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novembro 18, 2008
Arte em contêiner, por Mario Gioia, Folha de São Paulo
Arte em contêiner
Matéria de Mario Gioia, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 18 de novembro de 2008
Com curadoria de Cao Guimarães e Lucas Bambozzi, projeto no parque Villa-Lobos, em SP, mostra 62 vídeos de 49 artistas
De hoje ao dia 28, o público do parque Villa-Lobos, em São Paulo, vai ganhar algo mais além de pistas para a prática de esportes e bancos para repousar na área verde. "Experiências audiovisuais", de acordo com o curador e videoartista Lucas Bambozzi. "Uma praça", para o arquiteto Bernardo Jacobsen. "Um disco voador que pousou na entrada do parque", segundo a artista Lia Chaia.
Essas são algumas definições que resumem o Container Art, projeto que reúne vídeos de 49 artistas dentro de contêineres, preparados especialmente para essa finalidade, com ar-condicionado, pufes e sofás.
Doze deles abrigam 62 trabalhos, sete são destinados ao papel de teto e um é ocupado pela organização da mostra. Foram instalados na esplanada de concreto logo depois da entrada principal do parque, no Alto de Pinheiros (zona oeste de São Paulo).
Entre os nomes representados na mostra, estão destacados videoartistas, como Eder Santos e Marcellvs, artistas que também têm obras em outros suportes, como Brígida Baltar, Lucia Koch e Sara Ramo, e algumas surpresas, como um vídeo de João Moreira Salles antes de ele se consagrar como documentarista, com filmes como "Notícias de uma Guerra Particular" e "Santiago".
"Quisemos usar o contêiner como uma estrutura em si.
Reunidos, eles parecem uma grande instalação", diz o artista Artur Lescher, que assina a montagem do espaço junto do escritório de arquitetura carioca Bernardes + Jacobsen. "Tínhamos experiência com os contêineres porque fizemos um projeto parecido para o Tim Festival. Sabíamos que não haveria problemas e que teria um resultado legal", conta o arquiteto Bernardo Jacobsen.
O projeto Container Art foi idealizado pelo italiano Ronald Lewis Facchinetti, amigo do galerista Daniel Roesler, que consultou-o para poder trazer a idéia para o Brasil.
Só videoarte
Em São Paulo, a idéia foi adaptada para receber apenas trabalhos de videoarte, com os contêineres agrupados. Em outros locais, os módulos eram espalhados e destacavam apenas um artista em cada um. Hoje, há projetos do Container Art nas cidades italianas de Veneza e de Turim. Já foram expostos projetos similares em Nova York e em Taipé, entre outros centros.
Para montar a estrutura, os organizadores tiveram de trazer os contêineres e montá-los de madrugada, utilizando guindastes. "É uma logística que parece complicada, lembra o trabalho em um porto, mas há um know-how disso bom no Brasil", conta Bernardes.
Para a curadoria do projeto, foram escolhidos Cao Guimarães e Lucas Bambozzi, dois videoartistas de prestígio no Brasil, cujos trabalhos também têm circulação no exterior.
"Não houve a pretensão de apresentar um panorama extenso e com muitos marcos cronológicos", afirma Bambozzi. "Definimos alguns trabalhos e artistas que temos interesse e começamos a reuni-los por certas afinidades estéticas."
Abstrações e narrativas
Assim, a curadoria apresenta um contêiner com "abstrações", outro para "narrativas", um para registros de performances e assim por diante. "As categorias não são engessadas, há obras que poderiam estar em vários contêineres."
Bambozzi diz que não pretendeu limitar as obras a apenas um suporte. "Há filmes, vídeos, projeções, registros de apresentações ao vivo. Isso coloca em xeque a terminologia de videoarte, que é restritiva, assim como são, por exemplo, net art e arte tecnológica. Prefiro chamar os trabalhos de experiências audiovisuais."
Apesar de não ter a ambição de ser um panorama detalhado da videoarte no Brasil, a curadoria quis exibir trabalhos de épocas variadas, apresentando obras mais antigas de nomes como Carlos Nader, Walter Silveira e João Moreira Salles.
"O caso do João é exemplar nessa discussão. Seu vídeo sobre poema de Ana Cristina Cesar, de 1990, é de restrita circulação, mas é uma experiência poética como poucas. Por que será que não vemos mais esse curta? Será que ficou datado?
Vendo a produção, a resposta é não, certamente não ficou datado", avalia Bambozzi.
"Por isso, é importante sua inclusão. Faz com que aponte opções estéticas diversas e mostre que a videoarte não é uma coisa que começou agora."
Artistas presentes na mostra aprovam o seu caráter público. "Exibir trabalhos em um parque, fora do ambiente inibidor das galerias, é interessante", diz Kika Nicolela. "Minha obra se relaciona muito com a cidade e, por isso, ganha força com esse tipo de apresentação e em diálogo com outros artistas", avalia Lia Chaia.