|
abril 6, 2009
Um lugar ambíguo por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Revista Istoé, em 25 de março de 2009.
Objetos do cotidiano ganham lugar na retrospectiva de Sergio Romagnolo
Sergio Romagnolo - O corpo denso da imagem / Instituto Tomie Otake, SP / até 10/5
Embalagens de sucrilhos, personagens de seriados de televisão, heróis dos quadrinhos, ícones do barroco mineiro. Nenhum clichê da industria cultural escapa. Com um corpo de trabalho que inclui as atividades da escultura, da pintura e do desenho, Sergio Romagnolo é um investigador da condição reincidente e repetitiva da imagem contemporânea. Mas, apesar de assumir que sua vontade de reprocessar os ícones do cotidiano surgiu depois que assistiu a um filme de Andy Warhol (1928-1987), em 1982, o artista paulistano não se considera influenciado pela arte pop. “Nasci num mundo de propagandas. A mídia de massa não é pop, ela é a vida. Minha obra não fala da indústria pop, mas da minha vida. É autobiográfica e até nostálgica. Me sinto mais inspirado por Duchamp do que por Warhol”, afirma Romagnolo, que faz uma retrospectiva de cem obras produzidas em quase trinta anos de trabalho, no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.
A referência a Marcel Duchamp (1887-1968) aparece nas esculturas que poderiam ser readymades – objetos comuns, apropriados do cotidiano e transformados em obras de arte -, como o Fusca de ponta cabeça e a Bateria com pantufa amarrada. “A idéia é sobrepor coisas diferentes. Sagrado e profano, instrumento musical e sapato. Por quê? Porque eles nunca estiveram juntos; combinam, mas não combinam. A intenção é confundir, provocar relações ambíguas. O mundo moderno é muito pragmático, mas a arte ocupa o lugar do não-prático, não-óbvio, do inacabado”, diz. Para sintonizar com a confusão, a montagem da exposição, a cargo do curador Agnaldo Farias, permite-se uma certa “desorganização” cronológica, alinhando obras produzidas em diferentes épocas, e aproximando-as menos pelo vinculo temporal e mais pela relação temática. Esse é o caso da pintura Batmóvel, de 1981, que aparece junto aos trabalhos sobre a série A Feiticeira, de 2006-08.
Colaborou Fernanda Assef
Bate papo: Jorge Macchi
Artes do discurso
Para construir a imagem do cartaz de apresentação da 27ª Bienal de São Paulo, em 2006, o artista argentino Jorge Macchi utilizou aspas recortadas de frases impressas em jornais. Ao banir as informações contidas entre as aspas e utilizar somente o símbolo gráfico, Macchi apropriava-se e desarticulava o discurso produzido pela mídia. O jornal continua sendo sua matéria prima durante sua participação no Programa Artista Convidado do Ateliê de Gravura, do Instituto Iberê Camargo. A partir da matriz realizada em Porto Alegre, será produzida uma tiragem de 60 cópias.
Que relação você tem com a gravura?
Me interessa na gravura a possibilidade de reproduzir imagens que preservam uma qualidade artesanal apesar da serialização.
Qual será seu trabalho no ateliê?
Levo um material para submeter à análise dos técnicos do instituto. É uma imagem que eu gostaria de reproduzir, mas não sei exatamente qual é a técnica apropriada. Trata-se de uma página de jornal, da qual eu extraí o texto, mas na qual percebe-se parte do texto da página posterior por transparência. Parece uma composição geométrica que, no entanto, preserva detalhes que denotam a origem dessa estrutura. O que me interessa aqui é o processo, que leva de um objeto serializado a outro.
Como vê o transito artístico entre Brasil e Argentina?
Não creio que os artistas argentinos estejam muito presentes no Brasi e tampouco é comum ver artistas brasileiros na Argentina. Mas vejo uma proposta mais integradora no Brasil, como demonstram a Bienal do MERCOSUL, a Bienal de São Paulo, ou o centro de Estudos Brasileiros em Buenos Aires. Na Argentina, tudo depende mais da energia, da iniciativa e da sorte dos próprios artistas.
