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novembro 6, 2009
Respirar com os olhos por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na revista Istoé, em 4 de novembro de 2009
Waltercio Caldas desafia o sentido da visão em nove instalações expostas no Museu Vale
Waltercio Caldas reconhece o olho como o principal órgão de percepção das artes visuais, mas não se contenta com o que ele pode oferecer. Talvez por isso suas obras se comportem como jogos ópticos.
O espectador da obra do artista carioca é sempre convidado a recriar seus modos de olhar. Para isso, deve contar com uma boa dose de humor, a ser descoberto em trabalhos como "Ping-Ping", que propõe uma partida pingue-pongue jogada por cegos; ou em "Maçãs Falsas", que desafia o espectador a descobrir quais são as maçãs reais e quais são as suas imagens em um labirinto de vidros e reflexos; ou em "Sala para Velázquez", que contém um livro sobre o pintor espanhol com imagens e textos reproduzidos fora de foco. As nove instalações expostas no Museu Vale - cinco inéditas no Brasil - precipitam "abismos para o olhar", segundo o curador Paulo Venâncio Filho.
ISTOÉ - Um aspecto que conecta as obras expostas é o jogo com a percepção visual. Por que a visão?
Waltercio Caldas - O principal órgão de percepção da arte é o olho. Pensamos através dos olhos. O pensamento é uma bela emoção, que se dá por meio da percepção visual do mundo. Não por acaso, nessa exposição dois aspectos estão bastante evidentes: o visual e o musical, que se completam.
ISTOÉ - "Quarto Azul" explora a pintura e a experiência pictórica através da cor?
Caldas - Acho que não. Trato a cor como se fosse um objeto tridimensional. A parede branca não é suporte para a cor azul, mas é o corpo da obra. Na verdade, não trato a tridimensionalidade da imagem, mas sim da cor.
ISTOÉ - Como você se relaciona com a história da pintura?
Caldas - A pintura, para mim, é um objeto muito opaco, em que o olho se fixa. Tenho um interesse nas coisas transparentes, que o olhar atravessa. O olhar vai e volta, não se fixa no objeto. Existe um aspecto lúdico na percepção e o objeto tem uma certa "saúde", uma capacidade de produzir novos significados dele mesmo. É como se, por vezes, a obra olhasse o espectador.
ISTOÉ - Por isso a referência à obra "Las Meninas", de Velázquez?
Caldas - Exato. Essa é uma obra que olha para o espectador. Em "Livros sobre Velázquez", chamo a atenção não para a imagem reproduzida, mas para o objeto-livro, como reprodutor da obra do artista. O objeto é mais importante que a imagem.
ISTOÉ - Por quê?
Caldas - Meus trabalhos resistem em se transformar em imagens. Eles querem ser coisas, antes de serem imagens. Não querem reproduzir coisas, querem ser a antirreprodução. Ao ser reproduzido, o objeto se torna opaco e perde sua natureza transparente. O mundo está sendo vendido às pessoas como se fosse imagem. Quero dizer justamente o oposto. Não quero me separar do jogo do mundo, mas jogá-lo com o suficiente distanciamento crítico para não me deixar levar pelos valores cínicos da aparência.
ISTOÉ - Que modos de olhar você abre para o espectador, além da contemplação?
Caldas - A primeira coisa que me vem à cabeça é a palavra abismo. Olhar para a arte é compactuar com este abismo que há na frente, um desconhecido ativo que nos atrai e nos impele a encará-lo à revelia de nós mesmos. A função do artista é melhorar a qualidade do desconhecido.