posso julgar antes de ver a exposição. Por exemplo, não posso falar de um livro lendo apenas o seu título. Um título é o menos importante do que o conteúdo. Neste caso, o importante são os trabalhos e a maneira como eles comentam uns ao outros.
Qual seria então sua opinião sobre Bienais de Arte?
Nunca participei da Bienal de São Paulo. De uma maneira geral, as bienais podem ser comparadas a festivais de filmes. Elas atraem um público que geralmente não iria ao cinema num dia de semana.
O sr. tem algum interesse particular e especial hoje em dia que o motiva a trabalhar em suas obras? Há alguma questão que considera urgente dizer?
Quero discutir o status da imagem digital. Parece que a animação computadorizada logo será o padrão e substituirá a imagem fotográfica e cinematográfica.
O sr. faz uma separação de suas obras como diretor de cinema e como artista? Como lida com as duas formas de expressão? Acredita, enfim, ser mais experimental como artista ou como cineasta?
Tento não fazer diferença. Mas não posso negar que haja uma diferença. Para cinema ou televisão os códigos já são fixos. Os gêneros, definidos. No campo da arte as pessoas sabem que têm de encontrar um código. Então acredito que posso ser mais experimental no espaço da arte.
O sr. tem algum tipo de relação com o Brasil ou com a cultura brasileira? Está planejando vir a São Paulo?
Não há tempo! Irei apenas por dois dias. Adoraria fazer um projeto no Brasil onde nunca estive antes. Uma vergonha!