|
fevereiro 4, 2010
Arte, ironia e déjà vu por Ana Cecília Soares, Diário do Nordeste
Matéria de Ana Cecília Soares originalmente publicada no Caderno 3 do Diário do Nordeste, em 3 de fevereiro de 2010
Na exposição "Eu vejo, tu olhas... Ele Déjà Vu", o artista Fernando Ribeiro realiza pequenas intervenções sobre obras de artistas consagrados
Para o artista paulistano Fernando Ribeiro, esse papo de que "tudo já foi feito e que a arte está ensimesmada", não tem razão de ser. Afinal sempre é tempo para inovações. O artista é de tese que mesmo interferindo no trabalho de outros artistas ou repetindo uma dada ideia é possível criar novas formas de percepção artística.
Em "Eu vejo, tu olhas... ele Déjà Vu", Ribeiro faz pequenas intervenções, delicadas e irônicas, sobre trabalhos de artistas consagrados como Marcel Duchamp, Pablo Picasso, Andy Warhol, Miro, Man Ray e os brasileiros Leonilson, Bispo do Rosário, Nelson Leirner, entre outros. O artista segue uma linha histórica de autores que mais gosta.
Epifânia
Segundo ele, a ideia de realizar a exposição surgiu logo após ter terminado a individual de Nelson Leirner (seu ex-professor, amigo e curador de sua atual mostra), em Juazeiro do Norte. "Naquele momento recebi o convite do CCBNB. Como todos os trabalhos até então, haviam sido feitos sobre papel, resolvi levá-los para a tela, pois faríamos, Nelson Leirner e eu, uma exposição na Bolsa de Arte de Porto Alegre, intitulada de "Pollockcow a Déjà Vu" em setembro de 2009. A sequência disto foi o lançamento do álbum de gravuras, da mesma série, na galeria Mônica Filgueiras em novembro passado", diz.
O artista conta que o trabalho nasceu após uma discussão entre ele e alguns artistas, que alegavam que nada mais seria possível na arte, pois tudo já havia sido realizado. "Eu discordava solenemente, porque sempre acreditei que a arte fala com a arte, e que você poderia se apropriar do trabalho de outros artistas, fazer uma interferência ali, e modificar o olhar do observador. Não consegui convencer ninguém!"
De volta ao seu ateliê, resolveu estudar a questão e a primeira referência foi Picasso, que havia feito mais de quarenta estudos sobre o quadro "As Meninas" de Velasquez e pintado cinco ou seis telas sobre o mesmo assunto com a visão dele.
"Daí para frente, trabalhei em 30 pinturas, adquiridas por um colecionador antes mesmo da exposição abrir. Ao longo do trabalho, percebi que só me apropriei de obras/artistas com os quais eu me identificava e que havia neles uma linha temporal bem interessante. Era uma enorme provocação, se meu observador não conhecia a História da Arte, ele ao menos poderiam ver um Mickey. Seria pouco provável que as pessoas não identifiquem este ícone".
Para Ribeiro, o interessante na mostra é que ao receber o nome "Déjà Vu", a obra toda vira uma provocação ímpar com um resultado estético belíssimo. "Achei tudo tão interessante que produzi feito um louco, sem achar que fosse virar uma individual em tão pouco tempo. No meio do caminho, percebi que havia uma linha histórica sobre a arte, foi absolutamente instintivo. E vi que isso era bom, pois passava pelos meus prediletos, o que eu também não havia pensado", afirma.
Exposição
No texto curatorial, Nelson Leirner explica que na série Déjà Vu, Fernando joga com o público um verdadeiro questionário do conhecimento da Historia da Arte. "Num primeiro momento desta seleção, sua manipulação bem humorada e inteligente, nos traz a tona ícones da Arte Contemporânea. Se o espectador olhar para o trabalho ´PHARMACY´ e não souber quem é Damien Hirst, lhe sobrará ainda o sutil toque que transforma um dos círculos, na figura do Mickey. Jogar com a sociedade é sempre, para o artista, um desafio gratificante", ressalta.
A exposição de Ribeiro que abre nesta quinta-feira, 4, no Centro Cultural Banco do Nordeste de Fortaleza (CCBNB), ficará em cartaz até 31 de março. A mostra é constituída por 30 pinturas e colagens inéditas sobre papel Fabriano, 50% algodão e 350gramas, além de quatro trabalhos tri-dimensionais e mais um álbum de gravuras eletrônico/digital.
Ribeiro nos mostra uma pintura inédita em acrílica sobre tela, algumas com o diferencial da inclusão de assemblages. Assim inova com o princípio da transformação de uma obra plana em tridimensional.
Na exposição há um álbum e uma caixa-objeto de tiragem limitada a 40 exemplares. Este trabalho é composto por uma série de 10 gravuras originais, da série Déjà Vu, com dupla utilização já incluída no seu conceito original: com a composição sugerida com a caixa-objeto, que também é uma obra completa por si só, ou cada gravura exposta de forma isolada. Em suportes atuais, um álbum eletrônico, vídeo instalação, exibe imagens das gravuras de forma transmutada, permitindo a visualização, em mídia eletrônica, das imagens que compõe o álbum físico, em sequência randômica.
A coordenadora do núcleo de artes visuais CCBNB, Jacqueline Medeiros, acredita que Fernando Ribeiro ao se apropriar de obras de artistas consagrados problematiza os elementos estéticos, conceituais e históricos presentes ali, resignificando e transformando a obra referência por meio de uma modificação sutil, divertida e provocativa. Comprova que sempre há algo a acrescentar na arte contemporânea, ainda que se diga "tudo já foi feito na arte".
Artista inquieto
Arte transformada
Influenciado por Robert Crumb, o artista Fernando Ribeiro, natural de São Paulo, inicia sua carreira aos 16 anos, na Lynx Film, como arte finalista e participa do longa metragem de animação "Simplex", ganhando o Leão de Ouro em Cannes. A partir de 1990, dedica-se exclusivamente as Artes Plásticas. Junta-se a Cooperativa dos Artistas nos anos 90, chegando a exercer o cargo de diretor. Após algumas tentativas de trabalhos em grupo, opta por uma trajetória individual, realizando diversas exposições pelo mundo.
Fernando Ribeiro
Eu Vejo, tu olhas....ele Déjà vu
Curadoria de Nelson Leirner
4 de fevereiro, quinta-feira, 19h
Centro Cultural Banco do Nordeste - CCBNB
Rua Floriano Peixoto 941, Centro, Fortaleza - CE
85-3464-3108 / 3177 ou cultura@bnb.gov.br
www.bnb.gov.br/cultura
Terça a sábado, 10-20h; domingo, 10-18h
Exposição até 31 de março 2010
A apropiação e a interferência nas obras de outros artistas é uma das maneiras de se dicutir e fazer arte. Fernando faz com rara habilidade, permitindo ao expectador a interpretação que melhor lhe convier. Parabéns ao artista a ao CCBNB na pessoa de Jaqueline Medeiros. Marcio Fonseca
Posted by: marcio fonseca at fevereiro 18, 2010 2:56 PM