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junho 10, 2009
Veneza abre com instalações de brasileiros por Suzana Velasco, O Globo
Matéria de Suzana Velasco originalmente publicada no Segundo Caderno do jornal O Globo, em 7 de junho de 2009.
Pavilhão geral da bienal tem obras de Lygia Pape, Cildo Meireles e Renata Lucas, que fez intervenção na arquitetura
A53ª Bienal de Veneza, mais tradicional exposição internacional de artes plásticas, será aberta hoje para o público com três artistas brasileiros, de três gerações diferentes, no pavilhão principal. Entre Lygia Pape (1927-2004) e Cildo Meireles, nomes consagrados da arte nacional, a paulista Renata Lucas, de 37 anos, firma na Itália uma carreira que esteve em ascensão nos últimos anos, marcada por ousadas intervenções em espaços públicos.
Numa cidade sem asfalto, Renata criou “Venice suitcase” (“Mala Veneza”), estradas sobre o solo de Veneza, nas alamedas das áreas do Arsenale e do Giardini. Propícia ao nome desta edição da bienal, “Criar mundos”, a instalação é, segundo a artista, um jogo entre História e ficção, natureza e cultura:
— Como num processo arqueológico, ao retirar parte da areia que recobre a alameda, encontra-se o pavimento característico de uma via moderna, asfaltada — explica Renata, por e-mail, após a montagem. — É um jogo de profundidades numa cidade em que não há subsolo, afinal de contas escava-se a areia da alameda (construída) para chegar à estrada (igualmente construída). É uma espécie de arqueologia ao contrário, onde, surpreendentemente, o que se encontra nas camadas subjacentes de uma cidade antiga como Veneza é futuro. Como uma poça de água no chão, a parte de solo retirada contém uma estrada. Para mim, foi importante deixar ver que essa estrada passa por toda parte.
Problemas com as regras de preservação em Veneza
Os artistas Delson Uchôa e Luiz Braga, escolhidos pelo curador Ivo Mesquita para o pavilhão brasileiro, quase não foram à Veneza pela Bienal de São Paulo — responsável pelo pavilhão desde 1993 —, por falta de patrocínio, resolvido na última hora com o apoio de R$350 mil do Ministério da Cultura. No pavilhão geral, Renata também teve problemas, mas de outra ordem. Mesmo já na cidade para criar sua instalação, ela ficou à espera por uma autorização, já que praticamente toda Veneza tem regras rígidas de preservação — e a artista queria construir uma estrada em plena área histórica.
— Veneza é muito limitada, não apenas porque é tombada, mas também porque não permite que certos equipamentos circulem pela cidade, pois só podem desembarcar máquinas leves. Há restrições de toda ordem. Aqui, inclusive o que é absolutamente novo finge que é antigo, e tradição e preservação são palavras que valem para tudo, sem distinção — conta Renata, que já plantou árvores nos jardins da Tate Modern, em Londres, e ocupou cruzamentos de ruas do Rio com placas de compensado.
O pavilhão italiano da bienal vai expor ainda o histórico “Livro da criação” (1959), de Lygia Pape, pranchas de papel que contam a História do mundo. Uma das mais belas instalações de Lygia, “Ttéia ”, também será exposta, na primeira sala do Arsenale, porta de entrada para a exposição. A obra é uma escultura de fios metalizados sobre placas de madeira e luz.
Cildo Meireles mostrará em Veneza a obra inédita “Pling Pling”. Cada uma das seis salas do espaço de Cildo é pintada de uma cor diferente — lilás, azul, verde, amarelo, laranja e vermelho — e transmite, numa tela, uma gravação ao vivo de outra sala, com sua cor complementar.
Dos 500 artistas de dois anos atrás, a Bienal de Veneza — que será realizada até 22 de novembro — passou para 90 nomes, reunidos pelo curador sueco Daniel Birnbaum e pelo cocurador alemão Jochen Volz. Entre eles estão o sueco-brasileiro Öyvind Fahlström (1928–1976), os americanos Gordon Matta-Clark e Miranda July, a espanhola Sara Ramo, o argentino Tomas Saraceno, os italianos Rosa Barba e Simone Berti e a japonesa Yoko Ono, que este ano recebe o Leão de Ouro pelo conjunto de sua obra, junto com o americano John Baldessari. A exposição se completa com os 77 pavilhões nacionais, cada um com artistas escolhidos por cada país.