Critica
Reality show às avessas
Os sete intelectuais na floresta de bambu/ Paço das Artes, SP/ até 5/4
Por Juliana Monachesi
Na contracorrente da arte chinesa para exportação, Yang Fudong é um artista em ascensão – entrou para o círculo de artistas experimentais chineses com o vídeo Backyard – Hey, Sun Is Rising!, de 2001, e, no ano seguinte, apresentava An Estranged Paradise na Documenta 11. Mas é um artista que preza a perspectiva de um tempo longo, em oposição àquilo que ele próprio denomina o “estilo rápido” dos artistas atuais. A instalação Os Sete Intelectuais na Floresta de Bambu, exposta no Paço das Artes, levou cinco anos para ficar pronta. Com cinco videoprojeções, a obra é uma proposta de refúgio no movimento taoísta da “conversação pura”, encenada por sete jovens convidados pelo artista a seguir os próprios impulsos em meio à natureza.
A temporalidade dilatada da obra de Fudong não se restringe ao tempo de criação e desenvolvimento da pesquisa que resultou na instalação, pois perpassa toda a narrativa da jornada coletiva de formação intelectual. Filmado em 35mm, o trabalho imprime no espectador uma sensação de distância e tempo expandido pelo uso do filme preto-e-branco e de figurinos que remetem aos anos 1940. Inspirada na lenda dos sete sábios chineses, um grupo de estudiosos e poetas que fugiram dos problemas da transição entre as dinastias Wei e Jin na China do século 3º reunindo-se em um bosque para filosofar, a obra Os Sete Intelectuais na Floresta de Bambu trata da busca de sentidos para a vida – explicitada nos diálogos filosóficos que lembram o cinema francês existencialista de Godard– e do embate com o vazio de sentido nas relações entrecortadas pela paisagem (seja urbana ou rural) – referenciado no enquadramento à maneira de Antonioni, que privilegia a arquitetura e os espaços vazios em detrimento dos próprios personagens.
Em uma inversão da lógica espetaculosa dos reality-shows que proliferam na grade televisiva, a reencenação audiovisual do movimento taoísta roteirizada por Yang Fudong deixa o filme à deriva das improvisações dos protagonistas no confronto com cada etapa da jornada, consciente de que esta nunca terá fim.
Juliana Monachesi é critica de arte e jornalista
NA LINGUAGEM POPULAR, TODOS SOMOS ARTISTAS
Embalagens de sucrilhos, tudo bem. Personagens de seriados de televisão, também, mas depende a época. Quando começa com: ícones, de qualquer coisa, do barroco mineiro, clichê da industria cultural, pop, etc. Meu! Eu tenho quinhentos alunos, que estudam comigo na E.E.Prof. Esli Garcia Diniz, em Arujá. Se eu começar a falar assim,lá, vou tomar porrada.
Vamos para o argentino que recortou aspas de frases impressas ou páginas posteriores da transparência. Ainda diz que seu interesse é o processo, que leva de um objeto serializado a outro.
Para com isso, ô!
Se na Bíblia Deus complicasse tanto, muitas igrejas já teriam falido. As linguagens complicadas, esnobes não permitem nenhuma comunicação, hoje. Quero dizer, quase nenhuma. Vejam se eu usasse esse tipo de linguagem, meus alunos iriam me chamar de burro, de chato, etc. Mas como uso à deles, fútil mesmo, fácil, eu me comunico perfeitamente, ensino o que quero, na zoeira ou na calmaria.
Arte é assim ou alcança a nós todos, ou não passa de enganação. Independentemente de ícones, símbolos, valores, linguagens, técnicas ou estilos.
Quando fica essa elite pseudo-entendida falando em linguagem surrealista, a grande massa popular é escanteda, legada ao ostracismo artístico sob a alegação de que arte é somente para quem não é leigo.
É laboratório meu, com resultado prático, todos são gênios e artistas, mesmo no aprendizado ou formando-se. Dentro dos seus limites, esses artistas, podem, muito bem, produzir a valer.
Depois, com o passar do tempo vão com certeza, entender tudo de tudo. Essa exclusão é uma vergonha.
Líbano Montesanti Calil Atallah
Professor, artista plástico e antiquário
www.artponto.com