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fevereiro 8, 2010
Visões de um anarquiteto por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na revista Istoé, em 05 de fevereiro de 2010
Primeira retrospectiva de Gordon Matta-Clark na América do Sul revela uma obra com consciência ecológica e soluções autossustentáveis
Quando Nova York vivia seu boom imobiliário e financeiro, fruto do crescimento econômico que consolidou os Estados Unidos como potência mundial, Gordon Matta-Clark (1943-1978) formava-se em arquitetura. Naquele final de década de 60, no entanto, o jovem arquiteto interessava-se menos por torres que escalavam os céus do que por estruturas abandonadas da periferia e por sistemas subterrâneos da cidade. Em vez de construir, seu projeto era “cortar” edifícios, ou “desfazer espaços”, como diz o título de sua exposição retrospectiva itinerante, que chega a São Paulo depois de passar por Santiago do Chile e antes de seguir para Lima. Matta-Clark interessava-se pela situação paradoxal de um contexto urbano em que conviviam modernização e abandono. Em 1971, quando Wall Street investia na construção das torres gêmeas do World Trade Center para estimular o crescimento econômico do sul da ilha, Matta-Clark documentava a miséria das pessoas que viviam na região, no filme “Fire Child”. Foi quando começou seus projetos de perfurações de edifícios condenados ao desaparecimento e a gestar suas ideias de “anarquitetura”. “Como estes edifícios existiam fora da sociedade e não se inseriam dentro dos objetivos de proteção da propriedade, estavam aí para quem quisesse. Os cães selvagens, os drogados e eu utilizamos estes espaços para resolver algum problema vital; no meu caso, a falta de um lugar de trabalho socialmente aceitável”, declarou o artista em entrevista, em 1977.
Seus primeiros cortes foram subversivos, já que não conseguia permissão oficial para projetos de intervenção urbana. Mas o artista não tardou a ter o trabalho reconhecido pelo sistema de arte internacional. Em 1975, ele foi convidado pela Bienal de Paris a cortar dois edifícios do século 17, que seriam demolidos na área do Plateau Beaubourg, próximo ao novo edifício do Centro Pompidou – que, por sinal, foi construído debaixo de muita polêmica. Hoje, as imagens documentais de “Conical Intersect” integram o acervo do museu francês, constituindo uma espécie de memória de sua pré-história. Para combater a monumentalidade da arquitetura moderna, Matta-Clark inventou o conceito do “no nument” (algo como não monumento). “As preocupações de Matta- Clark sempre apontaram para uma busca de soluções autossustentáveis, desde ‘Garbage Wall’, feita de resíduos e dejetos, até o projeto não concluído em que propunha o treinamento de jovens de baixos recursos de Nova York em ofícios de alvenaria e construção”, afirmam por e-mail as curadoras Tatiana Cuevas e Gabriela Rangel.
Em vez de aderir a programas oficiais de renovação – que previam a demolição de áreas históricas deterioradas –, o artista tinha ideias para melhorar a qualidade de vida de populações excluídas dos planos especulativos de Wall Street. Entre essas populações, incluíam-se também povos do Equador, Chile, Peru, Haiti, México e Guatemala. Filho do artista surrealista Roberto Matta, de origem chilena e residente nos EUA e na Europa, Gordon Matta-Clark conhecera o Chile ainda menino.