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junho 16, 2010
Três novos livros exploram obra de Iberê Camargo por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 15 de junho de 2010
Artista gaúcho é tema de volume introdutório e outro de ensaios, além de ter os próprios escritos editados
Novos textos críticos analisam técnica do pintor, sua obsessão pelos carretéis e seu marcante estilo literário
"Não há espaço para a alegria", escreveu o artista Iberê Camargo. "Toda grande obra tem raízes no sofrimento."
Mas a dele não era uma angústia homogênea. A obra deste pintor gaúcho, morto há 16 anos, está arquitetada sobre contrastes agudos, quente e frio, presente e passado, mergulho introspectivo contra a impetuosidade.
Três livros lançados agora pela Cosac Naify exploram a fundo o universo que estrutura a obra de um dos maiores pintores do país, conhecido por telas de gestual exacerbado, estética grotesca e a obsessão com que pintou os carretéis de costura da mãe.
Se no primeiro deles, "Iberê Camargo: Origem e Destino", a crítica Vera Beatriz Siqueira introduz a obra do artista, o segundo, "Gaveta dos Guardados", vai além, trazendo os escritos do pintor.
"Tríptico para Iberê", livro de ensaios, reúne estudos sobre a técnica do artista, a série dos carretéis e uma análise dos textos que escreveu.
Esse último livro é o que parece dar corpo às afirmações dos diários de Camargo.
DRAMA E ESTRUTURA
Enquanto ele confessa que "no andarilhar de pintor, fixo a imagem que se me apresenta agora e retorno às coisas que adormeceram na memória" e que a "pintura é um jogo entre quente e frio", Daniela Vicentini diz que a obra "acontece por contrastes".
"Ele é visto como um artista expressionista, dramático", diz Vicentini à Folha. "Minha contribuição é pensar que há uma estrutura."
Também por trás da memória afetiva, está a noção histórica de que a forma dos carretéis se relaciona com o geometrismo que tomava a arte brasileira da época.
No momento em que Hélio Oiticica inventou seus "Metaesquemas" e o neoconcretismo ganhava dimensões de vanguarda nacional, Camargo descambou para os carretéis, quase como maneira de apaziguar e conter as arestas de sua memória sofrida.
"Não há um ideal de beleza", escreveu o artista. "Mas o ideal de uma verdade pungente e sofrida que é minha vida, e tua vida, é nossa vida, nesse caminhar no mundo."