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maio 17, 2010
Cinemas do futuro por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 14 de maio de 2010
André Parente cria o Visorama e Giselle Beiguelman e Rafael Marchetti propõem o celular como nova tecnologia de visualização
Uma tela panorâmica de 9x4m descortina um mosaico de imagens tão diversas quanto o E.T. de Steven Spielberg; um tecido de roupa interativo; o Chacrinha; um teclado-vestível; um celular-bolsa; um aparelho de cinema portátil; uma coleira de cachorro com GPS. Quinhentas e cinquenta e cinco imagens compõem a obra “Telebits 2.0”, de Giselle Beiguelman e Rafael Marchetti, que faz um recorrido pela história das relações entre telecomunicação e cultura. Instalada na exposição “Tão Longe, Tão Perto”, realizada pela Fundação Telefonica, “Tele_bits 2.0” não tem a forma do que tradicionalmente conhecemos como uma obra audiovisual. Isto é, não consiste em uma projeção de imagens previamente editadas por um autor. Trata-se de uma projeção de dados, que serão organizados pelos visitantes por meio de telefones celulares com programas de leitura QR-Codes (códigos de barra lidos por celulares). O celular, em “Tele_bits 2.0”, corresponde a um novo instrumento de visualização. Da mesma forma, o Visorama, da instalação “Figuras na Paisagem”, de André Parente, em exposição até o final do mês no Oi Futuro, Rio de Janeiro, é um dispositivo de imersão do espectador na obra audiovisual. Ambos os trabalhos trazem respostas de artistas pesquisadores às indagações sobre o presente e o futuro do cinema, em seu encontro com as novas mídias digitais.
Para conceber o Visorama, o artista e pesquisador André Parente esteve nos últimos 12 anos envolvido em uma pesquisa científica similar à que levou os irmãos Lumière a criar, em 1898, uma câmera para fotografar panorâmicas e um sistema de projeções fotográficas em 360º. Esses primeiros sistemas fotográficos imersivos são a base conceitual do dispositivo de Parente, concebido no núcleo de tecnologia da imagem da Escola de Comunicação da UFRJ. O Visorama consiste em um software e em um aparelho de visionamento, que se parece com um binóculo. Nele, o espectador visualiza paisagens em 360º, que podem ser animadas a partir do acionamento de botões com três funções: rotações horizontais e verticais, zoom e saltos de imagem. Com esses recursos, Parente entrega ao usuário do aparelho as ferramentas de edição do filme, para a elaboração das narrativas de uma espécie de cinema ao vivo. “O dispositivo serve não apenas à arte. Pode ser usado em turismo histórico, em educação, em museologia, etc.”, aponta ele.
Em “Tele_bits 2.0”, o filme também é feito pelo espectador participante, que aponta o telefone celular para os códigos de barra, acionando imagens, vídeos e verbetes arquivados em um banco de dados no Flickr (site de compartilhamento de imagens). Trata-se, portanto, de um audiovisual “em camadas”, que acontece além da superfície da tela de projeção. Fruto de uma convergência de mídias, a obra poderia ser definida como “datacinema” ou “metacinema”. “Nenhuma das imagens foi captada por nós, todas foram trazidas da internet”, diz Giselle Beiguelman. “Este é o filme do ‘homem sem a câmera’”, diz ela, referindo-se ao clássico “O Homem com a Câmera”, de Dziga Vertov, 1929.
Se Vertov e Eisenstein pressentiram que uma nova sociedade exigia um novo tipo de visão, as recentes pesquisas com imagens, feitas com ou sem câmera, permitem compreensões múltiplas da realidade e são comparáveis ao grande período das experimentações com técnicas e linguagens do cinema.