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agosto 27, 2009
Fotógrafo "poluirá" paisagem de SP por Mariana Barros, Folha de S. Paulo
Matéria de Mariana Barros originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo, em 27 de agosto de 2009.
O francês Christian Caujolle será curador do Cidade Galeria, que vai ocupar espaços da cidade como paredes e muros
Previsto para janeiro, será o primeiro grande projeto visual ao ar livre permitido depois da implementação da lei Cidade Limpa
O fotógrafo francês Christian Caujolle olha atentamente a cidade que se desenrola sob seus pés, fixados no topo e resistindo ao vento que varre a cobertura do edifício Martinelli, no centro de São Paulo, local emblemático por já ter sido o mais alto arranha-céu da América Latina. "Meu desafio é preencher paredes", diz, mirando os espaços deixados em branco pela lei Cidade Limpa.
Ex-editor do jornal "Libération", fundador da agência Vu (que inovou agenciando fotógrafos em vez de fotos) e curador de exposições como a de 50 anos da World Press Photo, ele esteve em São Paulo na semana passada revisitando a paisagem que conheceu no início do ano e que tem a missão de metamorfosear até o início de 2010.
Caujolle será curador do Cidade Galeria, o primeiro projeto visual ao ar livre desde que a prefeitura baniu os outdoors, em 2007, a obter autorização da Emurb (Empresa Municipal de Urbanização) para espalhar painéis de até 150 m2 por paredes, muros e chão da capital.
Previsto para janeiro, época do aniversário de São Paulo, o evento, organizado pela agência de produção cultural Brazimage, terá como cocuradores os fotógrafos Eduardo Brandão, da Galeria Vermelho, e Iatã Cannabrava, do Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo. Contará ainda com a direção de arte do designer sul-coreano Ji Lee, conhecido por intervenções em cartazes publicitários de Nova York. O custo do projeto é estimado em R$ 2,5 milhões, captados por leis federais de incentivo, como a Rouanet, e patrocinadores.
O Cidade Galeria estampará no perímetro entre a igreja da Consolação e a estação da Luz a produção de fotógrafos brasileiros e estrangeiros. Haverá ainda exibições multimídia.
Um simpósio sobre arte e cidade deve dar uma dimensão mais filosófica ao evento -reflexo da formação de Caujolle, que estudou com alguns dos mais influentes intelectuais do século 20, como o semiólogo Roland Barthes (1915-1980), o sociólogo Pierre Bourdieu (1930-2002) e o filósofo Michel Foucault (1926-1984).
Político
"É político. Não queremos incitar consumo, não estamos vendendo nada nem anunciando ninguém. Não consigo imaginar onde mais eu poderia fazer algo assim", diz Caujolle, que aceitou o convite atraído por se tratar de uma cidade sem propaganda. "Os países que conheci nestas condições [sem outdoors] eram comunistas, como Tchecoslováquia e Polônia. Havia um sentimento de tristeza que não senti aqui."
Para Regina Monteiro, diretora da Emurb e mentora da lei Cidade Limpa, o que se discute é como será o visual urbano daqui em diante. "O poder público começa a regrar uma coisa nova. Como quebrar isso, de que o que vale é quem dá mais? O que vale é quem fará o quê", diz.
As paredes esvaziadas também desafiam o designer Ji Lee, acostumado a ações que questionam a publicidade. Nascido na Coreia do Sul, criado no Brasil e há 20 anos nos EUA, ele chegou a ser preso por colar balões em branco em cartazes de propaganda. Em outra ação, aplicou um pano preto com frestas sobre painéis luminosos, transformando mensagens publicitárias em arte abstrata.
"Me senti agredido como cidadão ao andar nas ruas de Nova York e ver tantas mensagens que não me interessavam", diz, para em seguida contrapor o momento paulistano. "O mundo inteiro está olhando para São Paulo, por causa do Cidade Limpa. Será muito interessante ver como o público vai reagir ao Cidade Galeria."