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setembro 1, 2009
Os abrigos de Diego por Alan Santiago, O Povo
Matéria de Alan Santiago originalmente publicada na seção Vida e Arte do O Povo, em 01 de setembro de 2009.
Arranha-verso, exposição que tem abertura hoje às 19 horas no Centro Cultural BNB, investiga os abrigos. Com uma técnica simples de desenho, os trabalhos são a busca do artista por um lugar possível no mundo
As criações de Diego de Santos são frutos de uma pesquisa que explora a simplicidade das esferográficas e o papel sulfite (Divulgação)
Diego de Santos vive num lugar incerto - nem em Caucaia, onde nasceu e tem casa fincada no chão, nem muito menos em Fortaleza, que é lugar do seu trabalho no Sobrado José Lourenço e dos estudos no curso de Artes Plásticas do IFCE, antigo Cefet. Antes, o artista plástico reside num pêndulo imaginário que o coloca em trânsito eterno entre as duas cidades, uma deslocalização “muito pessoal”, como ele me diz na manhã da última sexta-feira (28), e que parece ter sido o leitmotiv para a exposição Arranha-Verso, que ganha o Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB) hoje, às 19 horas, e segue até o final de setembro. Os cerca de 20 trabalhos, frutos de uma pesquisa que já se estende desde 2007, se dedicam a investigar, com a tinta da caneta esferográfica e o papel sulfite, os abrigos – ou a ausência deles.
Mas, por aqui, não seria possível definir esses ditos abrigos e casas como lugares de refúgio contra a intempérie. Na verdade, as séries de desenhos, que tentam fazer uma interseção com o ato de pintar e não propriamente com a pintura, expõem esses espaços, até então sinônimos de proteção e calmaria, a uma tensão. Os abrigos de Diego são construídos de silêncio e solidão, como explica Maíra Ortins, a também artista plástica e curadora. “O homem teme essa casa feita de concreto e grades. Contudo, ainda se avista pela janela o azul, promessa de felicidade”, escreve ela. “Acima da casa, não se vê céu, vê-se tempo, corroído, em cor fosca e cinza. Papel gasto e cansado do atrito da caneta”, refere-se ela à técnica que acabou originando o título desse conjunto de obras.
É Arranha-Verso, porque, no lugar de tentar atingir o céu como o fazem os edifícios altíssimos que invadiram a orla da Capital e se espalham pelos bairros, a intenção é que a força da caneta alcance o outro lado da folha de papel, tão fina quanto as A4 geralmente usadas para impressões nos computadores. “Uso elementos muito delicados com coisas bruscas como o risco forte. Isso gera uma ameaça sobre essa delicadeza”, analisa.
As gotículas de delicadeza são as portas pequenas, às vezes minúsculas, e singelas, que ele deixa escapulir no meio dos ambientes áridos, que ferem. “É a busca por um lugar, seja ele estranho ou não, mas um lugar possível. Não se sabe muito sobre esse lugar, mas a porta é convidativa, porque traz um pouco de mistério, sugere que se vá a esses lugares para saber se são dotados de conforto ou não. É um percurso por esses vários abrigos”, sintetiza.
Ainda assim, são imagens com um gosto de indefinido, como o próprio refúgio do artista. É trabalho abstrato, mas não se exime do figurativo. Entretanto, nessas ocasiões, o que se vê são, por exemplo, homens cuja cabeça está fora do espaço do desenho como se eles estivessem “sufocados por aquilo”, na solidão da cor da tinta preta, afundados numa imensidão branca, silenciosa, como o tempo. “O artista habita a terceira margem entre o espaço e o tempo, entre a cor e o branco, silencioso e calmo, nem triste, nem exato, nada preciso, pouco a ser dito e muito a ser visto”, conclui a curadora.
Arranha Verso
Diego dos Santos
2 a 30 de setembro de 2009
Centro Cultural Banco do Nordeste - Fortaleza
Rua Floriano Peixoto 941, Centro, Fortaleza - CE
85-3464-3108
Terça a sábado, 10-20h; domigo 10-18h
Exposição até 30 de setembro