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fevereiro 26, 2009
América com sotaque mexicano por Paula Alzugaray, Istoé
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Revista Istoé, em 11 de fevereiro de 2009.
Coleção mostra como artistas latino-americanos absorvem e confrontam movimentos estéticos vigentes
Formar uma coleção de arte latino-americana talvez seja uma tarefa tão complexa quanto promover a integração geopolítica, econômica e ideológica sul-americana (e exercitar a mediação em casos de conflito na região, papel que tantas vezes cabe ao presidente Lula). Toda grande coleção de arte latino-americana depara-se com o mesmo dilema: contemplar a pluralidade do continente. O desafio é evidente nesta exposição de 41 obras da Coleção Femsa, metade das quais realizada por artistas mexicanos ou residentes no México. A mostra é um pequeno recorte da coleção de mais de mil obras que o conglomerado empresarial mexicano acumula desde 1977.
O cubismo, o surrealismo, a abstração geométrica e informal são algumas das correntes estéticas europeias que foram absorvidas, deglutidas e interpretadas à moda local por artistas mexicanos, argentinos, cubanos, chilenos, colombianos, brasileiros, etc. O Chile está representado por Roberto Matta, Cuba por Wifredo Lam, Uruguai por Torres García, Venezuela por Jesús Soto, Colômbia por Fernando Botero. Segundo o crítico mexicano Luiz-Martin Lozano, em texto do catálogo, a busca de identidades locais é "talvez uma das características que mais coincidem nos processos históricos das diferentes nações americanas".
Mas, na exposição, são mexicanas as obras que melhor representam esse desejo de alcançar uma expressão independente dos modernismos vigentes.
Diante de belíssimas pinturas de Frida Kahlo, Cordelia Urueta, Alfredo Ramos Martinez, David Alfaro Siqueiros e José Clemente Orozco, surpreende a ausência da antropofagia brasileira, que se inicia em 1928 nas pinturas de Tarsila do Amaral e no manifesto de Oswald de Andrade, ressaltando os contrastes entre as culturas ameríndia e afro-brasileira e a herança europeia. Outras lacunas marcantes são o neoconstrutivismo brasileiro e a arte concreta argentina. A seleção brasileira da Coleção Femsa recai sobre a pintura de viés expressionista de Iberê Camargo e o abstracionismo de Arcangelo Ianelli. Apesar das inevitáveis ausências, a exposição é um bom convite para repensar nossas noções de vizinhança.