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agosto 19, 2009
Jardins cubistas por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na revista Istoé, em 7 de agosto de 2009.
A geometria e a flora que guiaram Burle Marx hoje orientam pesquisas de Miguel Chevalier com tecnologia e vida artificial
ROBERTO BURLE MARX 100 ANOS: A PERMANÊNCIA DO INSTÁVEL/ Museu de Arte Moderna, SP/ até 13/9 SEGUNDA NATUREZA - Miguel Chevalier/ Espaço Cultural Marcantônio Vilaça, Brasília/ Estação Galeria do Metrô, Brasília / até 22/8
Roberto Burle Marx transplantou as diretrizes do cubismo e do abstracionismo geométrico para a organização de seus jardins de plantas nativas brasileiras. Com isso, correspondeu aos anseios antropofágicos de sua época modernista: devorar as influências estrangeiras para apropriar-se delas, transformando-as ao gosto local. Com 180 itens - entre pinturas, fotografias e projetos -, a exposição comemorativa do centenário de Burle Marx, atualmente em cartaz no MAM-SP, é uma excelente oportunidade de conferir como ele fez de seu paisagismo tropical uma linguagem moderna e internacional. Em Brasília, duas instalações interativas mostram como a mesma flora brasileira e a geometria que conduziram a arte de Burle Marx hoje influenciam as pesquisas de ponta que o mexicano Miguel Chevalier realiza com sistemas generativos e arte interativa.
Natureza ordenada Geometrias organizam tramas de jardins e da orla carioca de Burle Marx
"Jardim é ordem. É impulso ordenado", escreveu Burle Marx, para quem o jardim era um modo de organizar e compor a pintura, utilizando materiais menos convencionais. A ordem determinada pelas formas geométricas aparece cedo em Burle Marx: é visível desde as pinturas em óleo sobre tela dos anos iniciais até o traçado do calçadão da orla carioca, do Aeroporto Santos Dumont ao Posto 6, em Copacabana. "As pessoas passam a compreender melhor o paisagista ao conhecer o artista plástico. São mídias diferentes, mas existe uma unidade", afirma Lauro Cavalcanti, curador da exposição, que depois segue para Recife, Brasília, Estados Unidos, França e Itália.
Chevalier, um pioneiro no uso da arte digital, também apresenta uma proposta de ordenação da natureza e reconhece identidade comum com Burle Marx. "Sua destreza cromática e formal mostra grande interesse pelo cubismo, como ocorre na minha "Fractal Flowers", um jardim virtual em que as flores são levadas ao extremo de sua geometrização. As calçadas do Rio de Janeiro são como uma prefiguração do pixel. A justaposição desses mosaicos cria uma vibração, como nas telas dos computadores", afirma o artista, que se inspirou na "luxúria da flora brasileira" para criar seus jardins virtuais interativos.
Virtuais
Corpos videográficos
Exquisite Corpse Video Pro ject / DConcept Escritório de Arte, SP/ de 11/8 a 22/8 www.vimeo.com/excorpse www.artreview.com/profile/excorpse
Os surrealistas franceses inventaram um jogo que até hoje é praticado e reinterpretado em todo o mundo. No cadavre exquis - ou exquisite corpse, em inglês -, uma folha de papel é dobrada de forma que cada jogador veja apenas uma pequena fatia do desenho realizado pelo jogador anterior. No final do jogo, o papel é desdobrado, revelando a estranheza de um corpo híbrido, construído coletivamente. Nos tempos de compartilhamento de dados virtuais em que vivemos, o método sequencial surrealista pode ser considerado um precursor dos processos de criação coletiva que proliferam na rede mundial de computadores.
A sacada é do grupo Exquisite Corpse Video Project (ECVP), criado e coordenado pela videoartista paulistana Kika Nicolela, que produz vídeos colaborativos inspirados no método surrealista: cada participante cria um vídeo de dez segundos, em resposta aos dez segundos recebidos de outro participante. A soma desses fragmentos resultou em nove vídeos, que estão hospedados no site vimeo e serão exibidos na DConcept Escritório de Arte, em São Paulo.
"O projeto nasceu de minha vontade pessoal de formar comunida des", conta Kika. Ela convidou 36 artistas de 16 países a integrar um grupo na plataforma virtual da Art Review. Entre os artistas figuram o indiano Ambuja Magaji e o dinamarquês Michael Chang. "Criei um grupo de videoartistas entre as pessoas que tinham perfis no site e lancei a ideia da colaboração", diz a artista, que tem no histórico outras iniciativas de formação de espaços colaborativos, fora das instituições oficiais de arte. Em 2006, ela foi uma das coordenadoras das mostras "Paris é aqui" e "Marte é aqui" - esta última mobilizou 72 artistas em exposição na casa da artista.
Fernanda Assef