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abril 9, 2010
NY, Madri e Porto Alegre Por Fernanda Zaffari no Zero Hora
Matéria de Fernanda Zaffari originalmente publicada no Segundo Caderno do jornal Zero Hora em 09 de abril de 2010
Mostra de León Ferrari e Mira Schendel será aberta hoje na Fundação Iberê Camargo
Quem não viu em Nova York, no MoMA, e quem perdeu em Madri, no Reina Sofía, pode visitar a partir de amanhã, em Porto Alegre, na Fundação Iberê Camargo, O Alfabeto Enfurecido – mostra de León Ferrari e Mira Schendel. A exposição abre a temporada do terceiro ano do museu com as respeitáveis credenciais listadas acima – acrescente-se que esta é a primeira grande mostra do MoMA (Museu de Arte Moderna) no Brasil –, e o mais relevante: traz à Capital generosa representação. São 180 obras de dois artistas venerados entre os mais importantes da América Latina.
– É um momento muito importante trazer à cidade o trabalho de uma das maiores artistas brasileiras e um dos maiores artistas argentinos – diz Fábio Coutinho, superintendente cultural da Fundação Iberê. – Agora estamos nos inserindo no circuito internacional.
Expor a obra de León Ferrari, argentino que aos 90 anos continua produzindo em seu ateliê em Buenos Aires, e Mira Schendel, suíça-brasileira morta em 1988, envolveu negociações de mais de dois anos e a integração de uma equipe internacional: curador, museóloga e restaurador vindos de Nova York.
Mostrar em conjunto as retrospetivas dos artistas foi ideia do venezuelano Luis Pérez-Oramas, curador de arte latino-americana do MoMA.
– Tem sido uma experiência desafiante instalar a mostra na arquitetura de Siza (Alvaro Siza, português autor da Fundação Iberê). O edifício é concebido para sua própria contemplação e destinado a abrigar uma coleção de pinturas permanente – explicou Oramas.
O Alfabeto Enfurecido é apresentada de maneira cronológica pelo átrio, segundo e terceiro andares do museu, provocando que o visitante encontre as semelhanças de linguagem e temática entre os artistas. Ambos começaram nos anos 1950. León, formado em engenharia, produziu cerâmicas na Itália. Mira, recém-chegada ao Brasil vinda da Europa pós-Guerra, desembarcou em Porto Alegre, onde permaneceu de 1949 a 1953, e seus primeiros trabalhos são naturezas-mortas.
León e Mira moraram em São Paulo na mesma época. Mira mudou-se em busca de maior visibilidade e integração com outros artistas, e León chegou em 1976, como exilado político durante a ditadura argentina – regime que vitimou um dos seus três filhos.
– Fui muito bem recebido e fiz bons amigos artistas, como a Regina Silveira – relembrou o argentino, na segunda-feira, durante entrevista a ZH em seu ateliê em Buenos Aires. – Conheci Mira rapidamente, mas não posso dizer que tivemos contato.
O encontro ao qual León se refere é uma coletiva de 1980. A exposição a ser aberta traz obras referenciais, como a série de esculturas Droguinhas (1966), na qual Mira enlaça delicados pedaços de papel japonês em cordões, e as esculturas abstratas de Léon, ao exemplo de Torre de Babel (1964), feitas em arames de aço inoxidável soldados. Os escritos produzidos por ambos, ora legíveis ora em grafias inventadas e/ou deformadas (foto), demonstram o uso da linguagem mais como uma matéria visual do que como meio de comunicação. Entre os temas recorrentes de León e Mira, uma forte visão crítica de política e religião.
Duas publicações acompanham a mostra, a do catálogo do MoMA, que recebe edição em português, e a do catálogo da exposição na Capital, parceria de Cosac Naify, MoMA e Fundação Iberê. Hoje, às 18h, haverá debate com o curador e convidados. A entrada é franca.