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abril 10, 2010
Exposição ressalta potência visual de Ferrari e Schendel por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo
Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 09 de abril de 2010
Ao trazer à tona semelhanças e diferenças entre artistas, mostra apresenta organização complexa dos trabalhos
"O Alfabeto Enfurecido" é uma exposição provocativa. Ela apresenta dois artistas que formalmente possuem semelhanças: o argentino León Ferrari e a suíço-brasileira Mira Schendel, que nasceu em 1919 na Suíça e morreu no Brasil em 1988, após 40 anos no país.
Ambos, de fato, trabalham com letras e palavras inseridas em suas obras, mas, se ficasse apenas aí, essa seria apenas uma bela exposição, já que os dois são visualmente potentes.
Contudo, há uma ótima tese por trás dessas semelhanças: ao contrário dos artistas conceituais norte-americanos e europeus, que, nos anos 1960 e 1970, usavam letras e palavras apenas pelo conteúdo, os latino-americanos iam além disso, trabalhando com as letras também como construção visual.
Organizada por Luiz Pérez-Oramas, curador de arte latino-americana do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York), onde a exposição teve a primeira estação, no ano passado, a mostra, assim, procura levar a produção de Ferrari e Schendel a um novo patamar.
No catálogo da exposição, uma coedição do MoMA e da editora brasileira Cosac Naify, Pérez-Oramas chega a afirmar que os dois artistas nem sequer deveriam estar situados dentro do rótulo "arte conceitual".
Mas, pelo que se vê na mostra, tal afirmação chega a ser um tanto exagerada.
"O Alfabeto" ocupa dois pisos inteiros da Fundação Iberê Camargo, além do hall de entrada e de alguns dos polêmicos corredores vazios projetados por Álvaro Siza, o que cria uma nova dinâmica na instituição, já que esses espaços cortam as mostras de forma drástica.
Ao longo da exposição, fica claro que, se há semelhanças, há diferenças fundamentais também. Enquanto Ferrari tem uma militância anticlerical em suas obras, Schendel faz o oposto. Mas o fato de ambos serem obsessivos na construção de seus trabalhos, usando do acúmulo uma de suas estratégias, é outro ponto de aproximação visível na mostra, o que faz com que o formalismo da primeira vista seja superado pela complexidade de sua organização.